Vermífugo tido como esperança contra covid some das farmácias de Campo Grande
Ivermectina, usada contra vermes, parasitas e piolhos ganha adeptos entre médicos, mas não tem aval de Sociedade de Infectologia
Depois da hidroxicloroquina e cloroquina provocarem corrida às farmácias, agora é a vez da ivermectina, medicamento usado contra vermes e parasitas, ser a nova esperança contra o novo coronavírus (covid-19). Em Campo Grande, a procura nas farmácias dobrou, zerando estoques e formando até lista de espera. O vermífugo também ganhou adeptos na classe médica.
No entanto, médicos das sociedades de pneumologia e infectologia alertam que não há evidência científica do uso do vermífugo como tratamento precoce ou na evolução clínica de pacientes infectados pela covid-19.
A ivermectina é vermífugo descoberto em 1975, usado há anos também para problemas relacionados a ácaros, como sarna e piolhos. Na bula, consta que é contraindicado para pacientes com meningite ou outras doenças do sistema nervoso central. Também não é indicado para crianças com menos 15 quilos ou menores de 5 anos.
Um dos defensores do uso do vermífugo, tanto na prevenção quanto no tratamento, é o médico nutrólogo e toxicologista, Sandro Benites, que está prescrevendo o vermífugo há cerca de três meses. Segundo ele, grupo no WhatsApp de outros profissionais de Campo Grande já tem cerca de 200 médicos, que compartilham da ideia.
Benites iniciou o tratamento após conhecer resultado de testes em grupo de cerca de 600 médicos de associação em Belém do Pará (PA) e em Porto Feliz (SP) em que o vermífugo foi usado como preventivo e, nos casos de sintomas, associado à hidroxicloroquina ou claritromicina, sendo dosado por prescrição.
O resultado dos casos foram divulgados em live em que o médico participou. Em Porto Feliz, o kit foi dado a 4,5 mil contactantes, ou seja, pessoas que apenas tiveram contato com pacientes de covid e, segundo prefeito Antônio Prado, também médico, nenhum deles desenvolveu a doença. Nos casos de contaminados com sintomas leves, o vermífugo era associado a outro medicamento e esses pacientes não evoluíram para quadro grave da doença.
“Acredito nessas duas medicações; vamos supor que eu esteja errado, mas, vamos supor que eu esteja certo e não faça nada, vou ser omisso”, defende Benites, alegado também que é remédio barato, com poucos efeitos colaterais e sem histórico de intoxicação pelo uso.
Até agora, as autoridades sanitárias não chegaram a consenso sobre medicamento e ainda há estudos em todo mundo em busca da cura ou prevenção da covid. O consenso, por enquanto, é o uso de máscaras e distanciamento social.
A infectologista Priscilla Alexandrino, coordenadora técnica do Departamento de Infectologia da Santa Casa, disse que é preciso ter cautela, pois não há evidência científica que embase a prescrição do vermífugo.
“Ainda é precoce, não tem indicação das sociedades científicas para uso; pode ser possível? Sim, mas os estudos ainda estão acontecendo, não se pode recorrer ao medo, ao desespero”, avaliou.
Em publicação no dia 20 de maio, a Sociedade Brasileira de Infectologia também fez alerta sobre os cuidados com medicamentos como a ivermectina ou cloroquina que vinham ganhando evidência como possível tratamento da covid-19. Informou que há mais de 1,6 mil estudos estão sendo realizados sobre vários remédios e a cautela é necessária pela dinâmica da doença, em que novas informações são conhecidas a cada dia.
Ontem (29), foi a vez da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia se pronunciar. “Não existem evidências científicas de que quaisquer das medicações disponíveis no Brasil, tais como ivermectina, cloroquina ou hidroxicloroquina, isoladas ou associadamente, colaborem para melhor evolução clínica dos casos”. Também alerta que não há comprovação científica de que o vermífugo evite “a instalação da doença em indivíduos não infectados”.
Benites avalia que também não há como esperar a publicação dessa evidência científica, pois pode demorar anos. “Não vai ter protocolo agora, nós estamos fazendo protocolo, é uma doença nova; esperar publicação seria em momento de paz, agora é momento de guerra e pandemia”, diz. O médico alerta, porém, que a utilização precisa ser prescrita por médico e rechaça a automedicação.
Corrida – nas farmácias em Campo Grande, a procura pelo vermífugo dobrou nos últimos dias. Em pesquisa feita pela reportagem, vários estabelecimentos zeraram o estoque e agurdam nova remessa para atender quem entrou na fila de espera.
Na Pag Menos, da Rua Ceará, as vendas aumentaram em 100% e fizeram sumir a caixa, com custo de R$ 12 a R$ 18. Na São Bento, está em falta em todas as unidades e a caixa com 4 comprimidos só deve chegar a partir do dia 10 de julho. Na São Leopoldo, o medicamento é vendido a R$ 27,10, já acabou e chegará o fim da tarde de hoje ou até sexta-feira.
Na Farmácia Real Mais, o remédio está em falta. Segundo informações obtidas pela reportagem, muita gente comprou por conta das notícias relacionadas à covid-19 e ainda busca reposição. Na DrogaCare, a procura está em alta. "Todo mundo ligando aqui sobre o remédio”, disse a funcionária. No local, a cartela com 8 cápsulas é vendia a R$ 48.