As manifestações fizeram o Brasil tremer, mas ele continua dividido
O Brasil tremeu no domingo. O Brasil continua dividido.
O Brasil entrou, novamente, em catarse. Nem dois anos se passaram das mobilizações de junho de 2013 e novamente multidões foram às ruas. Três números de manifestantes surgem na imprensa: 500 mil, 1 milhão ou 2 milhões. Uma discussão que só serve para encher o ego daqueles que aparecem como organizadores do movimento e dos petistas e seus aliados. Em verdade o que interessa é a palavra e não os números: multidões foram às ruas para protestar contra tudo que for do governo ou próximo a ele. O Brasil tremeu no domingo.
Mas há algo que a grande imprensa não prestou atenção ou não desejou mostrar: o Brasil, de dimensões continentais, continua dividido. As multidões foram às ruas no Centro-Sul. O movimento no Norte-Nordeste foi pífio, com raras exceções. A cabeça da oposição estava em São Paulo no período eleitoral e lá continua. Cabeça não é igual ter líder. Não existe um líder paulista comandando as passeatas e panelaços. Pelo contrário, o PSDB se acovardou novamente, entrou nos restaurantes de luxo e em suas mansões em fechou-se em absoluto silêncio. Temeu o povo nas ruas. Por outro lado, o Norte-Nordeste que votou pesadamente em Dilma promoveu um barulho quase silencioso para apoiá-la na sexta-feira 13, mas também não foi às ruas para gritar contra ela no domingo 15. É uma região que não se sente forte para se manifestar.
Quem são os manifestantes e os interessados nas passeatas do domingo?
A imensa maioria das pessoas que estavam nas ruas eram apartidários. Aqueles que não têm experiência política e gritam contra o que entendem que não é possível continuar como está. Condensaram em duas bandeiras seus vastos pleitos: contra a corrupção e fora Dilma. Ao que tudo indica, assumiram o epíteto que os petistas lhe pregaram - são coxinhas assumidos. Não há líderes. Multidões foram às ruas e não criaram líderes. Não há quem leve uma pauta para ser discutida no Palácio do Planalto com a Dilma e seus assessores. O fosso entre os manifestantes e o governo federal continuará tal e qual estava em 2013 - imenso, com perspectivas de ampliação.
Com pouquíssimas exceções os partidários não foram às ruas. O PSDB ficou com medo de ser acusado de promover baderna, tinha a cabeça voltada para o junho de 2013 quando ocorreram inúmeros atos de violência anarquista-juvenil. O PMDB ficou como estava nas eleições - dividido. Outro grupo vai da direita conservadora até a extrema-direita. É esse grupo que pede a volta da ditadura militar. O quarto grupo presente nas passeatas é composto por pessoas comuns, de várias classes sociais. São aqueles que temem perder o que conquistaram nos últimos anos, especialmente suas casas, seus carros e os aumentos salariais acima da inflação. Ainda que sejam mais brancos que os das manifestações de junho 2013 e com idade superior não faz sentido afirmar que pertencem à elite. Foi uma manifestação popular.
Há uma característica de personalidade da Dilma que desapareceu da grande imprensa: ela é intransigente, inflexível. Em outras palavras: Dilma não é uma política. Quando muito ela pode ser classificada como uma amadora política.
É possível vislumbrar o futuro próximo?
Se os movimentos de Dilma e seus assessores forem os tradicionais, usados inclusive por Lula na época do mensalão, ocorrerá um crescente aumento de forças do PMDB nos ministérios mais importantes. Lula provavelmente desgastará os ministros que lhe desagradam, a cabeça do Aloizio Mercadante passa a ter grandes chances de ser cortada, ele exigirá algum político que lhe seja confiável. Mas são apenas hipóteses embasadas na história recente.
Mas há uma certeza - quem saiu fortalecido nos movimentos não foi a oposição.
Como é fácil administrar o Brasil.
Protesto de caminheiros? Mandem a Sula Miranda negociar com eles.
Protesto de petroleiros? Mandem o Sérgio Gabrielli descobrir um novo pré-sal.
Protesto da CUT? Mandem o Lula prometer benefícios eternos para as montadoras de automóveis.
Protesto da nova classe média? Mandem os bancos anistiarem as dívidas como faziam com os fazendeiros e industriais.
Protesto de professores? Mandem o Chalita negociar melhores salários.
Querem impeachment da Dilma? É mais fácil pagar passagem para a Argentina (só de ida). Dieta eterna com o método Ravenna politizado. Sem açúcar, sem pão, sem arroz e sem poder.