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Previdência: o insustentável peso da realidade

Por Normann Kallmus (*) | 22/04/2019 15:11

Quem nunca ouviu a frase “não existe essa coisa de almoço de graça”? Em “economês” isso se chama trade-off e quer dizer que ao decidirmos fazer alguma coisa, deixaremos de fazer alguma outra coisa, pelo menos naquele momento.

A discussão sobre a necessidade de reformar a previdência, passa por essa constatação. Não é que o país vai quebrar se não a reforma não passar, é que o ajuste vai acontecer, de um jeito ou de outro. Simples assim!

Não precisa ter imaginação: lembre da Grécia, lentamente se reorganizando, de Portugal, agora andando rápido e do Rio de Janeiro, onde nada foi feito e que continua “no buraco”.

Quando o desequilíbrio ocorre em alguma esfera inferior, funcionam os mecanismos locais. Primeiro o governante vai à público dizer que “vamos ter que apertar os cintos”, reduz horário de atividade e o cafezinho. Depois os aposentados deixam de receber. Por último entram na ciranda os servidores públicos da ativa. A quem vão reclamar se não há dinheiro? Podem pedir demissão e procurar emprego em outro canto. Vai ser difícil de encontrar porque estamos em recessão, lembra?

Mas se o problema é do país, entra em ação outro mecanismo porque a autoridade monetária pode emitir dinheiro. Na falta de alternativa, essa poderá ser a solução. Vai ser até mais fácil. Não tem que negociar com o STF, nem aguentar deputado chamando ministro de “tchutchuca”. É só imprimir dinheiro. Fácil, né? Só que não (ou #SQN para quem é mais ligado às mídias sociais.

Aumentar a massa monetária em circulação (esse é o nome esquisito que os economistas dão para impressão de moeda), vai gerar inflação, muita inflação. Mas todo mundo recebe e ninguém vai poder reclamar, apesar da queda do poder de compra do salário. Lembra do que comecei falando a respeito de almoço de graça?

Pode-se mudar o nome das coisas, mas isso não muda sua essência. Pau é pau, pedra é pedra e fim de papo, apesar de sermos brasileiros e acreditarmos no infinito poder do jeitinho.

A previdência do jeito que está, gera insegurança no ambiente econômico, portanto, se for resolvido o problema, passamos a ter mais oportunidades de investimento.

Nossos congressistas e o STF só podem ter duas razões para não entender: querem “valorizar o seu passe” ou não querem que o país dê certo para evitar a continuidade do governo atual. Ambas ensejam má fé.

Esse não é um tema novo. FHC já tinha identificado o nó, mas preferiu garantir a reeleição do que resolvê-lo. Lula sempre foi consciente da necessidade de alteração e chegou a falar diversas vezes a respeito, mas apesar de contar com aprovação de “mais de 100%” dos brasileiros, segundo sua avaliação, nunca se dispôs a enfrentar o tema para garantir a manutenção de sua aura. Dilma falava a respeito, mas para não abandonar o culto à mandioca, deixou-o de lado. Temer quase o fez, mas a divulgação da gravação do “tem que manter isso aí”, sepultou a possibilidade. Sobrou para Bolsonaro, ou melhor, para Paulo Guedes.

Problemas crescem quando não são enfrentados e este é o caso.

Entre 2000 e 2010, apenas 10 anos, a população jovem (até 24 anos), caiu de 49,6% para 42,1% (-7,5 pontos percentuais). É essa população que não vai conseguir pagar a conta da nossa previdência, se não fizermos nada.

No mesmo período de 10 anos, a natalidade caiu quase 8% e a mortalidade, quase 9%. A expectativa de vida ao nascer, no entanto, cresceu 8%.

Com o sucesso da ciência, a população está chegando a idades cada vez mais avançadas. Maior longevidade, mais dinheiro necessário para aposentadorias. Menos jovens, porque caiu a taxa de natalidade, menos trabalhadores contribuindo.

A oposição à mudança na previdência não tem nada a ver com dúvidas técnicas, mas com defesa de interesses de alguns grupos em relação ao restante da população. Estamos buscando um “jeitinho”, mas dessa vez não vai dar.

Mas se você prefere a inflação e mais recessão, fique à vontade. Só não diga que não foi avisado. Lembre que estamos mais velhos e que é ridículo “pagar de adolescente, talquei”?

(*) Normann Kallmus é economista-chefe da Associação Comercial e Industrial de Campo Grande (ACICG), especialista em Gestão do Conhecimento (COPPE/UFRJ), Administração de Projetos Logic-Frame (BID) e Educação Ambiental (SENAC).

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