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Capital

Delegado coagiu motorista e até ditou depoimento após morte em ambulância

Testemunha foi obrigada a fazer falsa denúncia de sequestro contra a polícia brasileira para “tumultuar” as investigações

Geisy Garnes | 29/05/2019 16:47
Por WhatsApp o delegado descreveu exatamente o que a testemunha deveria falar
Por WhatsApp o delegado descreveu exatamente o que a testemunha deveria falar

Com ajuda da mulher e de um coronel da polícia boliviana, o delegado Fernando Araújo, preso por esfaquear e matar a tiros Alfredo Rangel Weber, 48 anos, dentro de uma ambulância, coagiu e obrigou uma das principais testemunhas do crime a mudar seu depoimento e ainda denunciar um falso sequestro contra a polícia brasileira.

Conversas encontradas no celular do delegado comprovaram que o ele obrigou o motorista da ambulância em que o crime aconteceu, Silvio Monteiro, a mudar o depoimento dado à polícia e ainda fazer uma falsa denúncia de sequestro contra a polícia brasileira, apenas para “tumultuar” as investigações do assassinato de Alfredo, conhecido como “Ganso”.

O motorista, uma das principais testemunhas do crime, foi ouvido pelos policias da Corregedoria e da DEH (Delegacia Especializada de Repressão aos Crimes de Homicídio) em março e no mesmo dia voltou à delegacia pedindo para mudar o depoimento. Sem conseguir alterar o texto, foi à polícia boliviana dar a “nova versão” em uma tentativa de desqualificar o que havia dito no Brasil.

Para isso ganhou a companhia de Silva Aguilera, a esposa de Fernando. Pelo WhatsApp, o delegado passou as instruções para a mulher sobre o que o motorista deveria falar à polícia: que viu uma caminhonete grande, com várias pessoas dentro, mas apenas um desceu – um homem de estatura mediana e cabelos castanhos – e que não viu o modelo do veículo porque estava nervoso.

Fernando ainda escreveu cada palavra sobre a falsa denúncia de sequestro sofrida pela testemunha. No texto ele manda o motorista falar que foi “trazido para o Brasil contra sua vontade”, que os policiais fizeram “diversas perguntas, em muitas delas sugerindo as respostas” e eram ríspidos sempre que ele negava alguma informação, por isso assinou o depoimento e foi embora.

Em conversa com um advogado, o delegado avisa sobre a denúncia e no dia seguinte repercute as matérias divulgadas na imprensa sobre o caso, alegando que a intenção é fazer com que o Ministério das Relações Exteriores sobre explicação da polícia, tudo para “desviar o foco” da investigação.

Coronel Medina acabou preso dias depois por envolvimento com tráfico (Foto: Pagina Siete)
Coronel Medina acabou preso dias depois por envolvimento com tráfico (Foto: Pagina Siete)

Na Bolívia – O falso depoimento na Bolívia, segundo as investigações, era de total conhecimento do comandante departamental de Santa Cruz de La Sierra, responsável por toda a polícia da região, Gonçalo Felipe Medina Sanchez. Por mensagem Fernando pediu “autorização” ao coronel para que a mulher acompanhasse o depoimento do motorista.

Segundo as investigações, coronel Medina agiu de forma intensa para ajudar Fernando a esconder a autoria do assassinato. Foi ele o responsável por divulgar a imprensa boliviana sobre a denúncia do falso sequestro do motorista da ambulância, feita na defensoria pública de Puerto Suárez.

Ele ainda detalhou a Fernando os passos da polícia brasileira na Bolívia, mandando inclusive fotos das carteiras funcionais dos policiais da DEH e da Corregedoria que procuraram informações sobre o crime na divisão que investigava o esfaqueamento de “Ganso”, a Furza Especial de Lucha Contra el Crimen.

Dias depois da prisão de Fernando, o coronel também acabou preso por envolvimento com o narcotraficante Pedro Montenegro Paz, procurado pela Interpol e com ordem de extradição para o Brasil desde 2015. Além de acobertar o foragido no país, o comandante departamental teria levado cerca de 40 quilos de cocaína para o Panamá a pedido do traficante. De lá a droga seria enviado aos Estados Unidos.

Delegado foi preso durante operação do Garras (Foto: Anderson Gallo/Diário Corumbaense)
Delegado foi preso durante operação do Garras (Foto: Anderson Gallo/Diário Corumbaense)

O crime – Segundo as investigações, o delegado esfaqueou e matou a tiros Alfredo Rangel no dia 23 de fevereiro. A desavença entre os dois começou durante as eleições para presidente da associação de agropecuaristas na Bolívia. O sogro de Fernando, Asis Aguilera Petzold (o atual prefeito da cidade de El Carmen), concorria ao cargo.

Durante uma briga, o delegado teria dado três facadas no boliviano. Alfredo foi socorrido e seria transferido para hospital de Corumbá, mas já em território sul-mato-grossense, a ambulância foi fechada por uma caminhonete preta.

O motorista desse veículo desceu, abriu a porta da viatura de resgate e atirou quatro vezes. Três tiros atingiram a cabeça da vítima, um deles o tórax. Sem ter o que fazer, o motorista voltou com o corpo para o país vizinho.

Operação – A prisão de Fernando Araújo, de 34 anos, aconteceu em operação no dia 29 de março. Durante cumprimento de mandado de apreensão, o delegado chegou a quebrar o celular na frente dos policiais, em uma tentativa de apagar prova.

Naquele dia, Silvia também foi presa após tentar fugir e agredir o delegado titular do Garras (Delegacia Especializada de Repressão a Roubos a Banco, Assaltos e Sequestros). O investigador da Polícia Civil, Emmanuel Nicolas Contis Leite, também foi alvo da operação. Ele está preso preventivamente por ajudar diretamente o delegado.

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