Papel da Bioeconomia na superação social e econômica no pós-coronavírus
Como a Bioeconomia contribui na superação social e econômica no pós-coronavírus
Em meio à pandemia do novo coronavírus (Covid-19), o mundo se empenha para superar as crises sociais e econômicas causadas pela doença. Segundo relatório divulgado pelo Banco Mundial, a previsão é que o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil caia 8% em 2020. Esse recuo no PIB nacional gera consequência tanto para os empregos quanto para a sociedade em geral. E Mato Grosso do Sul não é exceção. Aqui, porém, a diferença se mostra através de setores já consolidados – como o agronegócio, que possui papel fundamental para a retomada da economia, tendo em vista as potenciais demandas por alimentos e energia do Brasil e dos diversos países atingidos pela crise.
A diversificação da economia ocupando espaços em mercados emergentes também pode ter um papel chave para superação de crises. Neste contexto, a bioeconomia, com suas redes produtivas sustentáveis baseadas em biodiversidade e serviços ecossistêmicos, oferece inovações que auxiliam o estado a percorrer novos mercados nos próximos anos.
Com sua vasta biodiversidade, Mato Grosso do Sul é um grande encontro entre Mata Atlântica, Cerrado, Chaco e Pantanal. Recentemente o Programa Biota-MS registrou mais de 9000 espécies de animais e plantas no estado. Grupos de pesquisa de universidades e institutos sul-mato-grossenses, constantemente publicam novas espécies que são descobertas. Além dos recentes estudos de sequenciamento genético de microrganismos, que listam centenas de espécies em poucos centímetros de solo ou pedaços de outros organismos. Esta infinidade de seres vivos promove diversos serviços que nos beneficiam – chamados serviços ecossistêmicos.
Nossa economia está basicamente ancorada em cinco espécies exóticas: gado bovino, suíno, milho, soja e eucalipto. Em menor escala, encontra-se: cana de açúcar, algodão, aveia e mandioca.Além dos peixes, que movem as cadeias produtivas da pesca e as belas paisagens e biodiversidade que movimentam o turismo.Dados do Observatório do Turismo mostram que entre 2014 e 2018, cerca de duzentos mil pescadores movimentaram o turismo de pesca. São, aproximadamente, 50 mil pescadores por ano, considerando um gasto médio de R$ 1.500,00 reais,ou seja, mais de 75 milhões anuais gerados por esta atividade.
Ainda assim, explora-se pouco diante do potencial notado no estado. Não olhamos de forma empreendedora, criativa e inovadora para as mais de 9000 espécies registradas e, tão pouco, os serviços ecossistêmicos das paisagens sul-mato-grossenses. Assim como os setores da culinária, cosméticos, farmacêuticos e alimentos funcionais, pouco exploram as potencialidades da biodiversidade do estado.
A Pesquisa da Extração Vegetal e da Silvicultura (PEVS) mostra que, em 2018, a extração vegetal de produtos alimentícios foi de quase R$ 500 mil reais. No mesmo período, a produção de jacarés alcançou R$ 3 milhões. Dados da Pesquisa Pecuária Municipal (PPM) também mostram que, considerando apenas as espécies nativas de peixes produzidas em cativeiro, o valor atingiu R$ 20 milhões de reais, no mesmo ano.
A Economia dos Ecossistemas e da Biodiversidade (Teeb, na sigla em inglês), realizado pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), mostra um cenário positivo para o mercado sustentável e assente à biodiversidade, gerando oportunidade de negócios. A estimativa feita pela organização mostra que a movimentação anual desse setor cresça de US$ 40 bilhões em 2008 para US$ 210 bilhões em 2020.
Exemplos que demonstrem o quanto os negócios em biodiversidade em Mato Grosso do Sul, embora ainda incipientes, já podem ser observados no estado. É possível encontrar cervejas, pratos criativos, mel de espécies de abelhas nativas, sorvetes, shampoos, cremes derivados das plantas nativa sem prateleiras de grandes redes de supermercados e feiras de países desenvolvidos. Bem como fazendas de jacarés em Corumbá, bio fábricas de insetos para controle biológico na região sul do estado, também fazem parte dessa realidade. O comércio de isca, equipamentos de pesca e camping, ocupam grandes áreas em algumas lojas, todos dependentes da biodiversidade.
Pesquisas voltadas para biodiversidade já estão consolidadas em vários programas de pós-graduação de universidades,variando de linhas de taxonomia a prospecção de fármacos, até produção e desenvolvimento econômico em bases sustentáveis. Uma infraestrutura de educação, pesquisa e extensão que tem como base a biodiversidade e com suporte para formação de profissionais na região, inclusive movimentando economias locais com aluguéis de casa, hospedagem,alimentação e lazer, serviços que geralmente não são contabilizados como provenientes da biodiversidade.
Coleções biológicas já estão instaladas nas universidades e centros de pesquisa, como Embrapa, Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) e Universidade Federal da Grande Dourados(UFGD). Museus e aquários já operam em Bonito e Corumbá, e novos estão em construção em Costa Rica,no Parque Estadual Nascentes do Rio Taquari. O Centro de Estudos e Pesquisa em Bioeconomia será, em breve, inaugurado na capital,e poderá ser uma das maiores infraestruturas para negócios em biodiversidade do Brasil, além do Aquário do Pantanal.
As paisagens desempenham vários serviços ecossistêmicos, como o estoque de carbono, purificação e manutenção de água e o controle de sedimentação. Trata-se de serviços que já estão sendo quantificados pelo estado e contabilizados monetariamente por pesquisadores associados ao programa Biota-MS.
Na capital, programas de pagamentos por serviços ambientais tornou-se concreto, e novos modelos estão sendo implementados na bacia do Rio Miranda. O programa de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) ecológico beneficia mais de 73 municípios, movimentando mais de R$ 84 milhões, anualmente. Negócios ligados a estoque de carbono já começaram no estado, na região da Serra do Amolar. Além disso, cadeias produtivas envolvendo restauração ambiental também sinalizam grande potencial, voltadas para mercados de compensação.Os incentivos e negócios para produção orgânica, incluindo de gado em pastagens nativas, também nos mostram claramente uma produção baseada em serviço ecossistêmico.
Em síntese, Mato Grosso do Sul possui diversas experiências voltadas para bioeconomia. O desafio está em diversificá-las, expandi-las, popularizá-las, para que o estado ganhe escala e beneficie o maior número de pessoas. Uma grande rede de colaboração começa a ser desenhada, incluindo pesquisadores, órgãos governamentais, empreendedores, ONGs, programas federais e estaduais de incentivo à bioeconomia, entre outros. A crise vivencia da causa urgência para a construção desta rede que poderá ajudar o estado a consolidar ainda mais as iniciativas em andamento e gerar transições sustentáveis criativas baseadas na nossa rica biodiversidade para os próximos anos.
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