Do São João ao Casario do Porto, incêndios colocam memória em risco
Com o Pantanal pegando fogo, as vivências e bens culturais materiais entram na lista de preocupações
Assim como vidas correm cada vez mais perigo com os incêndios no Pantanal, todo o patrimônio cultural também entra na lista de perdas em potencial conforme as chamas tomam conta e a fumaça se espalha. O resumo de quem atua na área é que, desde os rituais para banhar São João até as paredes dos edifícios que compõem o Casario do Porto em Corumbá, tudo pode se perder com o tempo caso as mudanças climáticas e problemas ambientais em geral não sejam freados.
“É uma emergência. Falar de patrimônio cultural e mudanças climáticas, principalmente do nosso bioma Pantanal, é falar de Corumbá. Essa cidade que está convivendo com o clima intenso nessa época com as queimadas, calor excessivo e do próprio período de chuvas, que quando ocorre, vem muito forte”, introduz o superintendente do Iphan/MS (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), João Santos.
Nos últimos dias, uma série de matérias vem sendo produzidas sobre como a vegetação e os animais têm sofrido com o avanço dos incêndios. E, justamente nesse momento em que o cenário não apresenta melhoras, a relação entre patrimônio cultural e mudanças climáticas está sendo discutida na cidade até amanhã (26) no evento "Diálogos sobre patrimônio cultural e ações climáticas - etapa Pantanal".
Colocando o assunto na vida prática, João pontua que, por exemplo, a forma de vida dos moradores, as relações culturais das pessoas e os edifícios também integram o ambiente preocupante que tem se construído anualmente.
“A gente tem uma topografia da cidade, entre cidade baixa e cidade alta, com encostas no qual nos preocupa também porque a área tombada fica na parte baixa da cidade. [...] quando falamos de patrimônio imaterial, estamos falando das relações dos ribeirinhos com o Rio Paraguai, da própria natureza do banhar São João nas águas do rio e como essas mudanças climáticas alteram as dinâmicas”, pontua o superintendente.
Outro exemplo dado por Santos é a manutenção da viola de cocho, já que o avanço das queimadas interfere diretamente na disponibilidade de matéria prima para sua produção. “As árvores nativas da região pantaneira estão escassas, então precisamos pensar sobre como isso impacta diretamente no viver e em estar no Pantanal sul-mato-grossense”.
Participando do evento sobre mudanças climáticas, a professora do campus Pantanal da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul) e secretária do Comitê de Mudanças Climáticas e Patrimônio do Icomos (Conselho Internacional de Monumentos e Sítios), Luana Campos, comenta sobre o impacto no cotidiano:
Gerente de patrimônio material da Prefeitura de Corumbá e conselheira estadual do CAU/MS (Conselho de Arquitetura e Urbanismo), Lauzie Mohamed Xavier Salazar tem acompanhado a progressão da fumaça em direção à cidade. Unindo as chamas ao assunto geral sobre mudanças climáticas, ela relata que o impacto vai para além do que é possível observar com os olhos.
“Essas mudanças mudam nosso modo de viver e, consequentemente, nossas cidades e cultura. Falamos muito sobre reciclagem e não nos atentamos que a melhor forma de reciclar um edifício é utilizar aquele que já está construído. Falando em patrimônio histórico, temos muito a aprender com as construções mais antigas, pois essa arquitetura propiciava o melhor desempenho em iluminação e ventilação natural, conforto térmico interno e utilização dos materiais mais abundantes de cada região”, descreve Lauzie sobre como é necessário pensar sobre o cenário de uma forma ampla considerando tanto os incêndios quanto outros problemas ambientais.
Para a gerente de patrimônio, enquanto as discussões envolvem construções verdes e novas tecnologias de materiais sustentáveis, focar em soluções mais simples e eficientes tomando como base a história construída é um caminho interessante a ser seguido.
“É na área histórica de Corumbá que ainda temos a área mais arborizada da cidade, é nessa área que a pavimentação em paralelepípedos de granito, de forma permeável, permite melhor desempenho de absorção da água das chuvas e melhoria do microclima amenizando as ilhas de calor urbana”, completa Lauzie.
Diálogos sobre patrimônio cultural e ações climáticas
O evento em Corumbá segue até amanhã (26) e pode ser acompanhado de forma presencial e online. Esse é o segundo encontro a ser realizado presencialmente e é uma iniciativa do Iphan, Icomos-BR , Prefeitura de Corumbá, UFMS e possui apoio do CAU/MS.
Pela manhã, o evento começa às 8h e segue até 12h. Pela tarde, é das 14h às 17h no Centro de Convenções do Pantanal de Corumbá Miguel Goméz, Rua Domingos Sahib, 570, Centro. Já as transmissões podem ser acompanhadas clicando aqui.
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