Para que todos enxerguem a arte, galeria tem audiodescrição até para quem vê
Inclusão. Essa é a palavra que define o trabalho dos audiodescritores, profissão prevista em lei, que garante o acesso a todo tipo de conteúdo, plataforma ou ambiente nos quais os deficientes visuais não teriam acesso, não fosse por esses profissionais. No mundo da arte, pouco explorado pelo maioria dos brasileiros, os cegos podem exigir a leitura das obras em museus e galerias desde o ano 2010.
Claro que nem todo espaço se preocupa com a inclusão dessas pessoas. Mas o Sesc Cultura se propôs a ter acessibilidade. A primeira experiência ocorre na mostra de abertura do local, de Edson Castro, uma oportunidade para que deficientes visuais interpretem por si só os trabalhos de arte abstrata do artista corumbaense.
Se já não é simples traduzir uma obra figurativa, imagine o tamanho do desafio das autodescritoras Cândida Albes e Ivone Angela dos Santos, contratadas pela instituição, para descreverem os quadros subjetivos e abstracionistas de Edson.
''A audiodescrição é um trabalho focado no objetivo, então precisamos pesquisar e estudar muito pra poder fazer a leitura dessas telas. Foi um trabalho em conjunto, no qual nós sentamos com o Edson pra poder realmente interpretar o que víamos ali, confirmar com ele se era mesmo isso que ele quis passar, elaborar o texto e o áudio, para finalmente passar pela revisão da nossa consultora cega, a Leia Ferreira'', explica Cândida.
Já foram dois encontros, focados em públicos diferentes, num primeiro momento para deficientes auditivos e visuais, e em outro para o público em geral.
No último sábado, a experiência coube a quem vê perfeitamente, para se colocar no lugar do outro e também entender a arte. Os visitantes foram vendados e ouviram os textos descritivos, sem saber o nome das obras, porque os títulos de Edson dizem muito sobre o quadro. Depois, a tarefa foi reconhecer cada um deles.
Foi uma experiência encantadora, porque grande parte da população é sim deficiente quando se trata do acesso a cultura. Soa tão elitizado, ao menos por aqui, comentar com outras pessoas a visita a uma galeria de artes plásticas.
Por isso, o serviço desses profissionais acaba sendo democrático. ''É indicado para quem é pouco letrado também, e para deficientes intelectuais, como os autistas, por exemplo'', confirma Ivone.
Em um dos quadros, o ''Exato e Incoerente'', os traços firmes do giz de Edson se misturam em nuances de cores diferentes. Uma pessoa com pouca sensibilidade para a arte diria que aquilo é um grande borrão. Mas Ivone e Cândida definiram da seguinte maneira:
''O alto da tela é iluminado pela luz do entardecer, o grafismo em constante movimento, com linhas expressivas. Em cores quentes e frias, remetem a pássaros em revoada, como dança coreografa, sobre o topo das árvores. Frente ao tronco das árvores, marcada pela presença de uma forma indefinida, ovalada de perfil, a esquerda, ocupa a parte inferior da tela''.
Para ter a oportunidade de participar de um desses encontros, mantenha-se atento a programação do Sesc, que permite um agendamento prévio para que as audiodescritoras compareçam ao local. A princípio estão agendadas visitas nos dias 14, 16 e 28 de junho.