Após conhecer o poder do braile, João voltou a estudar aos 39 anos
Para celebrar Dia Mundial do Braile, biblioteca pública convida cegos para conhecer acervo em braile
Para celebrar o Dia Mundial do Braile, a Biblioteca Isaias Paimm, apresenta seu acervo para pessoas com deficiência visual e abre discussão sobre o sistema braile. Coordenadora da biblioteca pública, Eleuzina Crisanto de Lima, destaca que o acervo é pequeno, mas rico, com cerca de mil livros em braile.
"A biblioteca é um marco na área da acessibilidade porque ela tem o suporte: a impressora Braile, a máquina Perkins, a lupa para baixa visão, o teclado colmeia para mobilidade reduzida… Todo este acervo está disponível. Se o leitor não puder ficar aqui no espaço, ele pode fazer o cadastro, emprestar estes livros, imprimir na impressora e utilizar espaço reservado para a acessibilidade”, destaca a coordenadora.
Ano passado, a biblioteca ofereceu o primeiro Curso Braile aberto a toda a população. O curso foi considerado inédito na biblioteca e a coordenadora anuncia uma nova edição do curso para 2023: “Vamos fazer uma nova edição em março. Tivemos uma procura muito grande deste curso no ano passado", afirma.
Cego aos 39 anos
“O braile para mim é como o amanhecer do dia, o braile é a esperança do cego. É ele que nos traz o sentimento de pertencimento do mundo. Ele é a escrita do deficiente visual”. A frase é do professor João Guanes, que declarou seu amor ao sistema braile durante a visita.
João perdeu a visão com 39 anos devido a um descolamento de retina. Fez duas cirurgias no Hospital São Paulo e quando voltou, teve o período que ele chamou de luto. “Você não quer falar com ninguém, vêm aqueles pensamentos ruins, porque eu me lembrava daqueles dias, eu tinha minha empresa, era empresário, e de uma hora para outra aconteceu tudo isso. Depois de dois anos conheci o Instituto Sul-Mato-Grossense para Cegos Florivaldo Vargas, onde me reabilitei, aprendi a orientação de mobilidade, que é andar com a bengala, como me direcionar nos ambientes e a tecnologia”.
Dessa forma João quis voltar a estudar. "Na época, fui numa escola próxima de casa, e eu estava ainda no Ensino Fundamental. E essa professora – hoje ela é minha amiga – mas na época ela me disse com todas as letras: ‘Você não pode estudar aqui porque você é cego. Você tem que estudar onde só cegos estudam’. E aquilo me doeu, foi o primeiro obstáculo que eu encontrei depois que eu perdi a visão. Eu me lembro que eu chorei tanto aquele dia, eu passei mal", lembra.
Mas alguém ouviu essa conversa e buscou as autoridades. Depois de uma semana, a diretora chamou João e falou: “Você vai estudar aqui”, reproduz. "Se eu fizesse uma prova e tivesse uma nota boa, eu poderia estudar naquela escola. Ela me falou: ‘João, não desista, porque você está abrindo portas para outras pessoas.
Mesmo com as dificuldades, João não desistiu e passou a estudar com uma vizinha, que tinha um cyber. Depois de ser aprovado, João terminou o Ensino Fundamental, fez o Enem e foi para a sua primeira graduação, Comunicação Social – Jornalismo. Fez estágio como repórter, e em 2016 foi o primeiro e único cego repórter em TV no Brasil. Sentiu a necessidade de estudar mais um pouco, cursou Letras na UEMS e fez pós-graduação. Tudo através do braile.
“O braile me proporcionou acesso a tudo isso. O braile é insubstituível. Já tentaram várias vezes substituir o braile com as novas tecnologias, mas não tem como, ele é a escrita da pessoa com deficiência visual. É a base, é o começo. E quando eu estou em contato com o braile, eu esqueço de tudo. O Braile para mim é como o amanhecer do dia. O Braile me conduziu ao mundo da educação”, finaliza.
Visite a biblioteca pública
A Biblioteca Pública Estadual Dr. Isaias Paim fica no andar térreo do Memorial da Cultura e da Cidadania Apolônio de Carvalho (Avenida Fernando Corrêa da Costa, 559). O horário de funcionamento é de segunda a sexta-feira, das 7h30 às 17h30 e sábado das 8 às 13 horas. Telefone: (67) 3316-9161.
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