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Reportagens Especiais

"Esquecimento" de José Antônio na cidade frustra trineto do pioneiro da Capital

"Quero coisas vivas e grandiosas”, diz familiar sobre insuficiência de monumentos com o nome do fundador

Natália Olliver | 26/08/2023 07:32
Campo Grande News - Conteúdo de Verdade


Trineto de José Antônio explica que fundador não recebe tantas honrarias como deveria (Foto: Paulo Francis)
Trineto de José Antônio explica que fundador não recebe tantas honrarias como deveria (Foto: Paulo Francis)

“A cidade de Campo Grande deve tudo a ele, que fez isso do zero e não tem uma homenagem digna. Eu quero para ele uma coisa viva. Não só um monumento, mas uma coisa que mostre a grandeza dele, como uma universidade, um teatro, um estádio de futebol”. Essa é uma das falas de indignação do trineto de José Antônio Pereira. A frustração acompanha o descendente direto do pioneiro há anos.

Para ele, o rosto do trisavô no obelisco, localizado na Avenida Afonso Pena com Rua José Antônio - que também leva o nome do fundador -, é insuficiente. Tampouco o “batismo” da Escola Estadual José Antônio Pereira, construída na Vila Taveirópolis, que homenageia o pioneiro mineiro ou o museu, localizado na Av. Guaicurus (antiga Fazenda Bálsamo, onde residia a família), fazem jus ao mineiro.

Cícero Antônio de Souza, de 78 anos, conta à reportagem que assiste ao município negligenciar o parente e que já tentou com a Câmara de Vereadores soluções para, segundo ele, honrar com coisas grandes o nome do trisavô.

Por que Tancredo Neves foi homenageado aqui? Embora seja uma figura importante para a história, e o fundador não?”, questiona Cícero.

O ex-deputado estadual e conselheiro do Tribunal de Contas do Estado aposentado, o pecuarista fez referência ao Palácio Guaicurus, sede na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul, que antes estampava o nome de Tancredo, ex-primeiro-ministro do país. A mudança aconteceu após Cícero presidir a casa e sugerir alteração, em 1991. Posteriormente, foi criado um decreto, no qual admitia que a estrutura da Assembleia levasse o nome dos indígenas guaicurus e o átrio mantivesse o nome de Tancredo.

Ele acrescenta que, apesar da revitalização do Obelisco, em que o rosto de José Antônio está, a imagem não corresponde mais ao tamanho da cidade, é pequena. Ele ainda critica a Rua José Antônio Pereira.

Deram aquele monumento, mas o busto é da época medieval. Isso é para Campo Grande quando tinha 40 anos. Estamos chegando a casa de um milhão de habitantes. Tem universidade, estádio, avenida, algo cultural, educacional ou de saúde com o nome dele? Tem uma rua pequena só”, diz Cícero.

Opinião divergente - A historiadora Maria Madalena Dib Mereb Greco, presidente do IHGMS (Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso do Sul), rebateu as ponderações do ex-deputado. “A maior homenagem que alguém pode receber é ser nome de uma escola”.

Ela também acrescenta que, embora o Monumento dos Imigrantes ou Monumento Carro de Boi, localizado próximo ao Horto Florestal, não seja uma homenagem que leva o nome de José Antônio, ele também simboliza a chegada do pioneiro à Capital. “Talvez o que pode ser feito é quando tiver algum núcleo habitacional fazer a sugestão à prefeitura”, finaliza.

De um lado busto de Tia Eva, formada só por descendentes e do outro, museu e antiga casa de José Antônio Pereira (Foto: Arquivo\Campo Grande Newsi)
De um lado busto de Tia Eva, formada só por descendentes e do outro, museu e antiga casa de José Antônio Pereira (Foto: Arquivo\Campo Grande Newsi)

Único fundador? - A história da fundação de Campo Grande é divergente, de acordo com a historiadora e moradora da Comunidade Tia Eva, Vânia Lúcia Batista Duarte, antes de José Antônio chegar aqui, já existia um povoado de negros instalado na região. "As comunidades negras naquela época tinham uma rede de informações, então quando Tia Eva veio para o nosso Estado, antigamente conhecido como Campos de Vacarias, outras comunidades datavam sua chegada antes de José Antônio", explica.

A história da comunidade e da ex-escrava Eva Maria de Jesus é contada de forma oral, transmitida de geração em geração. Não há documento oficial. Por isso, é difícil comprovar as histórias passadas de pais para filhos. "O que eu tenho dito é que ela é cofundadora da cidade e que chegou aqui em 1905, isso com certeza ela foi".

Breve história de José Antônio - O mineiro nasceu no antigo Arraial de Nossa Senhora da Piedade da Borda do Campo, local que recebe hoje o nome de Barbacena, no Estado de Minas Gerais. José Antônio Pereira era filho de Manuel Antônio Pereira e de Francisca de Jesus Pereira. Como a família foi crescendo e o local não comportava mais a todos, José decidiu partir após a Guerra do Paraguai, em busca das terras de Vacaria, no então Mato Grosso.

O pioneiro buscava as terras devolutas oferecidas pelo governo para que o povo habitasse as regiões. A primeira comitiva foi realizada em 1872. Na ocasião, ele veio junto de escravos e um guia. Anos depois, voltou para buscar a família, composta por 65 pessoas. O intuito era chegar ao que hoje é o município de Rio Brilhante, a 161 quilômetros da Capital. Entretanto, no caminho José se apaixonou pela região de Campo Grande e não saiu mais.

Cícero mostra folheto com linhagem da família, de um lado os filhos, de outro os netos (Foto: Paulo Francis)
Cícero mostra folheto com linhagem da família, de um lado os filhos, de outro os netos (Foto: Paulo Francis)

Linhagem - José teve oito filhos, Antônio Luiz Pereira, Joaquim Antônio Pereira, Francisca Pereira, Ana Constança Pereira, Maria Carolina Pereira, Rita Pereira, Perciliana Pereira, Maria Nazaré Pereira e inúmeros netos.

Cícero comenta ao Campo Grande News que todos os anos é realizada uma festa em homenagem aos familiares do fundador e que no início apenas cinco pessoas compareceram, hoje são mais de 100 que marcam presença na festança histórica.

Monumentos

O monumento mede 10X5m e está localizado na Avenida Pres. Ernesto Geisel, bairro Amambaí (Foto: Campo Grande News/Arquivo)
O monumento mede 10X5m e está localizado na Avenida Pres. Ernesto Geisel, bairro Amambaí (Foto: Campo Grande News/Arquivo)

Caro de Boi - O “Monumento dos Desbravadores”, conhecido como “Carro de Boi”, foi inaugurado em 1996. Ele simboliza o início da ocupação urbana de Campo Grande, em 1872. Embora não leve o nome do pioneiro, ele representa a chegada da família junto aos carros de bois à Capital. O monumento mede 10X5m e está localizado na Avenida Fernando Corrêa da Costa com Ernesto Geisel, na Praça Nelly Martins, próxima ao Horto Florestal.

Monumento fica localizado no cruzamento da Avenida Afonso Pena com Rua José Antônio (Foto: Campo Grande News/Arquivo)
Monumento fica localizado no cruzamento da Avenida Afonso Pena com Rua José Antônio (Foto: Campo Grande News/Arquivo)

Obelisco - O monumento foi Inaugurado em 1993 e construído em homenagem aos fundadores de Campo Grande. O objeto foi tombado pela Prefeitura em 1975. Desde então, é símbolo do Centenário de Emancipação política e administrativa da Capital. A peça fica localizada no cruzamento da Avenida Afonso Pena com Rua José Antônio. Em maio de 2022, ela foi revitalizada, a obra custou em torno de R$ 100 mil.

Escola José Antônio - Pouco se sabe sobre a origem da escola que leva o nome inteiro do fundador. A SED (Secretaria de Estado de Educação) confirmou que o nome da instituição de ensino foi de fato homenagem ao pioneiro da cidade. Porém, ela não aparece, por exemplo, no livro mais recente da Sectur (Secretaria Municipal de Cultura e Turismo), Marcos e Monumentos de Campo Grande. Clique neste link e acesse o material.

Fazenda Bálsamo, antiga casa do fundador José Antônio Pereira (Foto: Campo Grande News/Arquivo)
Fazenda Bálsamo, antiga casa do fundador José Antônio Pereira (Foto: Campo Grande News/Arquivo)

Museu José Antônio - A sede da antiga fazenda Bálsamo foi construída em meados dos anos 80 e uma das primeiras fazendas de Campo Grande. Pertenceu ao fundador José Antônio Pereira e posteriormente a um der seus filhos, Antônio Luiz Pereira. A casa fica localizada na Avenida Guaicurus, bairro Jardim Monte Alegre, em Campo Grande.

O local recebeu este nome devido ao córrego, também batizado assim, que passa na região e está localizado a 8 quilômetros do centro da cidade. O lugar virou um Museu Histórico e ponto turístico.

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