Aqui quero viver
Há pouco o Chanteclair cantou anunciando um novo dia. Dias comuns como tantos outros, mas um dia significativo em uma interiorana cidade sul-mato-grossense. Cidade que há 100 anos é banhada pelo Rio Paraguai, que há cem anos tem o mais lindo pôr-do-sol pantaneiro.
Cidade que viveu altos e baixos. Passou por três enchentes, viu o tanino do quebracho ser sua maior fonte de renda por décadas, viu a Mate Laranjeira ser criada e ir a falência.
Cidade de gente grande, de crianças e de idosos que contam a historia da cidade como causos que se conta aos netos. Pessoas guerreiras que batalham o pão de cada dia no pescado, na pecuária, no turismo ou no pequeno, porém expressivo comercio local.
Aqui tem índios, brancos, pardos, negros, paraguaios... Gente que fala guarani, português e espanhol. Gente HU-MIL-DE, que na confluência da vida, se entregam ao ritmo da cidade.
O sol arde nesta centenária cidade, o frio, vez ou outra aparece, mas aqui o tereré prevalece.
Quando se chega à cidade, pelo asfalto, vê-se uma placa que diz: “Aqui começa o Brasil”, mas isso se deve as primeiras chegadas pelo rio, único porto de desembarque para quem vem do lado de lá, que por anos e anos, era a única forma de se entrar no Brasil.
Realmente, aqui começa o Brasil, e a hospitalidade pantaneira é de primeira, uma verdadeira aula de etiqueta de como tratar bem os visitantes, e esses vão montes a procura de pesca, de sossego, de cultura, pura. Querem ver e ouvir as tais cantoras meninas, que encantam o Brasil. Querem discutir que é o pai do Encantado, ou o herdeiro do Candil. Bandido mesmo é touro que rouba a cena com o forte verde de nossas matas.
Aqui se anda de harley, chalana e bicicleta. Caminha-se pela orla pantaneira. Come-se Chipa, sopa paraguaia e um tal de bife encapado.
Engraçado, chamais me imaginei apaixonado por uma cidade. Jamais me imaginei apaixonado por uma senhora de 100 anos.
Hoje posso dizer que sou sul-mato-grossense por inteiro, nascido em três lagoas, vivi parte da minha vida em Campo Grande, amei Corumbá, descobri Bonito, mas é aqui quero fincar minhas raízes e criar meu filho. Aqui, nessa pequena Porto Murtinho.
*Rodrigo Ostembrg é jornalista
Os artigos publicados com assinatura não traduzem necessariamente a opinião do portal. A publicação tem como propósito estimular o debate e provocar a reflexão sobre os problemas brasileiros.