Ainda sem data confirmada, MS continua na expectativa pela vacinação de crianças
Anvisa liberou uso de doses da Pfizer a este grupo, mas Ministério da Saúde não tem doses compradas até agora
A vacinação de crianças de cinco a 11 anos foi permitida pela principal entidade reguladora do País, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), por meio de vacinas da Pfizer, que cumprem critérios de segurança e eficácia. No entanto, a imunização desta faixa etária segue sem uma data definida para começar em território brasileiro, por conta de impasses no governo federal. A previsão só deve acontecer em janeiro.
O secretário estadual de Saúde, Geraldo Resende, explicou nesta manhã (21) ao Campo Grande News que Mato Grosso do Sul espera a definição oficial para vacinar esse grupo. Vale lembrar que o Ministério da Saúde não comprou, até o momento, vacinas destinadas a crianças. Atualmente, somente indivíduos de 12 a 17 anos estão inclusos no cronograma vacinal brasileiro.
Estamos aguardando o Ministério da Saúde apontar doses, mas o entendimento é que precisamos imunizar as crianças. Foi colocado um item [quarta dose a imunossuprimidos] que, ao meu ver, é importante, mas não é o mais importante. O mais importante é o Ministério responder à questão das doses das crianças, que já foi aprovado pela Anvisa e há uma experiência exitosa em outros países.”
Mãe de dois filhos, a ilustradora Marina Duarte acredita ser importante vacinar todas as crianças que tenham condições e estejam aptas para receber os imunizantes. “Elas convivem muito em aglomerações e precisam ir para a escola, precisam ter a vida social de volta.”
Marina ressalta que a ampla cobertura vacinal dará mais tranquilidade, já que seus filhos não têm idade suficiente, até o momento, para a imunização. “Além de funcionários de escolas, que foram vacinados, as crianças têm de ser prioridade. Eu tenho um filho, que é asmático, mas é menor de cinco anos e não poderá se vacinar agora, mas outras crianças poderão.”
Segundo o secretário estadual, há uma “politização” em relação ao uso de vacinas no Brasil, o que motiva uma série de dificuldades para a proteção imunológica de brasileiros. “Infelizmente, no nosso País, todo o atraso e todas as dificuldades de enfrentamento à covid vêm na politização da vacina. E agora, me parece que querem politizar a questão da vacinação de crianças de cinco a 11 anos.”
O presidente do Brasil, Jair Bolsonaro (PL), avaliou ser "inaceitável" a liberação da Anvisa e disse, em live pessoal, ter pedido, extraoficialmente, o nome dos técnicos que aprovaram a decisão para que "todo mundo tome conhecimento de quem são essas pessoas e, obviamente, forme o seu juízo".
Para a decisão, a agência teve consultoria de especialistas da Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva), da SBPT (Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia), da SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia), e da SBP (Sociedade Brasileira de Imunologia), da SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria) e SBIm (Sociedade Brasileiras de Imunizações), que encaminharam nota ao órgão federal.
O documento foi tornado público e indica que as entidades “manifestam-se favoráveis à autorização por entenderem que os benefícios, no contexto atual da pandemia, superam os eventuais riscos associados à vacinação”. Foram apresentadas informações sobre a doença nesse grupo específico, avaliação de benefícios e condições a serem cumpridas pelos fabricantes após a aprovação.
As vacinas terão de ser oferecidas em dosagens diferentes, mas o Ministério da Saúde postergou o começo desta etapa da campanha. Haverá ainda audiência pública prevista para 4 de janeiro e, no dia seguinte, será batido o martelo quanto a essa questão.
O texto assinado pelo presidente do Departamento Científico de Infectologia da SBP, Marco Aurélio Palazzi Sáfadi, presidente do Departamento Científico de Imunizações da SBP, Renato de Ávila Kfouri e diretora do Comitê de Imunizações da SBI, Rosana Richtmann, ressalta que muitas crianças têm sofrido por conta da doença e de outras enfermidades associadas, com hospitalizações e até mortes.
No Estado, ao menos, sete crianças desta faixa etária de cinco a 11 anos foram vítimas de coronavírus, desde o início da pandemia. “Temos hoje mais de 5 milhões de doses aplicadas desta vacina em crianças de 5 a 11 anos nos Estados Unidos da América e em outros países, com dados de farmacovigilância não revelando eventos adversos de preocupação”, diz o documento.
Confiança - Marina entende que o fato de ter havido uma liberação por parte do corpo técnico da Anvisa dá confiança em relação à campanha, ainda que falte uma conscientização por parte do governo federal. “Além de ter sido liberado pela Anvisa, o mundo inteiro está empenhado em buscar uma forma de viver em sociedade sem estar isolado. Não deveria ser uma preocupação, mas sim, um agradecimento à ciência”.
Para ela, famílias que recusarem a vacina aos filhos faltarão com responsabilidade coletiva, promovendo eventuais surtos da doença, mas o papel do Poder Público é fundamental para essas ações. “É muito difícil a gente tocar nesse assunto, com seriedade, enquanto a gente não tiver campanhas séries de conscientização”.
A jornalista Agatha Espírito Santo, de 29 anos, mãe de um filho de quatro anos, também confia no potencial da vacinação e destaca que outras doenças estariam em alta se não fossem imunizantes, tais como a poliomielite. “A gente tem, ao longo da história, endemias e pandemias que foram controladas pela vacinação. É um pacto coletivo, a gente vacina em prol da sociedade, também daqueles que não podem ser vacinados, como crianças em tratamento de câncer”.
Ela também reforça que aguarda a permissão para vacinar seu filho, já que os fármacos foram elaborados pelas maiores entidades de saúde do Brasil e do mundo, para que uma solução fosse encontrada. “Isso é histórico, um marco, a gente tem que reconhecer. E é um pouco delicado, vai além da questão individual, é um exercício de cidadania, que precisa ser feito em prol da comunidade. A partir do momento em que você vive numa comunidade e usufrui do espaço público e privado, você tem compromissos com algumas esferas, principalmente com seus pares”.
Quarta dose - A discussão de vacinar crianças ocorre em meio a uma recente ampliação das doses de reforço - nesta semana, o Ministério da Saúde entendeu que é preciso aplicar uma quarta dose a pessoas imunossuprimidas, que já receberam três imunizantes anteriormente. Ainda que não seja a maior prioridade, na visão do secretário estadual, ele ressalta a importância em manter a proteção de tais indivíduos, que têm deficiência relacionada ao sistema imunológico.
A quarta dose em imunossuprimidos, acima de 18 anos, é imperativa. A gente está vendo as mutações, que estão acontecendo, como a Ômicron, aqui no Brasil. E esse público é vulnerável, é o que precisa de uma atenção especial, com essa quarta dose, para reagir, fazer o enfrentamento do vírus e aumentar a imunidade.”
Resende critica a baixa adesão de parte da população, especialmente para a continuidade do ciclo vacinal. Isto é, que os sul-mato-grossenses retornem aos postos de saúde para tomar as vacinas de reforço. Segundo ele, há uma incompreensão de que a pandemia ainda oferece risco à população.
“A baixa adesão ao processo de imunização vem da incompreensão do nosso povo, de que a gente já superou a doença, que a gente já venceu a doença, por causa dos números que hoje são totalmente diferentes do que aconteceu cinco, seis meses atrás. Há um baixo número de casos, internações e óbitos, que faz com que as pessoas tenham uma falsa compreensão de que a doença foi vencida - e não foi.”
Dados da SES (Secretaria Estadual de Saúde) atualizados há pouco mais de 10 dias indicam que a média diária de mortes por covid era de pelo menos uma vítima. Ainda que seja número inferior ao verificado em meados de junho, esse índice nunca foi zerado e os casos, leves ou graves, ainda são registrados em dezenas.
“Estamos fazendo todas as estratégias para vacinar, apesar do Estado ser o que mais aplicou dose de reforço em todo o País, precisamos ampliar a terceira dose e precisamos finalizar o agrupamento dos adolescentes, apesar de estarem bastante vacinados, tanto com a primeira dose quanto da segunda.”
O secretário e médico destaca os benefícios da vacinação e alerta que a não adesão faz com que se aumente a exposição própria e coletiva ao coronavírus. “Há um desafio enorme de buscarmos vacinar quem teima em não tomar a vacina. São esses que estão morrendo, que estão aparecendo casos. Estive numa cidade do interior, que há um tempo não tinha caso, e veio a óbito um cidadão de 80 anos, que não quis se vacinar. Ele pagou com a vida essa sua teimosia.”
Atualmente, mais de 4,6 milhões de doses foram aplicadas em território estadual. Na prática, cerca de 72,38% da população total, de aproximadamente 2,8 milhões de habitantes, tem o primeiro ciclo vacinal finalizado - ou seja, recebeu dose única ou duas vacinas.