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Cidades

ONG 'sem-teto' deixa pedreiros sem receber e para obra em 'novas favelas'

Prefeitura não teria repassado dinheiro necessário para o acerto com quem reforçou mutirão

Anahi Zurutuza | 22/07/2016 07:11
No Jardim Canguru, escavações para os alicerces começaram a ser feitas, mas seguem a passos lentos (Foto: Simão Nogueira)
No Jardim Canguru, escavações para os alicerces começaram a ser feitas, mas seguem a passos lentos (Foto: Simão Nogueira)

Ao menos 40 homens empregados pela Morhar Organização Social na construção das casas do loteamento Vespasiano Martins – na região sul de Campo Grande – estão sem receber e decidiram “cruzar os braços”. As obras no Jardim Canguru, no Bom Retiro e no Pedro Teruel, para onde também foram removidos moradores da favela Cidade de Deus, em março deste ano, “travaram”.

A ONG (Organização Não-governamental), dona de contrato de R$ 3,6 milhões com a prefeitura de Campo Grande para coordenar o “mutirão assistido” de construção das moradias, não teria recebido o valor correspondente à segunda parcela deste total. Por isso, o pagamento dos trabalhadores não foi feito.

No Jardim Canguru – região sul da Capital –, as escavações para os alicerces das casas começaram, mas seguem a passos lentos, porque só cinco homens contratados pela ONG trabalham no local.

No Pedro Teruel – também na zona sul –, segundo moradores, algumas casas já foram erguidas, mas as obras pararam, porque falta material e também porque quem é voluntário não pode contar com a ajuda dos trabalhadores remunerados.

Vera Pereira, removida para o Bom Retiro, reclama que perdeu 15 dias de trabalho, mas não viu obra da casa dela começar (Foto: Simão Nogueira)
Vera Pereira, removida para o Bom Retiro, reclama que perdeu 15 dias de trabalho, mas não viu obra da casa dela começar (Foto: Simão Nogueira)

No Bom Retiro, loteamento localizado na região da Vila Nasser – no norte da cidade – nem a escavação dos alicerces continuou. “Eu fiquei 15 dias sem trabalhar porque disseram que não podia estar fora do barraco quando eles fossem cavar as valetas. Fizeram o gabarito [marcações necessárias para começar a erguer a paredes] em uma rua só e pararam. A minha casa não foi nem marcada ainda”, relata Vera Pereira, 47, que trabalha na varrição de ruas da Capital.

Sem pagamento – Um dos pedreiros, que pediu para ter o nome preservado, afirma que foi chamado pela Morhar para trabalhar no Pedro Teruel, mas desde terça-feira não vai até o loteamento. “Eu arrumei um bico e não vou trabalhar lá enquanto eu não receber”.

O trabalhador relata ainda que funcionários da ONG sempre que cobrados, adiam o pagamento para o dia seguinte.

Mike trabalhou por quase dois meses como servente, mas não recebeu (Foto: Simão Nogueira)
Mike trabalhou por quase dois meses como servente, mas não recebeu (Foto: Simão Nogueira)

Mike Danilo Silva, 27, mora com a mulher Rosangela, 31, e os filhos, de 5 meses, 7 e 13 anos, no Vespasiano Martins. Ao montador de móveis foi prometida remuneração para que ele trabalhasse na construção das casas, embora não tivesse experiência. “Fiquei como servente por quase dois meses e até agora não recebi”.

A garantia da Morhar, segundo Mike, era de pagar os trabalhadores em 1º de julho, dia da entrega da 42 moradias. Ele conta que até agora não conseguiu voltar a trabalhar como montador, porque ainda está consertando os problemas encontrados na construção e fazendo o acabamento da casa dele. “Minha bebê tem asma, a gente precisa sair do barraco”.

O morador do loteamento do Jardim Canguru, Danilo Emanuel, 25, atuou como pedreiro por 18 dias na construção das moradias do Vespasiano Martins. Ele tem R$ 1.080 para receber em diárias, porque a ONG teria prometido o pagamento de R$ 900 pela quinzena de trabalho dos pedreiros, mais as horas-extras e domingos. “Teve dia que eu trabalhei até 22h. Eles tinham prazo para entregar e eles me chamaram quanto estava para acabar”.

Israel da Silva, 25, conta ganhou o dinheiro pelos dias que trabalhou. “Me pagaram nesta semana, depois que eu ameacei chamar a imprensa para a frente da prefeitura. Eu e mais cinco recebemos, escondido do outros”, relatou.

O pedreiro conta ainda que não vai mais trabalhar para a Morhar, mesmo se for convocado. “Eles são enrolados para pagar, não quero não. Vou procurar outra coisa”.

Contrato – A casas deveriam ter sido erguidas em regime de “mutirão assistido”, mas como as obras não avançavam, a Morhar decidiu contratar os pedreiros que moravam nos loteamentos e homens desempregados ou dispostos a abandonar outros empregos para fazer o papel de serventes. Contudo, nenhum dos trabalhadores tem contrato.

“Foi só de boca mesmo”, afirmou Mike.

Só cinco homens trabalham nos lotes do Canguru (Foto: Simão Nogueira)
Só cinco homens trabalham nos lotes do Canguru (Foto: Simão Nogueira)

Para os trabalhadores que estão sem o pagamento, os encarregados das obras, contratados pela Morhar, afirmam que a organizaçao social não recebeu os repasses da prefeitura necessário para o acerto. Por isso, a própria entidade teria pedido para os que querem continuar prestando serviços esperarem a quitação do débito, para que não sejam acumulados mais dias de trabalho sem garantia de remuneração.

A ONG teria autorização da prefeitura para a convocação dos freelancers, sem contrato formal. A previsão é que as obras sejam entregues no dia 10 de setembro.

Outro lado – A reportagem contatou a assessoria de imprensa da prefeitura e foi informada que as situações serão verificadas. Uma resposta será dada ainda hoje (22).

O Campo Grande News também tentou contato com o presidente da ONG, Rodrigo da Silva Lopes, mas ele, novamente, não atendeu o celular.

Matéria alterada as 9h27 para correção de informação. 

 

 

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