A humanidade sobrevive no planeta Guerra
A paz é a maior fonte de saúde das pessoas porque contribui para a harmonização equilibrada das funções de seu organismo. Por isso, o conceito de saúde é o bem-estar físico, mental e social do indivíduo. Essas considerações precisam ser ressaltadas para que seja preservado o modelo correto da sociedade humana.
Uma das evidências incontestáveis é o que ocorre no campo da saúde. A prevenção das doenças perdeu a relevância com a qual deve ser praticada. Assim, prosperam a medicalização das doenças e o intervencionismo cirúrgico, que se tornam indispensáveis quando a prevenção das doenças não é devidamente valorizada.
Torna-se claro que, sem a paz, não há convivência saudável, capaz de manter uma interação humana educada, respeitosa e altruística. Ao contrário, expande-se a guerra, um horroroso marco da história da humanidade, que impede a globalização igualitária do bem-estar físico, mental e social das populações.
Prevalece, então, o segregacionismo que se expande mundo afora. A agressividade potencial impera nos ambientes ditos sociais; a escravidão é mantida na sua versão moderna e ilusória; as taxas de homicídio e feminicídio não param de crescer; a violência sexual não poupa nem a criança; a fome e a desnutrição são prova da pobreza que acomete grande parte da população mundial; o estresse torna-se crônico, causando enfermidade. Esses são os efeitos da lamentável educação bélica de vários governantes dos países atuais, assim como do passado. É o cenário que resulta de suas ações desumanas, destrutivas, massacrantes, esmagadoras e coerentes com o nefasto perfil de donos do mundo.
A guerra nasceu da espécie Homo sapiens, que surgiu no planeta há milênios.
Como consequência, o belicismo tornou-se rotina ao longo da história da humanidade.
A espécie evoluiu, sem dúvida, mas a provável mutação genética que gerou a violência guerreira deve ter sido incorporada em várias de suas gerações. O progresso da ciência, em vez de gerar a paz, cria ampla tecnologia voltada para a guerra. A ação destrutiva das armas empodera os governos das nações com a base científica que assegura enorme letalidade dos ataques contra populações que são alvo de violência guerreira.
Nessa rota do chamado progresso científico, o poder bélico de um país pode avançar rapidamente graças à agressividade que extermina multidões de pessoas, destrói centros urbanos, habitações, escolas e indústrias dos países atacados como inimigos. É uma prova de que a ciência despreza princípios morais e valores éticos que deveriam ser a base de seu compromisso com a humanidade.
Por esse motivo, a guerra passou a tomar conta da Terra. As espadas evoluíram para armas de fogo de ampla diversidade e potência letal, como fuzis e metralhadoras; as armas nucleares surgiram durante a Segunda Guerra Mundial, tais como mísseis e bombas atômicas, cuja capacidade letal é muito superior à das enfermidades tratadas pela ciência da saúde.
O historiador e pensador americano Will Durant abordou o tema de maneira inquestionável.
Sua reflexão foi bem lógica. As armas em geral e as nucleares em particular matam muito mais do que as doenças tratadas pela assistência médica. E o fazem de forma arrasadora, sem chance de sobrevivência.
É o poder bélico destrutivo que tomou conta do planeta Terra. Por isso, no momento atual, é correto afirmar que a espécie Homo sapiens já vive no planeta Guerra. Caso não haja reversão desta era de violência, a espécie desaparecerá do planeta Guerra.
Para recuperarmos o planeta Terra, em nome da humanidade verdadeira, há medidas improteláveis a serem tomadas na atmosfera dos princípios humanistas universais. A primeira é rever e renovar os fundamentos da Organização das Nações Unidas (ONU, incluindo- se a paz como objetivo maior. Assim, o nome da instituição deverá ser Organização das Nações Unidas na Paz (Onup). Da mesma forma, a Organização Mundial de Saúde (OMS) há de se comprometer com o bem -estar físico, mental e social das populações, com o objetivo maior de promover a saúde fundamentada em convergências conceituais bem pacifistas. Seu nome poderá ser Organização Mundial de Saúde Pacifista (OMSP). Ademais, as novas gerações merecem ser educadas no horizonte da paz, pois a educação é a alma do altruísmo. Há de ser criada a Organização Mundial da Educação Global (Omeg), encarregada de construir e aplicar o currículo universal e pacifista em todas as nações que integrarem a Onup. Enfim, o futuro da humanidade requer a reversão do planeta Guerra e a reconstrução de um planeta Terra pacífico.
(*) Dioclécio Campos Júnior é professor emérito da Universidade de Brasília, doutor em Pediatria e membro titular da Academia Brasileira de Pediatria.