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Comportamento

Servidor público transforma sala de casa para virar tarólogo

Fernando divide seus dias vivendo entre os mundos “racionais” e “místicos”

Aletheya Alves | 08/03/2022 08:42

Campo Grande News - Conteúdo de VerdadePela manhã, quando acorda, Fernando Cunha une o cabelo com uma trança, põe suas roupas mais formais e incorpora a personalidade de servidor público estadual. Já durante a tarde, quando volta para casa, transforma a sala e a si mesmo para sua segunda vida, a de tarólogo.

Antes de me atender, Fernando perguntou se havia algum problema em me receber com a sala arrumada para o atendimento de tarot e foi assim que conheci o local. Ao chegar no endereço do Carandá Bosque, encontrei um portão todo fechado, sem indícios de que ali havia algo diferente.

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Já para dentro do espaço, algumas plantas e decorações dispostas pela área mostram uma prévia do que há no interior da casa, ainda mais “recheada” de conteúdos. Me sentei em uma de duas cadeiras vermelhas, ambas posicionadas em volta de uma mesa central, coberta por um tecido, e assim, o servidor público foi contando sobre como caminha entre mundos tão diferentes.

Formado em Direito, ele explica que durante suas manhãs, tenta separar a água do óleo e cria um Fernando que faça sentido para o serviço público. “Eu mantenho meu cabelo preso, tento não deixar a barba muito longa e ajeito minhas roupas de acordo. Claro que uma coisa ou outra passam, vou acabar usando um colar ou um anel, mas separo esses momentos.”

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Questionado sobre ter dificuldade em distanciar os mundos “racionais” e “místicos”, ele relata que seu sincretismo não está presente apenas na união de religiões diferentes, mas também das lógicas de trabalho. Por não ter conseguido lidar com as questões financeiras apenas através da leitura de cartas, o outro modo de ganhar a vida precisou entrar em ação.

Como a sala estava preparada para o atendimento de tarot quando fui recebida, as janelas permaneceram fechadas por quase todo o tempo e uma luz amarela pairou sobre o espaço em conjunto com algumas velas acesas. Com uma bata branca, anéis e colares, Fernando estava “vestido” com sua personalidade mágica quando o conheci.

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Assim como ele se prepara para percorrer os caminhos durante as 24 horas, também ordena sua sala para seus atendimentos. Quando a casa volta a ser apenas uma casa, os tecidos são retirados do espaço, janelas voltam a ser abertas e móveis ganham um novo arranjo.

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Vivenciando extremos

Longe de ter começado a conviver com extremos há pouco tempo, Fernando conta que descobriu seu lado místico ainda criança, quando vivia imerso em uma família estritamente cristã. “Foi sempre complicado, precisei entender que era um processo longo, de muita conversa. Mas entendi que confrontar minha família era mais fácil do que eu não aceitar quem eu realmente era”, diz.

Para conseguir quebrar o medo de seguir para o “outro lado”, o servidor público se entregou inicialmente à dança cigana e quase sem querer. “Eu fui em um evento buscando por dança árabe, porque queria entender melhor sobre meus antepassados e acabei me apaixonando pela dança cigana. Dali, me vi dançando e depois, me apaixonei pela prática árabe também.”

Fernando começou a conviver com novas práticas e, de acordo com seu relato, se entregou aos sentimentos que já tinha desde muito novo. Desde então, se tornou dançarino, tarólogo e conheceu a Umbanda.

Foi assim que mesclando todos seus amores e crenças, decidiu implantar a personalidade na sua atual casa.

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Decoração e simbologias

Nenhum canto da casa ficou sem os toques de Fernando, seja nos momentos de trabalho ou de lazer. Na sala e nos quartos, quadros comprados e ganhados de amigos foram dispostos pelas paredes.

Algumas das imagens vieram para o tarólogo em sonhos, outras conquistaram seu gosto logo no primeiro momento ao serem vistas. “Muitas coisas chegam até mim, amigos que viajam e trazem. Outras eu encontro e compro, porque sinto que fazem parte dos meus pensamentos”, comenta.

Combinando todas suas crenças, deuses e divindades de religiões e crenças diferentes se unem nos espaços. Enquanto na cozinha há um espaço para o Preto Velho da Umbanda, um tecido com a imagem de Ganesha sobrepõe a televisão durante os atendimentos de tarot.

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Em meio às simbologias mágicas, as heranças familiares se unem ao contexto total. É acima de uma bola de cristal, que um relógio de 120 anos completa o cenário. “Meu avô fazia coleção de relógios e quando ele faleceu, esse que tenho passou para minha avó. Depois, foi para minha tia e, por fim, veio para mim. Mantenho ele aqui para simbolizar minhas ancestralidades também”, diz.

Unindo tudo, da área externa até o banheiro, Fernando finaliza dizendo que há um equilíbrio em tudo e que toda a união exposta na casa mostra o que há dentro de si mesmo. “Mas estou precisando de um lugar maior, porque aqui já está ficando sem espaço”, brinca.

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