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Capital

Antes de ser morto, agente pediu transferência e realizou sonho de pai

Renan Nucci | 12/02/2015 14:57
Agentes penitenciários prestaram homenagens ao colega morto friamente na manhã de ontem. (Foto: Marcelo Calazans)
Agentes penitenciários prestaram homenagens ao colega morto friamente na manhã de ontem. (Foto: Marcelo Calazans)
Cortejo acompanhou translado do corpo até o local de sepultamento. (Foto: Marcelo Calazans)
Cortejo acompanhou translado do corpo até o local de sepultamento. (Foto: Marcelo Calazans)

Cerca de duas semanas antes de ser executado no Estabelecimento Penal de Regime Aberto e Casa do Albergado, na Vila Sobrinho, em Campo Grande, o agente penitenciário Carlos Augusto Queiróz de Mendonça, 44 anos, havia pedido transferência para outra unidade coordenada pela Agepen (Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário). Pai de três filhos e funcionário do Estado há 11 anos, ele realizou o sonho de ter uma filha mulher há um ano.

Fábio Rosa Pires Araújo, 45 anos, disse durante velório na manhã desta quinta-feira (12) que o colega de trabalho demonstrava preocupação com a própria segurança.

Mendonça foi friamente executado na manhã de ontem (11), por volta das 6h, por um homem encapuzado que chegou ao presídio sozinho e atirou cinco vezes. O agente foi atingido por dois tiros no abdômen, tentou correr, mas caiu e levou mais dois nas costas. O quinto disparo acertou o computador da recepção onde ele fazia o controle dos detentos que saíam para o serviço.

De acordo com Fábio, que também é assistente jurídico do Sinsap (Sindicato Estadual dos Servidores da Administração Penitenciária), há aproximadamente duas semanas Mendonça tentou transferência para outra casa de detenção, pois temia que algo de mal pudesse lhe acontecer, tendo em vista a falta de proteção com que os agentes de custódia – aqueles que lidam diretamente com os presos - são obrigados a enfrentar durante o expediente.

Um dos fatores que o motivaram foi o caso do colega Hudson Moura da Silva, 34 anos, em 2011, baleado na entrada do mesmo local, morrendo depois de 19 dias internado. Mendonça presenciou a ação. “Fizemos vários plantões juntos. Ele ficava preocupado com sua segurança. Era uma boa pessoa, de família, e que levava o trabalho com seriedade, respeitando todos, principalmente os encarcerados. Mas tinha medo porque lidava com gente perigosa constantemente”, explicou Fábio, lembrando que não há registro recente de ameaças contra o colega. “Nunca soubemos de nada neste sentido”, completou o assistente jurídico do Sinsap.

A polícia investiga o crime e trabalha com várias hipóteses, entre elas, a de que o agente tenha sido morto por algum ex-detento ou foragido que discordava da maneira correta com a qual ele trabalhava, sempre respeitando as leis e as ordens da casa. Outro agravante pode ter sido o fato de que testemunhou perante a Justiça sobre o crime que vitimou Hudson.

“Independente do que tenha acontecido, o fato é que trabalhamos desguarnecidos, sem coletes, sem armas e em um número relativamente pequeno. Só na Penitenciária de Segurança Máxima são dez agentes para 2.200 detentos”, disse o sindicalista.

Velório foi marcado por revolta, indignação e muita comoção. (Foto: Marcelo Calazans)
Velório foi marcado por revolta, indignação e muita comoção. (Foto: Marcelo Calazans)
Mendonça era casado e pai de três filhos. (Foto: Divulgação/Agepen)
Mendonça era casado e pai de três filhos. (Foto: Divulgação/Agepen)

Família – Mendonça, natural da Capital, era profissional respeitado por colegas e, inclusive, por reeducandos da Casa do Albergado. Era funcionário público há 11 anos e desde 2011 desempenhava a função de agente no estabelecimento onde foi morto.

Deixou a esposa e três filhos, sendo dois garotos, um de 14 e outro de sete anos, e uma menina de pouco mais de um ano – ela seria a realização do sonho do casal em ter mais uma mulher na casa. “Ele sempre falava da bebê. Era um bom pai e uma pessoa de bastante dignidade”, reforçou Paulo César Vilela Mendonça, 43 anos, irmão. O enterro aconteceu por volta das 10h30 no Cemitério Memorial Park.

Luto – O diretor-presidente da Agepen, tenente-coronel Pedro César Figueiredo de Lima, lamentou a morte do servidor e fez questão de ressaltar que a agência presta todo suporte à família. “O sistema carcerário sul-mato-grossense está de luto”.

O militar disse estar atento quanto às demandas do setor (falta de proteção e escassez do efetivo). “Apresentamos nossas necessidades ao Governo e aguardamos posicionamento para melhorarmos as condições de trabalho”. As imagens das câmeras de segurança foram enviadas à polícia e podem auxiliar na identificação do assassino. “Foi um fato isolado”, considerou Figueira, minimizando uma possível afronta à segurança pública.

Ontem, ainda no local da tragédia, o presidente do Sinsap, Andé Luiz Garcia Santiago revelou que a administração penitenciária enfrenta sérios problemas, principalmente com a falta de servidores. Apenas 1.440 fazem vigiam 13.470 preso no Estado, sendo a segunda maior massa carcerária do país.

Conforme a OIT (Organização Internacional do Trabalho), órgão ligado a ONU (Organização das Nações Unidas), e o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, o quadro deveria ser de um agente para cada cinco detentos. Em Mato Grosso do Sul, deveriam ter 2.694 servidores, sendo necessário a contratação de mais 1.726. “Beiramos o colapso”, disse Santiago, na ocasião.

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