Assistente social que banca ONG não precisou sofrer violência para lutar contra
Presidente e fundadora da ONG "Mãe Águia", Daniela de Cássia Duarte tem dos 47 anos de vida, 15 deles dedicados à militância contra a violência. Em Campo Grande desde 1989, a assistente social paranaense não precisou sofrer violência para querer se engajar na causa e enxerga que se não tratadas, as vítimas de abuso tem a possibilidade de se tornarem abusadores no futuro.
Mãe Águia atende crianças e adolescentes vítimas de abuso e seus familiares e/ou responsáveis. O que incluem pais, tios e avós. No formato de associação, o estatuto da ONG prevê que sejam cadastrados associados individuais ou jurídicos que possam contribuir com qualquer valor a fim de manter a entidade em funcionamento. Caso contrário, o que Daniela vê são famílias que desistem do acompanhamento por não terem nem como pagar um passe de ônibus.
Daniela é uma das pessoas que embarcaram - há muito tempo - contra a corrente. "Durante minha trajetória de exercício profissional, me deparei com várias situações de violência contra todos os segmentos, mas o que mais me impactou foi quando crianças e adolescentes eram as vítimas", conta.
No decorrer de seus estudos, ela se voltou mais para vítimas de violência sexual. Na prática, o que a assistente social enxerga é apenas uma porta aberta pelo poder público. "Só temos um CAPS infanto-juvenil que atende e não dá conta. É um só para 800 mil habitantes", compara.
Dentro do movimento Mãe Águia, Daniela também dá suporte para criação e execução de políticas públicas da infância e juventude e hoje atendem 130 famílias. "Temos uma equipe de psicólogos e assistentes sociais", explica.
Em três anos de abertura da ONG, a situação que mais chocou a profissional foi se deparar com o caso de uma adolescente que foi abusada sexualmente pelo irmão e pai durante seis anos. "E quando ela foi para o tratamento de saúde, foi encontrado um tubo de vaselinha introduzido na vagina dela. Aquilo me impactou muito", recorda.
O que divide a indignação e tristeza da assistente social também são os casos de estupro de vulnerável, que pela legislação brasileira, situações subjetivas como "passar a mão" ou assistir a um filme pornográfico, por exemplo, já se enquadram no crime.
"Temos o caso de abuso de uma criança de 2 anos assim e se não tratar, são possíveis, repito possíveis abusadores de amanhã. Porque quando não são tratados, a violência é uma reprodução", enfatiza.
O engajamento dela nada tem a ver com um passado de violência sexual. "Meu engajamento é como profissional comprometia com questões sociais na infância e juventude e também como mãe. Meu filho já tem 18 anos e me acompanhou nesta jornada", acrescenta.
Daniela também está à frente da Comissão Municipal de Enfrentamento da Violência Sexual contra Criança e Adolescente (COMCEX), paralela à presidência da ONG, onde foi reconduzida para mais três anos de direção e viu muitos ex-diretores largarem o barco. "Se eu já quis desistir de tudo? Já. Nosso espaço é cedido e nós atendemos diariamente, então as questões vão se avolumando. As dificuldades, os problemas, nós vivenciamos tudo isso. Não é só uma militância de uma campanha ou outra não, eu participo todos os dias e não é fácil", desabafa.
A primeira barreira é de estrutura financeira.
"Precisamos muito da iniciativa privada. As empresas podem tanto e cadê a responsabilidade social? Nós nadamos sim contra a corrente, porque tem muito dinheiro pessoal investido ali. Lanche para as crianças? Eu e outra assistente social colocamos a mão no bolso, porque não queremos que elas saiam de lá sem um suco. É muito quente, não temos ar condicionado. Então as condições, em resumo, não são muito favoráveis, mas a gente faz com muito, muito amor. É muita doação, muita entrega", desabafa.
Qualquer ajuda é bem vinda e pode ser feita pela página do Facebook ou o próprio site da ONG.
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