Fonoaudiólogo infringiu código de ética ao proibir acesso de pais às sessões
Pais tem o direito de acompanhar os filhos nas sessões; clínica e profissional serão investigados por conselho
Desde que a investigação de abuso sexual cometido pelo fonoaudiólogo Wilson Nonato Rabelo Sobrinho contra meninos de 5 a 8 anos foi divulgada, muitos pais ficaram apreensivos. O profissional dizia ser regra que eles não estivessem presente às sessões, informação que fere o Código de Ética da categoria.
Sobrinho foi preso no dia 9 de março, na clínica Fonoclin, depois que a mãe de um dos pacientes dele o denunciou pelos abusos sexuais. A mulher foi informada pelo outro filho, de 10 anos, o que acontecia com o caçula. Ela foi até o estabelecimento, aguardando na sala de espera, até que o garoto de 8 anos saiu correndo da sessão, dizendo que o profissional havia passado a mão nele. Depois desse flagrante, a PM (Polícia Militar) foi acionada.
A presença dos pais nas sessões era vetada pelo profissional, segundo apurou a reportagem do Campo Grande News com outras mães que confiaram no fonoaudiólogo.
"Nas primeiras sessões, nós pudemos entrar para acompanhar, mas por volta da terceira sessão, o próprio fonoaudiólogo falou que só a criança deveria entrar, porque era uma regra da clínica. E realmente era, porque nenhum pai ou mãe entrava junto.”
O relato foi feito por mãe de menino de 8 anos que era paciente de Wilson Sobrinho há cerca de 5 meses. Depois que soube da denúncia, pela clínica, ficou apreensiva. Orientada por psicóloga, conversou com o filho e não há indícios de que ele tenha sido vítima do profissional.
O choque e a incredulidade, porém, permanecem. "Não tinha câmera de segurança em nenhuma sala. Confiei na clínica, confiei no profissional. Nunca mais deixo meu filho entrar sozinho em um atendimento", disse.
Nas redes sociais, muitas pessoas questionaram o fato da criança entrar sozinha na consulta. Como ninguém ficava na sala durante as sessões, exceto paciente e o fonoaudiólogo, o procedimento parecia natural, segundo relato de outra mãe. O filho dela está entre os que estão entre as vítimas do profissional.
Os profissionais e as clínicas de fonoaudiologia de Mato Grosso do Sul são fiscalizados pelo CRFa 5ª Região (Conselho Regional de Fonoaudiologia), com sede em Goiânia e abrange os estados de MS, MT, TO, GO e o DF.
O assessor jurídico do conselho, Ronaldo Abi-Faiçal Castanheira, disse que a orientação dada por Wilson Rabelo Sobrinho fere o inciso 10 do artigo 10 do Código de Ética da categoria: "permitir o acesso do responsável ou representante(s) legal(is) durante procedimento fonoaudiológico, salvo quando sua presença comprometer a realização deste".
“É dever do fono permitir o acesso”, disse Castanheira, explicando que é facultativo aos pais essa decisão. O assessor jurídico disse que o conselho irá divulgar nota de repúdio e instaurar processo ético contra Wilson Rabelo Sobrinho. A lei prevê de advertência até cancelamento do registro em casos de infrações graves.
Castanheira disse que será aberto PAF (Processo Administrativo Fiscal) contra a clínica, para averiguar se a proibição de acompanhamento dos pais na consulta era regra ou de conhecimento da clínica ou, mesmo sendo decisão isolada de Sobrinho, era consentida.
A Fonoclin enviou nota informando que Rabelo era prestador de serviço autônomo, não sendo funcionário e apenas utilizava sala no local. “Sendo o assunto muito delicado estamos primeiramente tratando de forma individual com familiares e pacientes, com todos presencial e/ou ligações”, relatou em nota.
A empresa informa que já foi chamada para esclarecimentos na Depca (Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente) e está “inteiramente à disposição da Justiça”. Por se tratar de caso envolvendo menores, não poderia falar muito sobre o assunto, finaliza, em nota.
Procedimentos – Acompanhar crianças em consultas médicas é direito e até necessário, principalmente no atendimento pediátrico, segundo o presidente do Sinmed-MS (Sindicato dos Médicos de Mato Grosso do Sul), Marcelo Santana.
“É preciso acompanhamento na avaliação, nas consultas, no exame físico”, disse. No caso de procedimentos mais graves, de urgência, os médicos fazem atendimento acompanhado de profissional de enfermagem. “Sempre se tem mecanismo de ter alguém acompanhando a consulta”, explicou.
Segundo Santana, em outras especialidades, o acompanhamento presencial ou por meio de tecnologias seria o mais racional, para dar segurança aos pais, crianças e até ao profissional. “É extremamente importante, o profissional tem que se preocupar de mostrar toda essa seriedade para mostrar isso para o paciente e familiares.”