Verde e concreto: como manter harmonia homem e natureza por mais 100 anos?
Especialistas falam da necessidade de corredores para animais e redução no consumo na casa do campo-grandense
Mesmo depois de 123 anos de ocupação, Campo Grande segue com a boa fama de cidade com qualidade de vida, cheia de áreas de mata nativas fundamentais, mesmo em meio ao progresso. Por mais que o concreto avance de todas as formas, após mais de um século, a Capital do Mato Grosso do Sul continua como morada da vida silvestre.
Mas como continuar assim nos próximos 10, 20, 30 ou 100 anos? A pergunta é difícil e as respostas acabam sempre no mesmo indivíduo: o campo-grandense, cidadão responsável por cada transformação que impacte diretamente nessa harmonia da biodiversidade.
Quem explica melhor é a bióloga e presidente do Instituto Arara Azul, Neiva Guedes. “A gente vai conseguir sim continuar tendo essa integração homem e natureza desde que a população entenda que há espaço para todos. Respeitando os animais, os seus espaços e hábitos.”
Dentre os principais cuidados para a permanência dos bichos na cidade está a necessidade de manter os corredores de vegetação para a movimentação da fauna. “Se tiver só ilhas de matas não conseguiremos trocar o fluxo gênico (troca de informações genética ), e os animais vão cruzar entre si”, justifica.
Hoje ela afirma que Campo Grande é um bom exemplo de convivência harmônica do desenvolvimento com a fauna e flora, mas deixa o alerta.
“Vai de cada pessoa avaliar seu consumo, descarte do seu resíduo. Não é só o poder público, mas o cidadão. Educação é o princípio de tudo. Um povo bem educado tem a consciência de que o espaço não é só dele. É do vizinho, não importa se é um bicho ou uma planta. É um ser vivo e temos que respeitar da mesma forma”, diz Neiva Guedes.
A Capital é considerada uma maternidade de araras-canindé, por exemplo. São cerca de 750 indivíduos voando pelo céu da cidade. “Aqui é um centro de reprodução das araras-canindé. Quando os filhotes voam, podem dispersar para o interior do Estado. Já encontramos araras nascidas e anilhadas aqui que um ano depois foram encontradas em Aquidauana e Novo Horizonte do Sul”, revela Neiva.
Considerado o grande pulmão que respira vida, a região do Prosa aglutina as áreas mais importantes para essa fauna permanente na cidade. Casa das capivaras, antas, quatis, tamanduás, macacos e tantas outras espécies, o lugar reúne os parques dos Poderes, do Prosa, das Nações Indígenas e do Sóter.
A arquiteta e diretora da região Centro-Oeste da Sociedade Brasileira de Arborização, Eliane Guaraldo, destaca que esses pontos de preservação de fragmentos de mata natural são fundamentais para garantir esta harmonia ecológica por mais séculos.
“Temos equidade verdade na cidade. Algumas áreas bem servidas, mas outras que precisamos ter mais cuidado. Precisamos proteger os fragmentos remanescentes e mesmo os novos plantados, para manter essa interação ecológica”, pontuou Eliane Guaraldo.
Ela explica que o Plano Diretor de Campo Grande está passando por uma revisão voltada para as árvores. “Vamos mapear as arvores, contabilizar essa floresta urbana e identificar a necessidade ampliar. A cidade sofreu uma onda de urbanização muito acelerada. Não sabemos o quanto a gente perdeu de árvores.”
Planejamento
A diretora de Planejamento Ambiental da Planurb (Agência Municipal de Meio Ambiente e Planejamento Urbano), Mariana Massud, argumenta que um desenvolvimento urbano sustentável só é possível com as diretrizes, princípios e fundamentos da legislação ambiental vigente.
“Podemos citar, por exemplo, a Lei Complementar n. 341, de 4 de dezembro de 2018 e suas alterações – segunda revisão do Plano Diretor –, que instituiu o PDDUA (Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Ambiental de Campo Grande), e que trouxe o eixo “Desenvolvimento Sustentável”, orientando a execução das políticas e diretrizes ambientais no âmbito municipal”, afirmou Mariana Massud.
Além disso, a prefeitura atende aos ODS’s (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável), adotados pela ONU (Organização das Nações Unidas). “Até 2048 temos que cumprir os requisitos. O plano diretor desenvolve a integração entre o desenvolvimento urbano e ambiental no município de Campo Grande, contribuindo para assegurar um meio ambiente equilibrado para as presentes e futuras gerações.”
O secretário municipal de Meio Ambiente e Gestão Urbana, Luís Eduardo Costa, afirma que a Capital é uma cidade resiliente, que passa por transformações e permanece com suas características originais.
“Nós temos realmente um desafio muito grande numa cidade como Campo Grande, que é o seu desenvolvimento urbano, sua ampliação de ocupação territorial com a preservação ambiental. Esse é um desafio importante, mas é um desafio que está dentro do alinhamento de planejamento da cidade, da legislação, das ações que norteiam todas as implantações de pequenos, médios e grandes empreendimentos na cidade”, ponderou Luís Eduardo Costa .
Ele destacou a importância da arborização urbana para a Capital. “Somos conhecidos mundialmente devido ao manejo das árvores, trato com as suas florestas urbanas, da implementação de mais vegetação onde a preocupação não está apenas com as pessoas que moram na cidade, mas também com toda a sua fauna, sua riqueza.”
Atualmente Campo Grande, juntamente com outras sete cidades brasileiras, integra a rede "Tree Cities Oh the World", um reconhecimento internacional das cidades que se comprometem a cuidar adequadamente de suas florestas e árvores urbanas.
“É importante ressaltar que as florestas urbanas ou a arborização urbana implica em uma melhor qualidade de vida, seja na redução da amplitude térmica, na redução do impacto que as intempéries ocasionam na infraestrutura urbana e no bem-estar social. Portanto, para continuarmos integrados com a arborização existente na cidade, esta secretaria atua paulatinamente na fiscalização e orientação quanto ao manejo adequado das árvores urbanas", lembrou o secretário