Por dinheiro e até sem saber, galera aposta com força nas simpatias de Réveillon
Da roupa branca à ceia, pessoal mergulha nos rituais; nas lojas, o barquinho de Iemanjá é o que mais sai
Uns agradecendo e outros loucos para que o ano termine. Independentemente do sentimento, o desejo unânime é de que o ano que se inicia seja próspero, ou seja, com dinheiro no bolso. Querer nem sempre é poder, mas se tem uma coisa que o brasileiro ama, às vezes até sem saber, é uma “mandinguinha” para conseguir algo em troca. Se a fé move montanhas, é capaz que 2020 seja um ano diferente, pois a galera está mesmo disposta a caprichar na simpatia.
E a informação não é achismo do Lado B, não. É resultado de levantamento feito pela CNDL (Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas) e pelo SPC (Serviço de Proteção ao Crédito) em 27 capitais do Brasil, incluindo Campo Grande. Das 686 pessoas ouvidas, um terço (32%) dos entrevistados fará algum ritual de ano novo em 2020.
Das pessoas que confirmaram a intenção, ganhar dinheiro fica no topo da lista, seguido por encontrar ou manter um amor, pagar as dívidas, conseguir um emprego e, por fim, comprar uma casa.
Embora, apenas, 32% admitam, a pesquisa revela que mais da metade (54%) dos consumidores pretende comprar alguma peça de roupa para festejar e 37% escolherão a cor branca, outro simbolismo que remete aos desejos e objetivos para o próximo ano.
O Lado B trouxe as simpatias mais populares e mostra como a imersão nas superstições é natural. Confira:
Roupa nova / branca – Essa é clássica. Mas poucos sabem que a tradição de usar roupa branca no Réveillon veio das tribos africanas que usavam trajes brancos, cor que simboliza a paz e purificação espiritual, para homenagear Iemanjá na virada do ano.
Vinho espumante / Champagne - Só o estourar de uma garrafa de champagne já é uma celebração. Apesar de não haver dados que confirmem a data que a bebida passou a ser usada, há quem diga que o espumante esbanja vida na taça, e por isso virou tradição apreciar a bebida quando termina a contagem regressiva e o relógio bate a meia-noite.
Lentilha – Comparada a moedas, segundo a simpatia é necessário comer um prato quando o relógio marcar meia-noite do dia 1º de janeiro. A receita na mesa da ceia de ano novo é tradição.
Romã – A fruta é outro clássico. Também é associada à prosperidade, mas, principalmente, à fertilidade. Na simpatia mais popular, é preciso chupar sete sementes de romã na noite de Réveillon e não jogar fora. Embrulhe em um papel e guarde esse pacotinho na carteira ao longo do ano.
Uva – Faltam todas as outras frutas, mas a uva está ali, na mesa da ceia. Simbolizando a boa sorte, supersticiosos ingerem 12 uvas, uma para cada mês. Outras pessoas optam por outras quantidades da fruta, como, por exemplo, o correspondente ao número da sorte.
Pular 7 ondinhas – Essa é quase uma obrigação de quem está na praia. Qualquer banhista sabe que aquela aguinha salgada renova energias, mas foram os africanos que trouxeram à tona a tradição de pular as ondas. O número sete é espiritual e, ao pular as ondas, você invoca Iemanjá, que dá forças para passar por cima das dificuldades do ano que está por vir.
Presentear Iemanjá – Outro ritual tradicionalíssimo é presentear a Iemanjá. Como manda a crença, num barquinho, se colocam pentes, flores, perfume, champagne branco, sabonetes, velas brancas ou qualquer outra oferenda. O presente faz com que todos os problemas sejam levados e devolvidos em forma sorte em ondas.
Essas são as mais populares, mas também há quem vire o ano com dinheiro no sapato, outros que andam ao redor da casa carregando uma mala para um ano cheios de viagens.
Outra polêmica que se levanta no fim de ano é a questão de que o Brasil critica religiões afro, mas é só passar revéillon na praia para pular as 7 ondinhas, ritual que invoca Iemanjá. No entanto, para o zelador da Tefima (Tenda Espiritualista Filhos de Maria), o filho de santo Xisto Queiro Júnior, não há porque acusar pessoas de hipocrisia, pois o ritual virou cultura no Brasil.
“Já se tornou cultural, o ritual não é feito somente por comportamento religioso. As pessoas pulam as sete ondas com pensamentos positivos e está tudo certo. A espiritualidade não se divide. Mas é claro que falta conhecimento. O ritual de pular sete ondas iniciou com o Tancredo da Silva Pinto, na década de 1960, na praia de Copacabana. Ele levava o pessoal da casa dela para fazer esse ritual. Quando você pula sete ondas você está em outra vibração, uma vibração de geração, para gerar coisas boas. Mas o ritual se popularizou. Não é hipocrisia”, explica Xisto.
Presentear Iemanjá e pular sete ondas são rituais. As demais ações entram em simpatias, ações trazidas pelos portugueses e não pelos negros. Muitas coisas se aculturam de tal forma que fogem da religiosidade. A figa por exemplo é da cultura portuguesa. A simbologia era usada nas Cruzadas para ofender os turcos. No entanto, também é utilizada nos terreiros.
“Vale lembrar que as simpatias estão totalmente ligadas ao campo energético. Afinal, o comportamento das pessoas não se altera. Não adiante comer um quilo de lentilha esperando prosperidade, mas não sair de casa para entregar um currículo”, finaliza Xisto.
Nas lojas - O barquinho de Iemanjá, por exemplo, é o item mais vendido na loja Artigos Religiosos Luz Divina, neste fim de ano, em Campo Grande. O estabelecimento com 39 anos de história vende todos os tipos de objetos e vestuários usados em trabalhos espirituais.
Segundo o subgerente Luan Alexandre, funcionário da loja há 13 anos, a venda do barquinho só perde para a vela amarela, usada em simpatias para dar dinheiro.
Luan explica que ainda há uma classificação de pedidos por gênero. “Normalmente é o homem que busca algo para uma simpatia por dinheiro. Mulher, na grande maioria, busca o amor”, garante o subgerente.
Para quem não estará na praia nesta virada do ano, não precisa ficar triste. Dá para presentear Iemanjá do mesmo jeito. “Normalmente, o pessoal busca rios ou córregos de água corrente para soltar seu barquinho”, finaliza Luan.
A margem de erro da pesquisa citada na matéria é de 3,7 e 4,0 p.p, respectivamente, para um intervalo de confiança de 95%.