Há 31 anos José recomeçou a vida em esquina que virou cenário clássico da cidade
Com dois filhos pequenos, ele e a esposa vieram de Passo Fundo no escuro, sem saber o que encontrariam por aqui
![Tranquilo, de fala mansa e bastante simpatia, José abre a borracharia às 7h da manhã há 31 anos (Foto: Kimberly Teodoro)](https://cdn6.campograndenews.com.br/uploads/noticias/2020/03/10/2r8ezztbw4is4.jpg)
Na esquina da Rua Antônio Maria Coelho com a Avenida Presidente Ernesto Geisel, o prédio alaranjado com grades de ferro como portões já não chama a atenção da vista de quem passa por ali todos os dias e está acostumado a ver a figura de cabelos brancos e ar tranquilo em frente. José Antônio Sabadim, de 67 anos, faz parte do cenário. Em dias menos movimentados senta na fachada da Borracharia Gaúcha para aproveitar a sombra e tomar tereré no calor da cidade.
Como o próprio nome do lugar denuncia, José é gaúcho e enfrentou os 1.148 km de estrada entre a cidade natal, Passo Fundo, e Campo Grande. Há 36 anos chegou com a esposa e dois filhos pequenos para começar a vida do zero, depois que a construtora da qual era dono quebrou, em 1982.
![Em dias de movimento mais tranquilo, José aproveita a sombra para sentar em frente ao comércio e tomar tereré para enfrentar o calor de Campo Grande (Foto: Kimberly Teodoro)](https://cdn6.campograndenews.com.br/uploads/noticias/2020/03/10/dloifq2kprl3.jpg)
Sem um plano certo e nenhum conhecido no Estado, José e a família encararam a estrada em um caminhão, com todos os móveis que tinham como bagagem. "Foi loucura, não sabia o que encontraria aqui, mas ainda era novo e tinha vontade de trabalhar. Passamos dois dias com todas as coisas dentro do caminhão até acharmos uma casa para alugar", conta.
A primeira parada foi São Gabriel do Oeste, onde arranjou emprego em uma fazenda, mas depois de 5 anos, ele decidiu mais uma vez começar de novo, dessa vez em Campo Grande, para que os filhos pudessem estudar. Foi aí que a ideia da borracharia surgiu, um ofício que ele aprendeu na fazenda e que exerce há 31 anos no prédio construído por ele em terreno alugado, que mesmo depois de tanto tempo ainda pertence ao mesmo "japonês" que não vende de jeito nenhum.
![Hoje com mais estrutura, José lembra dos dias em que a única coisa que oferecia era a mão de obra e o comércio ainda não tinha um único pneu (Foto: Kimberly Teodoro)](https://cdn6.campograndenews.com.br/uploads/noticias/2020/03/10/3vxc4vz1s3s4g.jpg)
Hoje, com mais estrutura e dois funcionários que já estão com ele há bastante tempo, José lembra de quando ainda era sozinho no ponto, com um único cômodo que servia de escritório, sem nenhum pneu a venda. "Não tinha muito dinheiro para investir, o principal serviço que oferecíamos aqui era mão de obra e todo o resto veio depois de muitos anos de trabalho, de pouco em pouco", relembra.
Casado há 46 anos, ainda volta para o sul para rever a família, mas vida ele e a esposa Dacila Maria Sabadim, estabeleceram mesmo aqui, assim como os filhos que também escolheram continuar morando Campo Grande. A única coisa da qual ele realmente sente falta é o estilo de vida sulista.
José tem amigos de longa data aqui na cidade, mas segundo ele é "cada um na sua casa" e os encontros se resumem a datas comemorativas ou pescarias de fim de semana, coisa rara no Rio Grande do Sul. "Lá existe mais familiaridade dos amigos que se visitam e fazem parte do cotidiano uns dos outros" explica.
Enquanto conseguir trabalhar, a borracharia vai continuar abrindo das 7h às 18h, mesmo com tempos em que é necessário "lutar" para manter o comércio aberto, que conta com clientes antigos, mas exige muita dedicação para não fechar as portas.
O merecido descanso, José encontra na chácara em Piraputanga, 158 km de Campo Grande e lugar para onde pensa em ir depois que a borracharia fechar as portas, em um futuro muito distante para o senhor que mesmo com a idade ainda troca pneus pessoalmente e é lembrado pela tranquilidade e fala mansa, com um sotaque gaúcho que nunca se perdeu e do qual tem orgulho.