De Giroto a feminicida: só preventiva mantém parte dos condenados presos
O fato de o crime ser hediondo, ou não, não interfere na possibilidade de réu responder processo em liberdade
O dia 7 de novembro de 2019 é divisor de águas para o cumprimento de penas de prisão impostas pela Justiça brasileira. Nessa data, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu que réus considerados culpados só podem começar a execução penal se não houver mais possibilidade de recursos. Foco das atenções principalmente por beneficiar o condenado mais polêmico do País, o agora livre ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de 74 anos, o entendimento tem impacto amplo e irrestrito. Em Mato Grosso do Sul, conforme levantamento feito pelo Campo Grande News, é só a prisão preventiva que garante a manutenção na cadeia de presos de colarinho branco, como o ex-deputado federal Edson Giroto, alvo da Operação Lama Asfáltica, até o feminicida confesso Luiz Alberto Bastos de Oliveira, condenado a 27 anos pelo assassinato a marteladas da musicista Mayara Amaral crime ocorrido em 25 de julho de 2017, no quarto de um motel, e que ganhou as manchetes nacionais e levantou discussões sobre violência contra a mulher.
No caso de Luiz Alberto, conhecido como Luizinho, de 31 anos, a condenação ocorreu em 29 de março deste ano, pelo tribunal do júri, em Campo Grande. É uma decisão, portanto, de primeira instância e ainda cabem recursos nos tribunais superiores, cujo tempo para transitar em julgado é imprevisível. Pode durar anos.
A defesa tentou livrar Luizinho das acusações mais graves, alegando insanidade mental, mas a tese não convenceu e ele foi considerado culpado por homicídio qualificado por motivo fútil, meio cruel, recurso que dificultou a defesa da vítima e feminicídio. Também recebeu pena por ter furtado dinheiro e objetos da jovem e, ainda, pela ocultação do cadáver da jovem de 27 anos.
Ele está na cadeia desde o dia do crime, graças a mandado de prisão preventiva. O advogado, Conrado Passos, não apresentou recursos contra essa ordem de encarceramento. Ao Campo Grande News, declarou esta semana ter sido esse o combinado com a família do rapaz, diante da gravidade do caso, até como medida de segurança do réu.
Recurso em análise - Diante da decisão do Supremo, o defensor diz que ainda vai aguardar o resultado da apelação da sentença no Tribunal de Justiça. Embora o processo seja sigiloso, a reportagem obteve a informação de que o julgamento pela 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça está marcado para 12 de dezembro deste ano.
Advogado, delegado e um promotor ouvidos pela equipe consideram improvável derrubar a prisão preventiva. Mas tecnicamente, se isso ocorresse, a defesa de Luiz Alberto Bastos teria sim, direito a pedir a soltura dele.
Graças ao STF - Luizinho cumpre pena no IPCG (Instituto Penal de Campo Grande, no complexo penal da saída para Três Lagoas. A unidade é vizinha ao CT (Centro de Triagem) Anízio Lima, onde o ex-deputado federal e ex-secretário de Obras de Campo Grande e Mato Grosso do Sul Edson Giroto, 60 anos, também está preso. Não fosse decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) de maio do ano passado, determinando a volta do político e de outros sete alvos da Operação Lama Asfáltica para a cadeia, ele já teria deixado a conhecida cela 17.
Condenado à pena de reclusão de nove anos, dez meses e três dias em março deste ano, ele ganhou direito a ir para o regime semiaberto no dia 1º de novembro, por ter cumprido um sexto da pena - no cálculo estão inclusas todas as vezes que ele ficou preso, mesmo que por pouco tempo, e os 556 no CT desde a última detenção. Segundo o advogado do ex-parlamentar, Valeriano Fontoura, Giroto será mantido recluso porque pesa contra ele prisão preventiva.
Os mandados, incluindo o de Giroto, em maio de 2018, foram resultado da Operação Fazendas de Lama, deflagrada em 10 de maio de 2016. A liberdade dos investigados veio no dia 24 de junho daquele ano, quando o ministro Marco Aurélio, do STF, considerou não haver elemento concreto para justificar o encarceramento e concedeu liminar.
O mérito do habeas corpus começou a ser julgado no dia 26 de setembro de 2017 e em maio do ano seguinte, o Supremo mudou o entendimento e oito de volta para a prisão.
Numa das ações derivadas da Fazendas de Lama, Giroto foi condenado a quase dez anos em regime fechado por ocultação de recursos originados na compra de uma propriedade rural, no valor de R$ 7,63 milhões.
Impacto desconhecido – A mudança imposta pelo Supremo Tribunal Federal, segundo cálculo do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), atinge 4,9 mil condenados em todo o País. Não foi feito recorte estadual.
Conforme o Campo Grande News levantou junto à Amamsul (Associação dos Magistrados de Mato Grosso do Sul), dos cerca de 19 mil detentos do Estado, mais de um terço, ou 6,3 mil, não têm condenação definitiva. Não há levantamento dos que têm prisão preventiva.
Diretor de Prerrogativas da Amamsul e responsável pela fiscalização do cumprimento de pena de 5 mil internos dos presídios fechados em Campo Grande, o juiz Mário José Esbalqueiro Junior já concedeu, nesta semana, a soltura de réu por assassinato, condenado a 12 anos. Ele ficou no presídio 51 dias após o júri. Na decisão, o magistrado ressaltou ser contrário ao entendimento do Supremo.
Entenda - A tese acatada pelos ministros argumenta que a Constituição de 1988 só considera alguém culpado de crime passível de prisão depois de condenação transitada em julgado. Até lá, vale a presunção de inocência, alegam os responsáveis pelas ações vitoriosas no Supremo.
A prisão preventiva é prevista nos casos em que o réu apresenta algum risco se ficar solto, à segurança pública, de fuga ou de interferência no processo, conforme prevê a legislação brasileira. Existem ainda as figuras da prisão provisória, com tempo estipulado, normalmente para assegurar investigações, além dos flagrantes.
Respondendo a dúvida apresentada por leitores do Campo Grande News, o fato de o crime ser hediondo, ou não, não interfere na possibilidade de responder processo em liberdade. A diferença é que nessas infrações criminais, nem o delegado nem o juiz podem arbitrar fiança.
Na decisão do STF, não ficou expresso de forma taxativa que as pessoas atrás das grades por força de sentença de segunda instância sejam automaticamente liberadas. Por isso, a praxe tem sido as defesas provocarem a Justiça.
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