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Capital

Vivendo nas ruas, mulheres relatam tentativa de fugir de histórias de violência

Três mulheres em situação de rua falam de sofrimento e como ainda há espaço para a esperança

Silvia Frias e Izabela Cavalcanti | 08/03/2023 14:53
Luzia fugiu das agressões do marido só com a roupa do corpo. "Saudade das crianças". (Foto: Izabela Carvalho)
Luzia fugiu das agressões do marido só com a roupa do corpo. "Saudade das crianças". (Foto: Izabela Carvalho)

“É muito difícil ficar na rua; tem que dormir ao relento, na calçada, ficar sem comer. Eu estou sem roupa, saí sem nada”, contou Luzia de Souza, 42 anos. O relato dela é semelhante ao de outras mulheres que acabaram por enfrentar o frio, a chuva e o desconforto para fugir da violência doméstica ou de sofrimento emocional, mas encontraram descaso e problemas muito semelhantes aos que tentaram deixar para trás.

A história de Luzia começou em Ribas do Rio Pardo e acabou nas ruas de Campo Grande. À reportagem, contou que está na Capital há cerca de 15 ou 20 anos, depois de fugir das agressões do marido, recorrentes durante a relação. “Da última vez ele quis me dar um chute, eu saí correndo, sozinha, não levei nada”. Conta que, desnorteada, pensou em sair a pé, mas conseguiu carona até a região central.

Iracema diz que foi para a rua para fugir do namorado. "Ele é um monstro". (Foto: Izabela Cavalcanti)
Iracema diz que foi para a rua para fugir do namorado. "Ele é um monstro". (Foto: Izabela Cavalcanti)

Diz que deixou para trás a casa e os quatro filhos de 20, 18, 15 e 13 anos. Nos dias que passou a viver na rua, aprendeu a pedir comida nos restaurantes e dinheiro para quem passa. Luzia conta que tem histórico de depressão e, sem os remédios, “fica nervosa do nada”. Desde segunda, está abrigada no Cetremi (Centro de Triagem e Encaminhamento do Migrante) e espera conseguir ajuda para voltar para casa. “Estou morrendo de saudade das crianças”.

A violência também foi o que levou Iracema Alves Leite, 54 anos, a dormir na rua. Diz que está há pouco tempo na situação de vulnerabilidade, cerca de três dias, para fugir do namorado violento e abusivo. Ela o identifica como Neto e que havia saído da cadeia havia um ano. Agitada e inquieta, contou um pouco da sua história.

Iracema conta que morava em uma quitinete na Vila Carvalho, recebia o BCP/Loas, benefício assistencialista de R$ 1.302,00 e cesta básica de programa social. A vida humilde, porém, estável, acabou quando conheceu um homem. “Ele me viu passando na rua, pediu para ir para minha casa, porque foi expulso da dele”, contou. Inicialmente, se negou, mas ele ofereceu R$ 50 e os dois começaram relacionamento.

Iracema diz que o homem é usuário de drogas, bebe e é violento. “Ele começou a vender as minhas coisas, me estuprou, batia em mim e roubava meu dinheiro”, diz. Também diz que era forçada a usar drogas. “Ele é um monstro”. Depois de mais um episódio de agressão, diz que denunciou o caso à Polícia Civil e foi parar na rua, fugindo dele.

Valdineia comemorou o trabalho de diarista. "Mudança de vida". (Foto: Izabela Cavalcanti)
Valdineia comemorou o trabalho de diarista. "Mudança de vida". (Foto: Izabela Cavalcanti)

“Me sinto um nada, saí do aluguel porque não vou conseguir pagar mais, ele me roubou; meus vestidinhos, meus casaquinhos, minhas roupas, tudo, não tenho mais nada, eu sinto falta desse cuidado”, lamenta.

Sem entrar em detalhes, Valdinéia Lourenço, 36 anos, conta que a rua foi o caminho que lhe restou depois de “várias decepções em casa”. Falou sobre a morte dos dois irmãos, do pai, do marido e, depois, da demissão. Calcula que mora na rua há cerca de um ano, mas que teve momento de alegria ao conseguir emprego como diarista em um hotel da cidade.

Recebeu R$ 130 para limpar os quartos e, caso quisesse dormir no quarto, descontaria R$ 70. “Prefiro dormir no quarto do que no chão”, relatou. Valdinéia lembra da noite em que dormiu na Rodoviária e acordou sem nada. “Só estou com essa roupa aqui no corpo”, mostrando o short, a blusa e o chinelo.

Valdinéia diz que “se envolveu” com drogas desde que foi para a rua. Apesar do histórico de sofrimento, mantém expectativa de dias melhores. “Hoje é Dia da Mulher, né? Eu espero é mudança de vida”.

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