A partir do estudo das canções, projeto de extensão cria musical indígena
Alunos foram até às aldeias para pedir autorização, descobrir suas canções e a partir daí, interpretá-las em palco
Um mergulho na cultura indígena, por meio de sua música. Uma releitura de cantos indígenas, em especial os dos Kaiowá, acolhendo também outros grupos étnicos, como os Mbyá, Huni Kuin, Shipibo e Krahô. É disso que se trata o musical "Mborahéi Rapére", produzido pelo projeto de extensão da professora de História Indígena da Universidade Federal de Dourados (UFGD) Graciela Chamor. “Proponho as apresentações da música indígenas em palcos, fora do seu contexto original”, diz ela.
A peça, que estreou nesta sexta-feira, oficialmente, no palco do Teatro Municipal de Dourados,, roda o Estado, passando por Ponta Porã, no dia 7 de março, Campo Grande, na segunda-feira (5), e até Assunción, no dia 9. Além dos alunos participantes do projeto de extensão, estão no musical 22 indígenas Kaiowá, que não só ensaiaram com os alunos como também sobem ao palco com leituras próprias e autorais.
O espetáculo resulta da pesquisa e imersão do coletivo dentro das próprias aldeias de Dourados. Lá, os alunos puderam vivenciar como a música é feita, cantada e, porque não, idolatrada. "Participamos de várias apresentações para podermos adquirir conhecimento indo a campo, até hoje vamos pelos menos duas vezes por mês. Eu falo guarani, já que sou do Paraguai, então isso facilitou a comunicação com os indígenas", explica a professora.
O processo até chegar ao resultado final do espetáculo foi complexo. As músicas foram escolhidas, a partir da participação dos festivais dos Kaiowá, foram estudadas a fundo, pelo projeto de extensão dentro do Centro Cultural do Coletivo Beiraju, de alguns alunos da UFGD. "Temos também a assessoria de artistas que estudam essa música", completa.
A partir desse estudo, são compostos movimentos, coreografias e danças, que caminham até a dramaturgia para o palco. "A origem é o trabalho na aldeia mas a gente faz uma releitura que passa pelas artes cênicas, visuais, musicais e um pouco da história da cultura indígena aparece na peça".
Aos sons das tribos são adicionados também instrumentos musicais. "É uma novidade pra eles, ver a música que eles tocam e cantam sem auxílio dos nossos instrumentos, sendo reproduzida de forma tão diferente", explica Graciela.
A estreia nos palcos aconteceu essa semana mas o espetáculo já havia sido apresentado para eles, em seis reproduções nas aldeias. "Eles percebem que a música deles também pode ser tocada, pode ser uma coisa esteticamente compreendível e mostrada por outros grupos". O feedback deles é muito importante. "Após cada peça, a gente quer saber o que eles acharam, se concordam com as nossas interpretações, se acertamos", diz.
A peça começa com os alunos discorrendo sobre a história desses povos, sempre falando e cantando, ao mesmo tempo. Depois chega o momento que descem do palco e os indígenas sobem para apresentar 25 minutos de repertório. "A gente sobe ao palco para cantarmos juntos, duas músicas, aí eles descem para, no final, terminarmos o musical juntos", explica.
A entrada para assistir ao musical são doações de alimentos não-perecíveis, livros ou brinquedos para serem distribuídos às crianças das aldeias. "Queremos montar cantinhos de leitura para eles", diz. A produção foi financiada pelo Fundo de Investimentos Culturais (FIC).
Em Campo Grande, a "Mborahéi Rapére" é apresentada na aldeia urbana Água Bonita, na saída para Cuiabá, às 15h. Na segunda-feira, vai para o Anfiteatro do Bloco A da Universidade Católica Dom Bosco (UCDB), às 19h, sendo que antes, a partir das 8h, acontece uma oficina de música indígena nas salas de Artes Cênicas da Universidade, em que Graciela e os músicos falam um pouco sobre a criação do musical.