Transportando pacientes por todo País, Gabriel enfrenta a covid no ar
Recém-formado, o médico Gabriel Sayegh divide o que tem aprendido ao transportar pacientes graves
Recém-formado e já lançado na linha de frente para atender pacientes com covid-19 que são transferidos de um hospital para outro por uma UTI aérea, aos 23 anos, Gabriel Kosurian de Souza Sayegh tem lidado com as dificuldades que o tratamento da doença exigem também no ar.
Pouco antes de se formar médico, Gabriel pegou covid durante um estágio e ainda passou para toda a família. Hoje, nos plantões feitos em voos, vê o quanto é preciso agir rápido e dar suporte para o paciente chegar vivo ao destino.
Os primeiros plantões ainda eram de pacientes que não tratavam a covid, no entanto, os últimos três meses têm se resumido a levar pessoas graves e intubadas para todos os cantos do País.
"Fiz um transporte do Pará, o paciente estava muitíssimo grave, mesmo, bem instável. A cada movimento, ele instabilizava mais, baixava a saturação. Também tem os voos tranquilos, de pessoas com poder aquisitivo alto que não querem tratar aqui e preferem ir para São Paulo", conta.
A diferença da UTI aérea está nas condições exigidas no caso de pacientes intubados para um transporte seguro, a principal delas envolve a pessoa estar muito bem sedado. "Porque conforme vai subindo, o ar vai ficando rarefeito, tem que aumentar a fração inspirado de oxigênio, então para um paciente que está com a fração inspirado de oxigênio de 60,70%, quando vai levantar voo ele precisa de mais. Não posso pegar um paciente que esteja com fração inspirada de 02 de 100% e esteja com a saturação baixa, porque ao colocá-lo no ar a saturação do paciente vai cair ainda mais", descreve.
O transporte pode durar em torno de 2h30 até 18h, como foi o caso de quando o médico buscou o paciente em Altamira, no Pará. "Foram 7h para ir e mais 7h para voltar, fora o tempo de parada com paciente no chão", explica. E este foi justamente a passageira que mais lhe marcou pela total falta de estrutura do hospital onde estava.
"Era muito ruim, a cidade é no interior do Pará, não tem nada. Estavam acabando os remédios na veia, tivemos que usar do avião para deixá-la sedada. A gente pedia 'tem tal coisa?' e ouvia 'não, não tem'", reproduz Gabriel.
A transferência do paciente era para São Paulo, mas foi feita a contratação da UTI aérea da Capital porque parte dos familiares vive aqui. "Passamos quatro horas na cidade até ela ficar bem, tirar do hospital, colocar na ambulância é um processo que demorou bastante e mais ainda para colocar no avião", explica.
As aeronaves são equipadas como as unidades de terapia intensiva, com todo aparato que o paciente necessita. "O paciente nunca voa desamparado", enfatiza o médico.
Nestes momentos, Gabriel também vê o sofrimento da família de colocar numa UTI aérea um filho, um pai, um amor. "Muitas vezes as pessoas estão chorando, não querem que o pai vá. Ali é uma lição de vida, de aprender a valorizar que a gente está bem de situação de saúde", reflete.
O trabalho de Gabriel é transportar pacientes que já estejam com a vaga certa, fato que está ficando cada dia mais difícil não só de pessoas que procuram leitos em Mato Grosso do Sul como nos grandes centros.
Servindo também a aeronáutica, o médico relata que na semana passada, por exemplo, chegou a ter 200 pacientes esperando vaga no Estado na central de regulação. O que preocupa e também entristece.
"Ninguém imaginava, no começo da pandemia, que ia durar tanto tempo assim, quando começou no ano passado, eu esperava que até fim do ano estivesse acabado, com certeza". Não foi o que aconteceu.