Pandemia comprova: só mulher consegue dar conta de cada vez mais tarefas
Não bastasse ser mães, trabalhadoras, donas de casa, com a covid elas viram professoras e cuidadoras de idosos
A vida pós-coronavírus comprova que para dar conta de tudo e mais um pouco é preciso mesmo ser mulher. Além das todas funções jogadas para a responsabilidade dela na vida adulta, a covid-19 ainda aumentou as tarefas.
Com a pandemia, além de mãe, trabalhadora e das funções de dona de casa, a mulher teve de aprender a ser professora para dar conta do ensino remoto, além de cuidadora de idosos, para ajudar os pais que não podem sair de casa.
Sintetizando o sentimento nada gratificante, a comerciante Regiane da Rosa Viana, de 29 anos, só consegue dizer duas palavras: “Tô lascada”. Com duas filhas, de 9 e 12 anos, ela conta que esse foi o primeiro pensamento quando realmente tomou consciência da pandemia.
Trabalhando de domingo a domingo há três anos, ela conta que todos os serviços que já tinha antes do coronavírus tomar conta da vida aumentaram com as novidades da pandemia.
Eu tenho que ensinar as duas com atividades da escola, isso enquanto tô aqui na conveniência e, quando chego em casa, ainda preciso dar conta de resolver lá também, Regiane explica.
Entre um cliente e outro, ela conta que os momentos de intervalo são direcionados para as filhas. Com as atividades escolares à distância, o peso do ensino presencial caiu sobre os ombros dela, “não dá para dizer que é fácil, mas a gente continua tentando e torcendo para a pandemia acabar”.
Hoje, no Dia Internacional da Mulher, a rotina deve ser a mesma. Começa antes das 7h e termina só de madrugada. “Precisa ser multiúso. Nós estamos aguentando, mas acho que só sendo mulher porque a gente lava, passa, cuida das crianças, faz correria. Tenho que ir atrás das coisas para a conveniência, para as meninas e para mim”.
Pensando em tudo o que tem passado durante esse mais de um ano, Regiane diz que o Dia Internacional da Mulher chega a parecer brincadeira. “Tinha que ser o ano passado inteiro e esse ano de homenagem porque nada foi fácil”, completa.
Filha, mãe, irmã, enfim - Enquanto passeava com a filha de 1 ano e 4 meses, a administradora de empresa, Laura Lemes, de 31 anos, tentava lembrar toda a mudança de vida que o coronavírus trouxe. “Quando a pandemia começou, minha filha tinha quatro meses. Todo o crescimento dela até agora foi dentro de casa”, diz.
Além de se preocupar com a filha, ela foi puxada pela pandemia quando a mãe, de 59 anos, teve covid. De acordo com Laura, entre o trabalho, casa e a filha, as horas também precisaram ser divididas em fazer compras e deixar no portão da mãe.
"Graças a Deus ela não teve sintomas muito graves, mas o psicológico fica abalado. A gente fazia compras e deixava na frente da casa dela. Toda vez que minha mãe me via, chorava demais", Laura explica.
Ainda tentando se acostumar com todas as mudanças, Viviane Lacerda, de 29 anos, se tornou autônoma na pandemia e conta que até agora equilibrar todas as funções acumuladas é um desafio.
Após o marido perder emprego devido à pandemia, ela passou a vender cosméticos na porta de casa para recuperar renda. “Eu tenho uma filha de três anos e não conseguia trabalhar porque não tinha com quem deixar. Quando coloquei ela na escolinha veio a pandemia e acabou. Aí tentei começar as vendas”, diz.
Pouco tempo depois, Viviane abriu uma pequena loja dentro de casa e o que viu não correspondeu às expectativas. “Não tive o retorno esperado e já desesperada, tive ideia de começar a vender cachorro quente na frente de casa”.
A história até poderia ser contada sem os bastidores, mas é justamente neles que a água fria do novo coronavírus se mostra mais intensa. Com o marido trabalhando fora sem serviço fixo, ela respira fundo para relatar o dia.
Acorda cedo, limpa casa, cuida da loja, faz comida e no fim da tarde, quando o banho deveria finalizar o expediente, mais um começa. “Eu tenho que fazer cachorro-quente, cuidar da minha filha e atender cliente ao mesmo tempo. Isso tudo me preocupando se não vamos pegar coronavírus, até dinheiro a gente tem medo de pegar”.
Tentando se apegar à ideia de que tudo isso vai passar, Viviane diz que fé no retorno dos dias ainda turbulentos, mas sem o temor do vírus e com carga reduzida é o que a mantém seguindo.