Sem velório, professora que morreu de covid é homenageada na escola que fundou
Ex e atuais alunos e funcionários foram prestar homenagem à professora Claudinea, que morreu ontem de covid-19
O estacionamento que sempre recebeu estudantes hoje ficou lotado de saudade. Na escola que fundou, O Quintal, a tia Nea foi homenageada por ex e atuais alunos, funcionários e familiares com coroas e flores. Cladinea Amorim Barbosa tinha 74 anos e morreu ontem (18) em decorrência da covid-19. Sem velório, esta foi a forma encontrada pela família que ela formou ao longo de 41 anos de se despedir
Coordenadora do Ensino Fundamental 1 da escola O Quintal, Fernanda Reis tem 43 anos de vida e 26 de aprendizado ali. Mãe de duas meninas que passaram pelas salas de aula do Quintal, Fernanda volta no tempo ao se lembrar que adentrou os portões da escola como estagiária e nunca mais saiu.
"Conheci a Claudinea quando estava no magistério, fiz estágio aqui e não saí mais. Entrei com 17 anos, aqui construí a minha família. A Claudinea era a minha inspiração diária, familiar e profissional. Foi a minha segunda mãe", descreve.
Emocionada, a coordenadora fala que o que mais marcou a chefe foi o amor pela educação. "Para ela não existia nada mais importante do que alfabetizar e ela fazia isso com maestria. Ficou um buraco, parece que estamos vivendo esse pesadelo há 15 dias e não conseguimos acordar", desabafa.
Claudinea ficou 15 dias internada na Santa Casa e há uma semana estava intubada. "Vamos dar continuidade do que ela nos ensinou e vamos fazer a escola ser o que era com ela, seu legado será cumprido", promete Fernanda.
Empresário e professor de inglês, Firmino Cortada Neto, de 32 anos, foi um dos alunos que passaram pela escola e que não deixaram de homenagear a diretora querida. Ele esteve sob os olhares e cuidados de Claudinea de 2001 a 2003.
"A Claudinea era um exemplo de educadora. Eu sofria muito bullying da escola que eu vim e aqui me senti amado e acolhido. É uma escola que sempre estimulou os alunos, tem tato e a parte pedagógica é incrível. Se um dia eu tiver um filho, ele estudará aqui com certeza", testemunha.
Mesmo formado, Firmino retornava à escola para visitar Claudinea. O hábito virou rotina para muitos ex-alunos que volta e meia apareciam para cumprimentar a diretora. "Saber da notícia foi chocante. Essa doença não faz distinção. Ela pega todo mundo e temos que nos cuidar. A imagem que eu tenho dela é de uma pessoa viva, muito alegre e pra cima", descreve.
Claudinea sabia nome e sobrenome de todos os alunos que passaram pela escola. Ela também guardava os bilhetes que recebeu ao longo das décadas com o mesmo carinho com que lhe foram entregues, como narrado na reportagem do Lado B em 2014: "Da escola para casa, professora leva e guarda cartinhas dos alunos há 30 anos".
As filhas de Fernanda, a coordenadora a dar o primeiro depoimento, também não deixaram de falar. Gabriela Guedes da Silva, de 21 anos, estudou de 2000 a 2013 no colégio. "Para mim, ela era uma família, representava a extensão da nossa casa e sempre muito disposta a ajudar os alunos como se fossem os netos dela. Ela vai fazer uma falta tremenda. Crescemos aqui e ela era muito próxima de nós. Temos muitas lembranças boas, ela nos dava colo quando precisávamos e foi incentivadora dos nossos sonhos", conta.
A irmã, Isabela Guedes da Silva, de 14 anos, concluiu este ano o Ensino Fundamental na escola. "Me sentia acolhida por ela, ela se preocupava com todo mundo e incentivava a gente. Era uma mãezona e a cabeça chefe daqui. A alegria e o jeito como ela se preocupava com todo mundo vai fazer muita falta", enxerga a estudante.
As flores entregues na escola serão levadas para o sepultamento. A família não informou local nem horário e apenas disse que ainda serão definidos.