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Cidades

“Leilão danado”: para PF, diálogo revela negociação de propina por sentença

Diálogos de advogado são evidência da compra de decisão em disputa judicial por fazendas, diz PF

Por Anahi Zurutuza | 26/10/2024 10:49
Sala de julgamentos da Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça (Foto: TJMS/Divulgação)
Sala de julgamentos da Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça (Foto: TJMS/Divulgação)

Para a Polícia Federal, conversas entre os investigados na Operação Ultima Ratio são reveladoras. O diálogo entre advogado e servidor do Judiciário investigados é um dos que encorpam o conjunto de provas sobre esquema de comércio de sentenças do TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul).

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A Operação Ultima Ratio da Polícia Federal revelou um esquema de corrupção no Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, envolvendo a venda de sentenças. Conversas interceptadas entre um advogado e um servidor do Judiciário indicam que decisões judiciais eram compradas, com menções específicas a desembargadores que teriam recebido pagamentos em troca de votos favoráveis em processos. A investigação, que resultou em 44 mandados de busca e apreensão, visa apurar crimes como corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa no sistema judiciário do estado.

Na troca de mensagens interceptada, o advogado prevê o resultado de julgamento. Por volta das 13h do dia 6 de abril de 2021, ele diz a Danillo Moya Jerônymo, sobrinho do conselheiro do TCE (Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul), Osmar Jeronymo, e servidor do TJ, que vai “faturar por 3 x 2” disputa judicial em sessão que começará às 14h.

O advogado revela ainda que teve alguma dificuldade de comprar a decisão. “Pqp leilão danado kkkk... Cada um quer mais que o outro”, afirma.

Dois dias depois, ele volta a falar com o servidor sobre o assunto, confirmando o placar anunciado. A PF entende que a conversa do dia 8 de abril reforça que houve compra de decisão judicial, porque o advogado diz: "tava complementando um pagamento daquele que foi terça, cara, ganhei por 3 a 2 lá, Bolachinha, Marcão e Divoncir”.

De acordo com relatório da PF que embasou a autorização do ministro Francisco Falcão, do STJ (Superior Tribunal de Justiça), para a deflagração da Operação Ultima Ratio, “Bolachinha, Marcão e Divoncir” são, respectivamente, os desembargadores Sérgio Martins, atual presidente do TJMS, Marcos José de Brito Rodrigues e Divoncir Schreiner Maran.

Uma das conversas interceptadas pela Polícia Federal (Foto: Reprodução da decisão judicial)
Uma das conversas interceptadas pela Polícia Federal (Foto: Reprodução da decisão judicial)

A investigação apurou ainda que a sentença mencionada foi dada em processo que começou a tramitar em 2015. A briga é entre vendedores e compradores de fazendas. Um negócio de R$ 5,8 milhões.

Conforme narrado pelos credores na petição inicial, foi acordado pagamento parcelado pelas terras, mas os compradores fizeram somente 4 depósitos somando um total de R$ 2 milhões. Diante da inadimplência, os antigos proprietários foram à Justiça para rescindir o contrato de compra e venda, além de pedir a reintegração de posse da área, que já estava sob o domínio dos novos donos.

A decisão de primeiro grau foi favorável ao primeiro pedido, mas naquele dia 6 de abril, em sessão da 1ª Câmara Cível do TJMS, os desembargadores Sérgio Martins, Marcos Brito e Divoncir Maran votaram pela reforma da decisão, enquanto Marcelo Rasslan e João Maria Lós foram votos vencidos – três a dois, portanto. Os compradores mantiveram a posse das fazendas.

Outro diálogo extraído de celular demonstra as tratativas para fazer o pagamento de um dos desembargadores, no dia 8 de abril. A conversa é entre o advogado da causa que pede ao cliente, um dos proprietários rurais, para “depositar o do Gordo”. “Não fura hoje não hem”, completa.

No dia 10, o advogado cobra que o cliente “complete” o valor exigido por “Gordo”, que conforme a PF, trata-se de Marcos Brito, que recebeu R$ 15 mil para dar decisão favorável ao fazendeiro.

Ultima Ratio – Nesta quinta-feira, a Polícia Federal foi às ruas para cumprir 44 mandados de busca e apreensão em Campo Grande (MS), Cuiabá (MT), Brasília (DF) e São Paulo (SP).

O STJ ainda deferiu o pedido de afastamento dos sigilos bancário e fiscal de investigados, além de determinar o afastamento das funções e o monitoramento por tornozeleira eletrônica dos desembargadores: Vladimir Abreu da Silva, Alexandre Aguiar Bastos, Marcos José de Brito Rodrigues, Sérgio Fernandes Martins e Sideni Soncini Pimentel. O conselheiro Osmar Jeronymo também foi afastado do TCE e ele e o sobrinho serão monitorados.

A ação levou o nome de “Ultima Ratio”, expressão do latim traduzida literalmente como “a força é o último argumento dos reis” e que significa que esgotados todos os argumentos razoáveis num debate, impõe-se o uso da força.

Segundo a Polícia Federal, o objetivo é “investigar possíveis crimes de corrupção em vendas de decisões judiciais, lavagem de dinheiro, organização criminosa, extorsão e falsificação de escrituras públicas no Poder Judiciário de Mato Grosso do Sul”.

A reportagem não conseguiu contato com os citados, mas deixa o espaço aberto para futuras manifestações.

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