Vanessa faz bonecas sem rosto, super fofas, que servem de amuleto
Além disso, artesã pinta ovos "escritos" à mão com significados personalizados para cada cliente – tudo isso da cultura eslava
Aos 41 anos, Vanessa Jerba é a única artesã de Campo Grande a se dedicar na tradição milenar das pêssankas e motankas (fala-se “mótankas”), isto é, os ovos coloridos e as bonecas sem rosto ucranianas. Recheados de símbolos, os objetos falam por si só: para cada cliente, uma mensagem e significado especial – a maneira eslava de, por meio da arte, celebrar a vida.
"Por parte de pai, minha família é toda ucraniana. Meus bisavós eram de lá. Dentro de casa, eu não cultivava a tradição, mas sabia sim da existência e do que os artesanatos representavam. Só na minha adolescência que comecei a praticar", explica Vanessa.
Antes de se entender como artesã, ela participava de um grupo de dança folclórica ucraniana lá em Ponta Grossa, no Paraná, sua cidade natal. Foi aí que as pêssankas e motankas começaram a ser produzidas por suas mãos.
"Aqui no Brasil não é muito comum ver esse tipo de trabalho, ainda mais aqui em MS. Tem todo um sentimento de ancestralidade, e não é só tudo muito bonito mas como também é representativo culturalmente falando", considera.
Passado 16 anos, já havia se mudado para Campo Grande e aqui formou família. Até então havia se esquecido da tradição ucraniana. Porém, foi por meio da filha, pela escola dela, que o assunto voltou à tona.
"Como trabalho escolar da minha filha, fizemos alguns ovos juntas. Aproveitei e contei a história das pêssankas. Acabei postando uma foto do resultado no Facebook, relembrando esses bons tempos. Devagarinho comecei a receber pedidos, e nunca mais parei", rememora.
Os ovos, conforme Vanessa explicou, são objetos para se comemorar a chegada da primavera após o longo inverno rigoroso europeu. Tamanho varia: pode ser desde o de codorna até o de avestruz. Tem todo uma simbologia própria, não são desenhadas, mas sim “escritas” à mão com caneta tinteiro e um corante específico “escrito”. Mas antes, a casca e o interior é esvaziado, limpo e tratado com cera de abelha.
Tudo que vem da natureza, para eles, carrega essa energia boa, protetiva".
"Ainda, existe uma lista dos símbolos e seus significados. Explico isso pra cada cliente, justamente para que possam personalizar o presente de acordo com o intuito. Por exemplo, se eu escrever trigo, flor, cervo e estrela, quero dizer fartura; amor e caridade; boa saúde e riqueza; e, por fim, longa vida a quem recebe a pêssanka".
Sem rosto – Também proveniente da época pagã pré-cristã, as bonecas motankas até então serviam de brinquedo para as crianças, que elas mesmo poderiam fazer. Com o tempo, viraram amuleto de proteção pela simplicidade e representatividade do objeto. Mas por que são feitas sem os dois olhinhos e um sorriso no rosto? Para a cultura ucraniana, "só a Deus pertence a criação do homem".
"O diferencial é que não são costuradas, mas feitas por um tecido enrolado e amarrado, sem uso de agulha. A face pode ser tanto vazia ou então com uma cruz no lugar do rosto. Pelos turistas, são os objetos mais procurados. Nunca havia visto aqui no Brasil, e comecei a pesquisar para também fazer as minhas".
Vanessa garante: melhor que o sentimento de ancestralidade, é poder passar de mãe pra filha uma cultura tão rica e uma tradição que ultrapassa os milênios.
Concurso internacional – No início do mês, o trabalho de Vanessa foi selecionado em um festival de arte em Atenas. Por meio de um grupo de artesãos ucranianos na internet, uma mulher eslava mas que mora na Grécia fez o convite para que ela participasse.
"Todo mundo elogiou a qualidade do meu trabalho. O legal que eu fui a primeira brasileira a ser contemplada em uma premiação especial do tipo. Tudo muito simples, afinal esse período de pandemia impediu qualquer viagem, mas foi com muita alegria minha participação".
Para encomendar as pêssankas e/ou as bonecas motankas, basta acessar o perfil no Instagram de Vanessa e conhecer o seu trabalho.
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