Cheia de dívidas após separação, Rafaela venceu achando emprego para vizinhos
Existe uma lan house no bairro Noroeste, precisamente na Rua Indianápolis, número 2000, que é um desses locais que aos olhos dos mais desatentos pouco se nota. Na fachada do "Cyber da Rapha", os anúncios de plastificação e impressão são pura modéstia diante da importância dos serviços prestados no local para toda comunidade do bairro.
O lugar virou ponto de utilidade pública na região e para quem chega pela primeira vez, é impossível não se impressionar com o sorriso e a simpatia de Rafaela Joaquina Laureano, de 29 anos, dona do estabelecimento.
Ali, Rafa faz matrícula em escolas, inscreve moradores em programas sociais do governo, providencia agendamentos via internet e até ajuda a arrumar um emprego. Prestar esse tipo de serviço aos moradores foi a solução que a comerciante encontrou para dar a volta por cima, depois do fim de um casamento de 14 anos, R$ 50 mil em dividas e uma depressão que a fez ir até o fundo do poço.
Há cinco meses é ela quem administra sozinha a lan house. Por 7 anos o negócio foi tocado junto ao ex-marido, até a surpresa do abandono. “Eu me vi sozinha, sem filhos, sem família e a única coisa que me restou foi esse negócio...Um sonho que não era meu, mas que eu aprendi a amar”, conta.
A depressão profunda fez Raphaela perder quase 40 quilos. A cura veio ao encontrar nos próprios vizinhos o apoio que tanto precisava. “Pensei em desistir, sofri muito, até que os moradores começaram a pedir para que eu continuasse. Que precisavam de mim... e isso me motivou...Quis dar uma repaginada na vida, cuidar de mim e dar a volta por cima” diz sorridente.
E a mudança foi mesmo total. Para agradar ainda mais aos clientes e desmistificar o mito de que lan house não dá mais dinheiro, Rafaela criou vários serviços extras. Implantou o “Balcão de Empregos” uma espécie de catálogo, com as ofertas dos principais classificados da cidade.
“Toda semana eu atualizo as vagas. O cliente vem aqui, eu faço o currículo e se ele quiser já envio via e-mail”, explica. Rafaela já perdeu a conta de quantos adolescentes aprendizes, por exemplo, ela já encaminhou ao mercado. Evangélica, ela garante que para cada cliente que vai a procura de emprego, ela faz uma oração.
“Por ser um bairro carente, muitos moradores não têm qualificação, então fica difícil arrumar emprego. Eu imprimo os currículos, entrego as cópias para o cliente e oro para que ele encontre logo um trabalho”, conta.
Computador no bairro já é algo comum, mas a falta de dinheiro para a internet ainda sustenta o negócio de Raphaela, que disponibiliza 13 computadores para os clientes com wi-fi, por R$ 2,50 a hora. “Muitos moradores já têm computador em casa, mas não sabem usar ou então não têm dinheiro pra manter um impressora ou a mensalidade da internet. Por isso, vem aqui e eu sempre ajudo no que posso”, diz.
A garotada também faz a festa nas 2 TVs de 50 polegadas com Plastation e também tem a prateleira dos “Doces da Infância”, como Rafaela gosta de chamar a variedade de suspiros, “Maria Mole”, sorvetes secos e outros produtos difíceis de encontrar na cidade, mas que não faltam no estoque dela.
Tanta dedicação é motivo de reconhecimento entre os próprios moradores. “É a única coisa importante que tem no bairro...O atendimento aqui é completo. Quando ela vê uma necessidade de alguém ela estuda, pesquisa, arruma uma forma de poder ajudar”, comenta o representante comercial Marco Antônio.
Até empresas Rafaela já colaborou na hora da abertura formal, com a impressão de documentos e boletos.
Um cliente fixo é o empresário Ramão Ferreira Vilalba. “Ela faz até os contratos da minha empresa. Hoje, por exemplo, ela está redigindo a rescisão de um funcionário...Mesmo com todas as dificuldade que ela já passou, ela se esforça, não deixa o barco virar”, avalia.
Dos R$ 50 mil reais em dívidas que teve de assumir com o fim do casamento, Raphaela garante que só falta pagar R$ 3 mil. Por isso, começa a planejar o futuro. Ela pensa em reestruturar o lugar, contratar funcionários e depois, até montar um pequeno shopping no Noroeste.
Para finalizar, pergunto de onde vem aquele sorriso, mesmo em meio a tanta dificuldade. A resposta serve de lição.
“Decidi mudar de vida, quando me perguntaram do sorriso que há 14 anos não viam? Sou muito grata a esse bairro. Todo mundo se conhece, cuida de mim. Do que adianta ter um milhão de amigos numa rede social, se ninguém se preocupa em saber como você está. É daí que tiro minha força... Estou me reerguendo aos poucos e toda mulher tem essa capacidade... A gente mal sabe a força que tem”, ensina.