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Comportamento

Rua 14 de Julho, em época de fim de ano, pede mais do que apenas compras

Quem curtiu passeio pelo Centro de Campo Grande em época de Natal, há muitos anos, hoje lembra com saudade.

Gustavo Maia | 24/12/2018 08:13
Época de Natal na 14 de Julho guarda histórias e lembranças de quem viveu uma outra época da cidade. (Foto: Gustavo Maia)
Época de Natal na 14 de Julho guarda histórias e lembranças de quem viveu uma outra época da cidade. (Foto: Gustavo Maia)

Na busca pelos presentes para as festanças de fim de ano, muita gente acaba aproveitando o horário estendido das lojas no Centro da cidade para garantir os mimos. Mas as luzes de Natal são atração extra há muitas gerações na principal rua do comércio central e quando essa época chega, também surgem lembranças de quando tudo era bem diferente por ali.

A geração do iPhone, da TV de LED e do Whatsapp com certeza não sabe como era, mas quem tem um pouquinho mais de experiência é só saudades quando fala do clima de Natal nos tempos que a Rua 14 de Julho era o programa preferido das famílias.

A médica veterinária Roxana Yarzon veio de Jardim para a Capital quando ainda era criança, com 9 anos de idade. Hoje com 54, ela descreve com detalhes como eram os agitos de natal na 14 de Julho dos anos 80. “Antes aqui era bem mais animado, com muito mais gente. Na época do natal essas lojas tinham de tudo: móveis, roupa, brinquedo, lanche. Tinha lanchonete dentro da loja Americanas, tinha até cinema aqui no centro, depois acabou”, conta ela, mostrando que esse era o passeio preferido das famílias na época.

Roxana Yarzon relembra centro nos anos 80. (Foto: Gustavo Maia)
Roxana Yarzon relembra centro nos anos 80. (Foto: Gustavo Maia)

Roxana explica que o ritmo das coisas hoje em dia está mais acelerado e, com o passar dos anos, a tradição de fazer da 14 o programa de natal da família foi se perdendo: “entrei pra faculdade, depois minha mãe ficou doente, e cada vez mais a vida foi ficando corrida”.

Ela conta ainda que a maior diferença sentida por ela, em comparação com o centro de Campo Grande de antigamente, é a grande quantidade de carros circulando pelas ruas hoje em dia. “A gente tinha uma movimentação grande, mas de pessoas andando, não de carros. Não tinha essa correria toda. Lembro que quando eu era criança, e morava ali na Vila Sargento Amaral, a gente vinha à pé pra cá porque quase ninguém tinha carro naquela época. A gente vinha e voltava andando, mas hoje em dia já não dá mais, as ruas no bairro são escuras. Tá tudo muito perigoso hoje” compara ela.

Irene Cristina, de 48 anos, também tem boas lembranças do que ela chama de “anos de ouro”, mas vê com pessimismo o natal desse ano. Vendendo churros há mais de 10 anos no centro da cidade, hoje ela já não aguenta mais empurrar o carrinho, que foi assumido pela sobrinha. Irene veio de Fátima do Sul há 40 anos, e garante que até hoje nunca tinha visto um natal tão ruim para as vendas. “Antigamente tinha muito mais gente nas ruas. A prefeitura enfeitava tudo aqui na 14, agora nem tá parecendo natal, só lá na Afonso Pena”, se queixa ela.

Mas nem sempre foi assim. Dona Irene relembra os tempos em que natal era sinônimo de fartura: “Eu me lembro que sempre via muita gente, todo mundo alegre, comprando presente. Eu vendi churros no primeiro ano da Cidade do Natal, lá bombava de gente. Ganhei tanto dinheiro naquele ano, eu quase não aguentava de tanto churros que eu tive que fritar”. Ela faz comparação com o feriado desse ano e admite que a coisa não está fácil pra ninguém: “agora, olha aí, as pessoas entram e saem com as mãos vazias, reclamando. Esse natal tá sendo um natal de crise pra todo mundo. As pessoas tão chorando pra pagar R$2,00 num churros”.

Marco Antônio e a esposa trazem a netinha para passear na 14. (Foto: Gustavo Maia)
Marco Antônio e a esposa trazem a netinha para passear na 14. (Foto: Gustavo Maia)

E se está difícil para quem vende, também não está fácil para quem compra. Mas ter um pouco de persistência na hora das compras, pode ajudar. O técnico em manutenção predial, Marco Antônio, diz que consegue achar alguns produtos com preço mais em conta, e dá a dica: “precisa procurar bem, tem que andar”. Ele, que vinha passear no centro da cidade em época de natal quando era criança, conta que trazia a filha há alguns anos e hoje já traz a neta para aproveitar o feriado.

Brasilino Carlos, de 65 anos, também é vendedor de churros e está ali no Centro há mais de 15 anos. Sobre as memórias de natais passados ele conta que já passeava “naquela época em que ainda não existia nem o Calçadão da Barão”. Seu Brasilino viu as lojas da 14 de Julho mudarem de nome, de dono, passarem de pai para filho, e lembra que em época de natal tudo ficava diferente: “isso aqui ficava tudo decorado, tinha papai noel, tinha tudo. Aqui passava milhões de pessoas. Tinha movimento de gente aqui desde novembro. Era gente que não acabava nunca”, conta ele.

Brasilino Carlos vende churros no centro há mais de 15 anos. (Foto: Gustavo Maia)
Brasilino Carlos vende churros no centro há mais de 15 anos. (Foto: Gustavo Maia)

O casal Raquel e Emerson Dantas, que hoje passeia com o filhinho pelo calçadão da 14 de julho contam que também vinham com os pais quando criança. Raquel diz que a primeira coisa que lhe vem à mente quando lembra do centro em época de natal na sua infância, é o presépio que montavam. Ela lembra que a decoração era uma das principais atrações, e os pais traziam as crianças para ver as luzes de natal, que hoje quase não se veem mais.

O marido concorda com Raquel, e acrescenta que como a rua não tem a esperada decoração, o passeio acaba perdendo a graça. “Você passa aqui pela 14, olha as lojas e parece que é mais um dia normal do ano. A única diferença é o horário extra das lojas, que ficam até mais tarde”, observa ele. Emerson também critica o fato da praça Ary Coelho não ter recebido decoração natalina: “tá isolada lá, sem iluminação, sem nada”.

Luiz e Vanessa sentem falta da decoração natalina. (Foto: Gustavo Maia)
Luiz e Vanessa sentem falta da decoração natalina. (Foto: Gustavo Maia)

Outro casal que aproveitou o horário diferenciado das lojas e veio curtir o centro com o filho, foi André Luiz e Vanessa Rodrigues. Os dois contam que também vinham passear na 14 quando criança. André Luiz lembra que a diversão era comprar as roupas para usar nas festas de natal e ano novo e, claro, os presentes. Ele é da época em que o trem de natal passava pela 14, cruzando o centro da cidade. O trenzinho acabou indo parar nos altos da Afonso Pena, e depois foi substituído pelo ônibus da City Tour. Mesmo com todas essas mudanças, para eles, a principal diferença daqueles tempos para os dias de hoje ali nas ruas do centro, é a decoração.

No fim das contas, ao que parece, nem só de compras se faz um natal no centro da cidade. O importante é que todo mundo pode voltar pra casa com um presente - pode ser um celular de última geração, aquela sandália da propaganda na TV, uma blusinha toda florida, ou até mesmo um abraço, um encontro, uma história para contar daqui a alguns anos. 

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