Jogo do bicho reinava com “Periquito da Sorte” e “Gato Preto” na Capital de 1981
Braço da Ditadura, o Serviço Nacional de Informações mostrou a jogatina correndo solta
Na Campo Grande de 1981, o jogo do bicho ganhava forças pelas ruas da cidade e era dominado por dois animais: tratava-se dos tempos do “Periquito da Sorte” e do “Gato Preto”. Segundo relatório do SNI (Serviço Nacional de Informações), rede que coletava informações na Ditadura, os grupos eram as potências da atividade ilegal na capital de Mato Grosso do Sul.
“As bancas de Jogos do Bicho existentes nesta Capital são a "Gato Preto” e o “Periquito da Sorte”. Ambas têm seus cambistas distribuídos por toda a cidade”, informa documento datado de 24 de fevereiro de 1981.
A “Gato Preto” tinha operações de “arrecadação, controle e descarga” centralizadas na Rua Camões. Já o “Periquito da Sorte” contava com base na Rua 25 de Dezembro. Detalhe: era próximo a quartel da Polícia Militar.
Uma mesma pessoa “rodava o jogo” para as duas bancas. “O sistema de segurança na banca do ‘Gato Preto’ é feito pelos ‘olheiros’ e na hora de “rodar o jogo as portas são fechadas”.
“No ano de 1980 observou-se uma expressiva evolução no funcionamento de cassinos e de bancas do chamado ‘Jogo do Bicho’, em Campo Grande/MS. Esses locais, principalmente aqueles em que são efetuadas as apostas do Jogo do Bicho são de conhecimento popular, sendo comum observar-se pessoas realizando e conferindo os cartões de apostas, de forma ostensiva”, destaca o relatório.
Passados 40 anos, a força dessa modalidade na Capital não mudou. Como mostrado na Successione, a mais recente operação do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado), a rota da coleta do jogo do bicho, em que apenas um motociclista detalhou passar por 30 pontos para o “recolhe” das apostas na região do bairro Nova Lima, saída para Cuiabá, mostra que o jogo segue vivo em qualquer esquina da cidade.
Novos ares – O jogo do bicho persiste e se moderniza mesmo com as diversas tentativas de sufocar essa modalidade, apontada como fonte de financiamento para crimes. Em setembro de 2020, a 4ª fase da Operação Omertà, batizada de “Black Cat”, lacrou as bancas de apostas alaranjadas, já rotineiras no cenário urbano de Campo Grande.
Além de dar fim aos balcões físicos de apostas, o objetivo era provar conexão, notadamente patrimonial, entre a exploração do jogo de azar e a milícia armada alvo das primeiras fases da Omertà. A operação foi contra Jamil Name (já falecido) e Jamil Name Filho.
Saíram as barraquinhas, mas apostas não pararam. Tanto que em dezembro daquele ano, a “Arca de Noé”, também da operação Omertà, revelou que o jogo do bicho movimentava R$ 18,2 milhões por ano em Campo Grande e nas cidades vizinhas, com lucro diário de R$ 50 mil. Tamanha estrutura exigiria até a renovação da frota das 47 motocicletas do recolhe, setor que busca o dinheiro das apostas.
No ano seguinte, em 2021, o jogo já estava com nome diferente: MTS. Camuflado em bancas de revista, o esquema passou a ser comandado por grupo do Rio de Janeiro. O formato também foi modernizado, com adaptação para apostas em máquinas similares as de cartões de crédito.
Operação liderada pela PF (Polícia Federal) do Ceará, mas com prisão em Campo Grande, mostra que o mercado local da jogatina entrou no radar da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital), já atuante no tráfico de drogas. O ramo é procurado para a lavagem de dinheiro.
Liberado? - O jogo do bicho surgiu no Brasil há mais de 120 anos, com a criação de banco de apostas, para evitar que o zoológico do Rio de Janeiro fechasse. Mas em 1941, passou a ser proibido pela lei como jogo de azar e é considerado contravenção.
Agora, tem uma nova chance para voltar à legalidade. A CCJ (Comissão de Justiça e Cidadania) do Senado aprovou na quarta-feira (dia 19), por 14 votos a 12, o projeto de lei que autoriza o funcionamento de cassinos e bingos no Brasil, legaliza o jogo do bicho e permite apostas em corridas de cavalos. O texto segue agora para votação no Plenário do Senado
Pela proposta, em cada Estado e no Distrito Federal, poderá ser credenciada para explorar o jogo do bicho uma pessoa jurídica a cada 700 mil habitantes. A considerar a população de Mato Grosso do Sul, o Estado comportará até quatro empresas.
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