Amar incondicionalmente exige coragem e renúncia de mãe atípica
Mãe de uma criança atípica, Karen fala sobre a rotina, a mudança na carreira e o dia a dia
Se a maternidade já é um grande desafio cheio de renúncias, responsabilidades e dedicação, para uma mãe de criança atípica o pacote vem com tudo isso em dobro. Muitos dizem que ser mãe é descobrir o que é sentir um “amor incondicional”, mas mesmo um sentimento tão grande também “exige sacrifícios extremamente importantes”. Pelo menos é isso que relata a jornalista Karen Andrielly, de 38 anos, mãe do pequeno Samuel, de nove anos.
Karen relata que a chegada de Samuel foi um “milagre”, pois, antes dele, já havia sofrido dois abortos espontâneos. Ainda durante a gestação, ela recebeu o diagnóstico de trombofilia, o que lhe exigiu cuidados extremos e injeções diárias.
A criança nasceu no dia 11 de novembro de 2015, saudável, mas, no segundo dia de vida, sofreu uma convulsão que durou oito horas seguidas dentro da maternidade e precisou ficar 15 dias internada na UTI Neonatal, onde foi diagnosticada com um AVC (Acidente Vascular Cerebral).
A partir dali, os primeiros meses de vida de Samuel foram marcados por idas e vindas de consultas e pela incerteza, e Karen relata que se viu lutando não apenas pela saúde do filho, mas também em uma batalha interna.
“Ele enfrentou dificuldades motoras e de fala, e eu sentia uma dor profunda, especialmente ao ver os olhares de compaixão das pessoas. No entanto, uma profissional de terapia me ajudou a ver a situação de forma mais positiva, e pedi a Deus que mudasse minha perspectiva. Com o tempo, essa dor se transformou em gratidão”, diz.
Luz na sala de espera
Karen não precisou chegar ao fim do túnel para encontrar a luz para a dor enfrentada. Esse apoio, ela conheceu durante as longas esperas nas sessões de terapia do filho, onde relata que conheceu outras mães atípicas, que lhe ensinaram uma lição: “que, mesmo diante das dificuldades, a vida é um milagre”.
Isso ajudou Karen a ter forças para lutar, ao lado do filho, por uma infância e, futuramente, uma vida saudável e independente.
“Hoje, quero que as pessoas perguntem sobre o Samuel, para que eu possa compartilhar sua história de superação. Com o tempo, percebi o quanto era abençoada por ter o Samuel, uma criança cheia de vida, saudável e independente. Descobri que as sequelas deixadas pelo AVC não determinam quem ele é; são apenas detalhes que tornam sua existência ainda mais incrível”, expressa.
Maternidade é renúncia
Samuel faz acompanhamento com fisioterapeuta, fonoaudióloga, terapia ocupacional, consultas regulares com ortopedistas e neurocirurgiões e aplicação de botão a cada três meses. Karen é a responsável por acompanhá-lo em todos os compromissos, e também precisa dividir seu tempo para cuidar de seus dois filhos mais novos, Benjamin, de seis anos, e Isaac, de dois anos.
As três crianças possuem perfis bastante diferentes, e Karen garante que a rotina seja cheia de afazeres para estimular as crianças. Ela matriculou Samuel na escolinha de futebol, após o filho pedir muito, e Benjamin faz aulas de judô, jiu-jitsu e ginástica olímpica.
Para conseguir conciliar a rotina da maternidade com a vida profissional, Karen revela que trilhou um caminho de muitas renúncias, incluindo abrir mão da profissão dos sonhos.
“A minha vida mudou muito, eu era uma pessoa muito dedicada ao meu profissional. O jornalismo é algo que me fascina, é algo que me dá prazer mesmo, e com a vinda do Samuel, eu tive que optar por trabalhos mais tranquilos. Essa foi a primeira mudança, mas claro que com uma criança atípica, a sua renúncia é ainda maior”, expressa.
Hoje, Karen explica que sua vida é dedicada totalmente aos filhos, e opta por trabalhos remotos, que lhe permitam ter mais flexibilidade de tempo. Isso inclui não realizar exatamente as funções que gostaria, mas foi a forma que encontrou de dar conta das demandas.
“Às vezes a impressão que dá é que a sua única missão da vida é ser mãe. Só que às vezes isso é pesado também. Todo mundo idealiza uma maternidade que não existe, uma maternidade cheia de floreio, mas a maternidade é muito mais dolorida, penosa, ela exige muitas renúncias. O amor é incondicional, mas o amor incondicional ele cobra coisas extremamente importantes, por isso que ele é incondicional”, pontua Karen.
Desafios de criar uma criança atípica
Em sua jornada, Karen explica que a grande virada de chave foi transformar o “por que?” em “para que?”, e dessa forma encontrar um significado em toda sua luta. Desde já, ela faz questão de que Samuel saiba cada detalhe sobre sua própria história, e ensina o filho que seu presente e seu futuro são muito mais que apenas uma condição física ou um diagnóstico.
“O desafio não é só criar uma criança atípica, é criar filhos de uma forma geral. E com a criança atípica, eu acredito que o meu maior desafio é não permitir que ele tenha pena dele mesmo. Não permitir que a forma pejorativa, a forma de compaixão que as pessoas têm ao olhar para ele, entre dentro dele e ele se sinta incapaz por conta disso”, diz.
Karen revela que, diante de dificuldades para executar algumas tarefas do dia a dia, a tendência do filho é desistir, então ela desempenha um papel fundamental em incentivá-lo a tentar mais uma vez. “Eu mostro pra ele que embora ele tenha limitações, ele vai conseguir tudo que ele quiser e ele estiver determinado a conquistar”.
Recentemente, Karen assumiu a missão de passar a sabedoria da “mãe atípica” para frente, e escrever uma coluna, onde compartilha relatos sobre a experiência de ser uma mãe atípica. Em seus artigos, ela aborda assuntos que considera importantes de serem discutidos, como a solidão da maternidade, os desafios e dificuldades enfrentados por mães de crianças especiais e, principalmente, o bullying.
Família unida
A jornalista expressa que, dos três filhos, Samuel é o mais tímido, porém tem personalidade bastante brincalhona, além de ser próximo aos irmãos. “Quando ele tá com os irmãos, pegam fogo, fazem bagunça”, acrescenta.
Ao Lado B, Samuel compartilhou que gosta bastante de ser o irmão mais velho, e que a melhor parte de ter irmãos, é poder jogar futebol com eles, uma de suas brincadeiras favoritas.
Na escola, sua matéria favorita é matemática, e ele gosta muito de ir estudar e encontrar os amigos. Para o futuro, Samuel revela ser uma criança cheia de sonhos. Um deles é ser piloto de avião, quando for adulto.
“A parte legal é que eu sou diferente, e eu acho legal ser diferente, isso me torna especial”, expressa.
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