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Arquitetura

Sem música, coreto de 98 anos vai definhando em ponto histórico

Estrutura foi inaugurada em 1925, época em que a Praça Cuiabá era ponto de encontro para tropeiros

Suzana Serviam e Aletheya Alves | 18/04/2023 08:00
Como deveria ser o coreto da praça Cuiabá, sob as mãos do estudante Jefferson Nascimento (Foto: Arquivo pessoal)
Como deveria ser o coreto da praça Cuiabá, sob as mãos do estudante Jefferson Nascimento (Foto: Arquivo pessoal)

Enquanto na imaginação, o coreto da Praça Cuiabá é tomado por vida, a realidade mostra uma estrutura de 98 anos abandonada. Apesar de já ter sido palco para diversas apresentações culturais, tanto o coreto quanto a praça integram mais um ponto de Campo Grande que, ao invés de atrair a população e turistas, afasta quem gostaria de estar por perto.

Comparada a outras capitais brasileiras, Campo Grande tem uma história recente e que poderia ser conservada com mais carinho. No caso da Praça Cuiabá, você consegue imaginar comitivas de tropeiros se reunindo por ali? Produtores rurais levando seus animais para a venda?

Em artigos sobre a importância do complexo da “Cabeça de Boi”, pesquisadores apontam que a região do bairro Amambaí é a mais antiga da cidade. E, consequentemente, a praça e o coreto integram esse espaço importante.

Mesmo assim, as paredes da estrutura de concreto vão sendo desgastadas pouco a pouco. E, sem uso destinado para a população, o coreto que faz a ligação entre o passado e presente vai ficando cada dia mais para trás.

Mas, para retornar à imaginação de uma Campo Grande viva, convidamos os estudantes Jefferson Nascimento Freitas, de 17 anos, e Maria Eduarda Pinho Echeverria, de 13, para dar vida ao coreto. Nos desenhos, o vislumbre é da potencialidade que o patrimônio ainda possui.

Jefferson é ciclista e, assim que aceitou o convite do Lado B, fez questão de pedalar até o coreto para observar. "Pela foto, achei o lugar até bonito, mas quando fui até lá era de noite e, além do lugar ser escuro, estava bem sujo. A sensação que me deu foi de insegurança", conta sobre a impressão presencial.

Pensando nesse motivo, o estudante escolheu destacar o ambiente vivo graças à iluminação reforçada. E, devido à intenção ser mostrar que o coreto pode ser ocupado, a praça também ganhou mesas com bancos.

Para convidar ainda mais a população, o adolescente pensou na acessibilidade através de uma rampa no lugar da escadaria. E, a partir de sua própria experiência, implementou um bicicletário, "acredito que esses itens serviriam de incentivo para a visitação ao local".

Porta arrancada, janela quebrada e paredes rabiscadas revelam o abandono (Foto: Paulo Francis)
Porta arrancada, janela quebrada e paredes rabiscadas revelam o abandono (Foto: Paulo Francis)
Pessoas em volta do coreto na época em que foi inaugurado. (Foto: Arca)
Pessoas em volta do coreto na época em que foi inaugurado. (Foto: Arca)
Banco da praça foi retirado após reforma realizada pela prefeitura. (Foto: Arca)
Banco da praça foi retirado após reforma realizada pela prefeitura. (Foto: Arca)

Responsável por outro desenho, Maria Eduarda não se lembrava de ter visitado o coreto e, quando o viu pela primeira vez, não acreditou no abandono. Para ela, o local precisa de retomar a alegria presente em pontos turísticos.

Por isso, sua arte dá destaque para a vegetação e, assim como no caso de Jefferson, mais luzes. Outro ponto pensado por Maria foram banquetas e mesas, tudo para garantir que ações possam ser convidativas para a população.

Além da parte visual, a estudante comentou que seria interessante incluir Internet de livre acesso e tomadas para carregar o celular.

Em relação ao uso do coreto em sua fundação, a resposta dos dois estudantes foi um desconhecimento. Mas, Eronildes Venâncio, de 80 anos, não só sabe como presenciou várias apresentações culturais por ali.

Até hoje, Eronildes mora na região, sendo que por um tempo sua casa ficava a meia quadra do coreto. O lar ficava na então Rua Y-Juca Pirama, que se tornou a Marechal Rondon.

Coreto sob as mãos de Maria Eduarda Pinho Echeverria (Foto: Arquivo pessoal)
Coreto sob as mãos de Maria Eduarda Pinho Echeverria (Foto: Arquivo pessoal)

Com memória impecável, Eronildes conta que já viu, por exemplo, Délio e Delinha se apresentarem várias no coreto.

Hoje, Eronildes tem dificuldades de locomoção por conta da artrose, mas revelou sentir falta da movimentação cultural que havia na região. "O pessoal gostava de se reunir ali, principalmente de madrugada. Cada vizinho levava a sua cadeira e ficava na praça. Não havia perigo nenhum. Agora não da nem pra passar ali, danificaram tudo", contou com tristeza.

Hoje, o coreto serve de abrigo para pessoa que moram nas ruas (Foto: Paulo Francis)
Hoje, o coreto serve de abrigo para pessoa que moram nas ruas (Foto: Paulo Francis)
Em 2019, bandeira LGBTQIA+ "abraçou" o coreto em sarau na praça. (Foto: Arquivo/Campo Grande News)
Em 2019, bandeira LGBTQIA+ "abraçou" o coreto em sarau na praça. (Foto: Arquivo/Campo Grande News)

Se esgotando

Para tentar conservar a história da cidade, em 2015, uma revitalização conseguiu reformar o coreto. Novas tinturas foram aplicadas, mas o banco que aparecia em imagens antigas deixou de existir por ali.

No mesmo ano, o projeto “Estação Cultura” levou apresentações musicais para a praça. Seguindo com a ocupação do espaço, 2016 foi o Campo Grande News que levou uma festa julina para o “Casório do Ano”.

Em 2018, o “Som do Coreto” levou 200 pessoas a uma das edições e, a partir do ano seguinte, os eventos se tornaram esporádicos até, aparentemente, terem desaparecido.

A reportagem solicitou uma nota à Prefeitura de Campo Grande indicando se há algum projeto para revitalização e ocupação cultural da praça. Entretanto, até o momento não houve retorno.

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