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Interior

Trabalhadores vindos de outras regiões denunciam falsa promessa de emprego em MS

Ministério Público do Trabalho apura a denúncia e fará uma audiência na tarde desta sexta-feira

Natália Olliver | 12/05/2023 13:10
Soldadores se reuniram com sindicato da categoria para denunciar falsas promessas (Foto: SINTICOP/MS)
Soldadores se reuniram com sindicato da categoria para denunciar falsas promessas (Foto: SINTICOP/MS)

Soldadores denunciaram ao Ministério Público do Trabalho a empresa Enesa Engenharia, por falsas promessas de trabalho e irregularidades no processo de contratação dos profissionais. Os homens saíram das regiões Norte e Nordeste do País para trabalhar na construção de fábrica de celulose da Suzano, em Ribas do Rio Pardo, distante 98 quilômetros de Campo Grande. A audiência de conciliação foi marcada para esta sexta-feira (12), às 15h.

Eles afirmaram que a companhia recruta os trabalhadores de maneira on-line, paga o deslocamento até Mato Grosso do Sul e ao serem reprovados no teste, são obrigados a voltar de ônibus e despejados do alojamento temporário. A situação revolta os soldadores. Eles se dizem abandonados, sem respaldo financeiro algum e vivem apenas com a alimentação oferecida no hotel, às margens da BR-163, na Capital.

Ao todo, 150 trabalhadores teriam ficado, de maneira rotativa, quase 20 dias no local aguardando pela resposta dos testes ou esperando pela passagem para retornar às cidades de origem. O Sinticop-MS (O Sindicato dos Trabalhadores na Construção Pesada de Mato Grosso do Sul) foi até o hotel nesta quinta-feira (11) e exige que a Enesa arque com a passagem aérea dos trabalhadores e pague os dias em que eles estiveram impossibilitados de trabalhar.

Soldador mostra alimento oferecido de café da manhã no hotel às margens da BR-163 (Foto: Natália Olliver)
Soldador mostra alimento oferecido de café da manhã no hotel às margens da BR-163 (Foto: Natália Olliver)

Joabi Rodrigues, de 40 anos, saiu de Pernambuco para trabalhar em Mato Grosso do Sul. Ele detalhou ao Campo Grande News a situação em que os soldadores estariam sendo submetidos e alegou irregularidades no processo de contratação, o qual 100 trabalhadores realizaram o teste.

Um profissional não vai sair de casa, deixar a família se não estiver qualificado para fazer o teste. Chegaram muitas pessoas, mas ninguém passou no teste. São profissionais experientes, temos anos de carreira. O que não entendo é que a empresa gasta passagem aérea para que pudéssemos vir, fala que passamos no teste de manhã e nos reprova à tarde, nos dá R$ 800,00 pra voltar pra casa, tem gente que são cinco dias de ônibus, o dinheiro muitas vezes nem cobre a passagem”, disse o soldador.

Joabi comenta que os funcionários da empresa que aplicam o teste não são qualificados para exercer a função. De acordo com o profissional, um teste de soldagem é realizado em duas etapas: a primeira classificada como visual, em que é analisada toda estrutura; e a segunda chamada de raio-x, em que analisam aspectos mais profundos do trabalho. “Às vezes, estamos na cabine testando e já sai que perdemos, sendo que o resultado só sai depois do raio-x. Não tem coerência. Somos trabalhadores sérios, pais de família, não viemos passear, temos que voltar com o pão para sustentar nossa casa. Como vamos voltar sem nada?", questionou.

Elderson Welder estava há 15 dias sem ajuda financeira e contando apenas com alimentação oferecida no hotel (Foto: Natália Olliver)
Elderson Welder estava há 15 dias sem ajuda financeira e contando apenas com alimentação oferecida no hotel (Foto: Natália Olliver)

Outros relatos - Elderson Welder Ferreira, de 38 anos, saiu do Espírito Santo para tentar uma vaga na empresa. Ele revelou que após reprovar no teste inicial, a Enesa oferece um cargo inferior, normalmente disponível para quem está começando na profissão.

“Ela reprova e na mesma hora oferece um salário mais baixo do que viemos ter, pela metade do valor. Se o salário é R$ 3 mil eles nos dão R$ 1.500 pra exercer uma função inferior, de quem tá começando agora. A gente não serve como profissionais, mas servimos para terminar a obra deles com mão de obra barata. Estamos voltando à escravidão?”, questionou.

Hotel - Além das denúncias citadas, os trabalhadores alegam que o hotel onde estão hospedados não oferece cobertores e a alimentação é precária. Eles dizem que recebem marmitas individuais duas vezes ao dia e o café da manhã.

“O café da manhã às vezes tem pão com mortadela ou manteiga. O almoço que sobra é o mesmo da janta. Isso é degradante, só o fato de poder se servir nos sentiríamos bem, isso gera bem-estar. No hotel, não tem nenhum representante legal da empresa. A gente já começa a sentir medo e ficar preocupado já na recepção", disse Joabi.

Coação - Na quinta-feira (11), um representante da Enesa teria ido até o hotel para "averiguar a situação” e, segundo os trabalhadores, a fala dele foi em tom de ameaça: “Eu não entendo de solda, mas de fuzil, metralhadora e pistola sim”.

“A madrugada toda ninguém dormiu. Até que o sindicato foi lá e nos trouxe. A empresa precisa nos dar uma resposta, não é só uma passagem, quase 20 dias aqui não recebemos nada. Se a empresa fosse organizada faríamos o teste de tarde receberíamos a resposta, depois no outro dia iríamos embora. Teve família que com medo comprou a passagem pra galera voltar”, finalizou Joabi.

Sindicato - O representante do Sinticop-MS, Walter Vieira dos Santos, disse ao Campo Grande News que a empresa terceirizada faz parte do projeto de linha de frente da Empresa Suzano, tendo a maior quantidade de colaboradores. E que chamou atenção a maneira como o recrutamento é feito.

Walter Vieira dos Santos, presidente do SINTICOP-MS (Foto: Natália Olliver)
Walter Vieira dos Santos, presidente do SINTICOP-MS (Foto: Natália Olliver)

Conforme o presidente, o Estado passa por um período complexo de falta de mão de obra qualificada, o que faz as empresas buscarem funcionários em outras regiões do País.

"Quando chegam aqui, se deparam com uma situação totalmente diferente da oferecida, são os famosos 'gatos'. A empresa não faz a mesma logística de vinda, o valor não corresponde, não contempla alimentação no deslocamento até a cidade de origem. Colocam os trabalhadores isolados, sem acesso à cidade, na BR, sem dinheiro. Como eles vão alimentar a família e pagar as contas sem receber?", explica Walter.

O Ministério Público do Trabalho apura a denúncia.

Resposta - Em nota, a empresa Enesa Engenharia alegou que repudia veementemente qualquer atitude, forma ou situação que possa ir contra a legislação trabalhista vigente. Ressaltou que existe uma exigência de segurança que impacta diretamente na avaliação do trabalho apresentado e aprovação do mesmo.

"Para aprovação de um candidato se faz necessário o acompanhamento dos testes laboratoriais realizados em corpos de prova. Até o resultado destes testes, hospedamos os candidatos com todas as condições cabíveis de habitação, alimentação e recursos para atendimento de suas necessidades básicas. Caso o candidato reprove na realização dos testes, conduzimos os mesmos para retorno a sua cidade de origem e realizamos o pagamento de suas despesas de acordo com o ACT 2023/2024 vigente", disse.

A empresa também informou ao Campo Grande News que atende diretrizes éticas e transparentes, que visam agregar maiores oportunidades no mercado.

"Possuímos as principais certificações referenciadas do mercado e dentre as mesmas a de Responsabilidade Social e ESG - Meio Ambiente, Social e Governança garantidas e verificadas por organismos internacionais. Estamos atentos às expressões e atitudes que não sigam esta natureza e não toleraremos em nenhuma hipótese práticas contrárias ao que temos como princípios", finalizou.

*Matéria alterada às 16h02 para acréscimo de nota da empresa Enesa.

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