Loja de chinelos mais antiga da cidade vive da mesma promoção há décadas
A gente cresce vendo cenas que não mudam na rotina da cidade. Um desses cenários em Campo Grande fica em uma das esquinas da Calógeras, no Centro. No Shopping das Havaianas, há décadas a placa vai se renovando na fachada, mas sempre com a mesma mensagem de "liquida tudo".
O lugar é endereço do comerciante Ali Fares, de 70 anos, que desde os 25 vive em Campo Grande. Quando a loja surgiu, apenas Calógeras e 14 de Julho eram ruas de comércio na cidade.
Mas apesar do movimento bem diferente hoje, ele abre as portas todos os dias para a freguesia fiel e tantos outros interessados pontuais pela promoção anunciada. Dentre os prédios da avenida antiga, o do comércio de Ali é o menos derrubadinho, mas está sempre "entupido" de chinelos, com caixas que vão do chão ao teto.
Apesar de cheia, a loja é bem organizada. O cliente encontra fácil o modelo preferido. Na porta, está sempre visível o que é da promoção e ao contrário do que se imagina, não tem produto encalhado ou velho. Só mesmo a coleção passada da marca mais famosa de chinelos do mundo. Tem modelo slim a R$ 12,00 e a mais recente da coleção da Mulher-Maravilha, a R$ 35,00, enquanto que nas concorrentes custam mais de R$ 50,00.
O tempo todo o comerciante fica de olho em quem chega na loja. Ali sai do balcão e vai até a porta ver o que o cliente deseja, mesmo com o atendimento das duas vendedoras contratadas. Ele diz que está no lugar há, pelo menos, três vezes a minha idade. Fazendo um calculo simples, a loja teria quase 60 anos, mas na verdade tem cerca de 45.
Aos clientes ele fala das coleções e até do sentimento sobre estar na Calógeras. "A gente parece não fazer parte do Centro. Está abandonada, mas a gente paga um preço alto em impostos", desabafa.
O clima sério é quebrado com a chegada de um cliente antigo que diz não ver Ali há 30 anos. Em minutos de conversa, o comerciante, que é palestino, conta que o pai e a esposa já partiram.
A visita vai embora e Ali continua atendendo e ajudando as vendedoras na arrumação que não para. Uma delas até pede para o patrão sossegar. "Deixa que eu faço seu Ali, senão o senhor vai ficar com dor nas costas", diz enquanto ele insiste em organizar o mostruário.
Outra vendedora, muçulmana e vinda da Nigéria, trabalha com Ali há dois meses. Ela ainda pena no português, mas atende com toda simpatia e revela que está no Brasil há cinco anos, para fazer faculdade. "Faço Engenharia da Computação, vou embora quando terminar", resume.
As duas não têm muito tempo para conversa, porque em questão de minutos a loja está cheia.
Ali completa que a coleção é comprada uma vez por ano e o que vai ficando para trás ganha preço especial. "Por isso, tem sempre uma promoção", justifica. Assim mantém o movimento que conta com jeito turrão de Ali, mas de quem sabe tratar o cliente como merece.