Enquanto uns pedem sol, Cícero espera o maior “toró” para vender guarda-chuva
Figura no Centro, vendedor trabalha há 31 anos nas ruas de Campo Grande
Cícero não olha para o céu como quem observa o voo de um pássaro ou o formato da nuvem. Também não conta estrelas. Em compensação, parece dividir o expediente com São Pedro. “É só eu pedir para chover que chove”, fala, sorrindo, durante as vendas de guarda-chuva.
Essa é a história do olhar de um vendedor chamado Cícero Firmino da Silva, 56 anos, que, há três décadas, diz trabalhar no Centro, em Campo Grande. “Já vendi de tudo, relógio do Paraguai, antena de TV, carregador de celular, tudo o que você imaginar”, conta.
Uma figura simples que, quase não é notada, entre as dezenas vendedores ambulantes no quarteirão da Praça Ary Coelho. Mas, bastam os primeiros pingos de chuva despencar do céu para, até o mais desatento, atravessar a rua com olhar curioso para o homem baixo, magro, camisa social, que não tira os olhos do céu.
“O que senhor faz?”, pergunto, com cabeça inclinada, tentando enxergar a mesma coisa que Cícero. Aos risos, ele responde: “Se chove eu trabalho”, repete, três vezes, enquanto caminha com os guarda-chuvas no braço.
Enquanto uns pedem pelo sol, no janeiro que ainda resta, de férias para alguns, de piscinas para quem tem o privilégio numa tarde ensolarada, Cícero quer mesmo é que caia o maior “toró”. “Hoje eu vendo guarda-chuva, então, eu quero que chova, senão tenho que voltar para casa cheio de mercadoria”, afirma.
“Janeiro é um mês bom”, diz ele, que cuida o céu o tempo todo. “Eu fico olhando e a nuvem atende meu pedido. Enquanto muitos olham o tempo para não ter chuva, eu olho o céu como oportunidade”.
Assim é a vida do ambulante, que diz que por não ter estudado a rua foi uma opção. O homem nasceu em Terra Rica, no Paraná. Chegou por aqui em 1971. Morou em Deodápolis e em Dourados, até chegar a Capital.
Antes da vida como ambulante trabalhou anos na roça. Depois, casou-se, tornou-se pai de dois filhos e avô de duas meninas. “Veio família e eu fui trabalhar na rua. Primeiramente porque eu gosto, segundo porque não tenho estudo, naquela época era muito difícil”.
E foi isso que o tornou feliz, garante. “Isso é um dom que Deus me deu, eu não tenho dificuldade em vender, se tivesse que trabalhar os 365 dias do ano vendendo, eu venderia”, finaliza.
Esse texto poderia continuar aqui com novos parágrafos, porque quem tem três décadas de rua deve ter muita coisa para contar, mas graças ao pedido de Cícero, a chuva despencou com força, bem no meio da entrevista. Sem tempo para despedidas, lá se foi o vendedor correndo, oferecendo guarda-chuvas para quem tenta fugir dos pingos, que nesta semana caiu com força na tarde campo-grandense.
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