Habeas corpus mantêm livres condenados por crimes que chocaram sociedade
Eles não podem ter a prisão decretada
Fagner Gonçalves arrastou e matou Leonardo da Silva Sales em 2008. Geraldo Francisco Lessa assassinou a tiros Anderson da Silva Faria, um ano antes, quando também foi morto Aldevino Alves Zimermann, a travesti Andrea, assassinada por Marcelo Ricardo de Lima. Fernando Pereira Verone e Leonardo Leite Cardoso fecham a lista de assassinatos de repercussão nos últimos 3 anos. Eles mataram Claudinéia Rodrigues em 2009, garota de programa executada a pedradas.
Em comum, o grupo tem mais do que assassinatos que chocaram a sociedade pela motivação fútil. Todos foram condenados pelo júri popular, mas saíram do tribunal livres e continuam em liberdade porque estão amparados por habeas corpus concedidos pelo TJ/MS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul).
“Isso gera na sociedade a sensação de uma justiça não eficaz”, diz o promotor de Justiça Renzo Siufi. “Discordo de que o réu condenado pelo júri fique livre, uma vez que a sociedade, representada pelo Conselho de Sentença, foi quem condenou”, declara o representante do MPE (Ministério Público Estadual).
Para o advogado Leonardo Duarte, presidente da OAB/MS (Ordem dos Advogados do Brasil subseção de Mato Grosso do Sul), “pode haver má impressão por causa da legislação. É um instrumento que a legislação prevê”.
O promotor Renzo Siufi atua no Tribunal do Júri, cuja obrigação é julgar o pior e maior dos crimes: O homicídio. E por isso a condenação ou absolvição depende da avaliação das sete pessoas que representam a vontade da sociedade.
Este grupo, cujos integrantes são trocados mensalmente, formam o Conselho de Sentença.Cada um tem poder de voto. Se a maioria for pela absolvição do réu é tirada a acusação. Caso contrário, é condenado.
E foi o que aconteceu nos casos já citados. Os réus foram condenados pelo júri popular, mas não tiveram a prisão decretada porque estão amparados por habeas corpus, conhecido no meio jurídico como ‘remédio heróico’.
Ou seja, eles já estiveram presos, mas, conseguiram na Justiça o direito de responder ao processo em liberdade e assim permanecem até esgotar todos os recursos contra a condenação.
“A menos que haja fato novo, não posso decretar a prisão. São condenados à penas altíssimas e continuam em liberdade”, explica o juiz Aluízio Pereira dos Santos, da 2ª Vara do Tribunal do Júri, justificando o fato de autores de crimes ‘bárbaros’ estarem soltos.
Dois dos mais recentes exemplos da sensação de impunidade envolvem Leonardo Leite Cardoso e Fernando Pereira Verone. O primeiro foi condenado a 20 anos e seis meses de prisão em regime fechado e o segundo a 13 anos e seis meses.
Na sentença, lida em plenário, o juiz Aluízio Pereira dos Santos diz que deixa de decretar a prisão por estarem amparados por habeas corpus e ressalta sobre o tempo que leva até se esgotarem os recursos que começam no TJ, passam pelo Superior Tribunal de Justiça e terminam no Supremo Tribunal Federal.
“O réu foge” neste tempo, em que não sofre restrição de liberdade por não cumprir pena. Foi o que aconteceu com Marcelo Ricardo de Lima e Fagner Gonçalves, este último acabou preso por outro motivo.
O presidente da OAB/MS avalia que “a eventual sensação de injustiça é por conta da legislação, que tem que ser revista com urgência”.
Os próximos? Na lista dos acusados de crimes que chocaram a sociedade, estão soltos e ainda não foram a julgamento o universitário Anastácio da Silva Yarzon Ortiz, o policial civil Cleidival Vasquez e, mais recentemente, o bacharel em Direito Cristhiano Luna de Almeida.
Todos tiveram habeas corpus concedido pelo TJ/MS. Caso sejam levados a júri popular e condenados ficam fora da cadeia. Só voltam à prisão se não houver recurso e a condenação seja mantida em segundo grau.
O promotor de Justiça Renzo Siufi lembra que o TJ não pode mudar a decisão do Conselho de Sentença, mas pode anular o julgamento e mandar realizar outro. “O Tribunal de Justiça só vai poder mandar a novo júri. Manda anular e realizar outro se a decisão dos jurados é contrária às provas que estão nos autos”.
Leonardo Duarte explica que o habeas corpus pode ser solicitado da fase de inquérito até quando a pessoa já cumpre condenação e está “amparado pelo direito de ir e vir do cidadão”.
Entre os requisitos para deferimento do pedido estão a residência e emprego fixos e a ausência de antecedentes crimimais.