Na rua, Febraro ouve reclamações sobre relacionamentos que vão mal
Namorado(a) não quer discutir o relacionamento? Então, converse com Febraro, que resolveu rodar pelos bairros
No cavalete, os dizeres “Reclame seu amor aqui” são um convite para os corajosos abrirem o coração e motivo de olhares curiosos. É como se ele estivesse do outro lado em uma "DR" (Discussão sobre Relacionamento).
O escritor Febraro Oliveira, 23 anos, há dois dias, transita pelas ruas da cidade e permanece nos pontos de ônibus esperando escutar histórias de amor dos moradores. Sem o intuito de dar conselhos ou avaliar relações alheias, ele desenvolve o papel de ouvinte para aqueles que só precisam de um incentivo para falar.
Apesar da iniciativa ter começado nesta semana, essa não é a primeira vez que o escritor realiza a ação. Há dois anos, inspirado pela canção “Melodia Sentimental”, ele teve a ideia de percorrer os espaços públicos de Campo Grande com a placa provocativa. Na época, ele permanecia durante todo o dia na Praça Ary Coelho, onde ouviu diversas histórias, desde bonitas até as mais sensíveis.
Neste ano, conforme o jovem, o propósito continua o mesmo, porém é executado de maneira diferente. Agora, ele escolheu visitar os bairros, sair da região central da cidade e transitar pelas ruas. Sem itinerário definido, o poeta sai de casa e aguarda pacientemente a aproximação de estranhos. “Na última vez, eu sabia os lugares que ia, mas dessa vez, tem uma poética da espera, de estar distraidamente atento. Eu não tenho meio e nem fim definido, só tenho o começo”, explica.
A princípio, as pessoas somente o observam, analisam a placa e tentam entender o significado dela. Movidas pela curiosidade, elas abordam Febraro e, a partir disso, resolvem contar alguma história pessoal.
Até o momento, ele comenta que ouviu somente seis relatos. “Pessoas conversaram comigo no ponto de ônibus, foram conversas rápidas, eu só fico escutando. Elas têm uma timidez, ficam muito tempo paradas e olhando em silêncio. Às vezes, elas me perguntam e eu respondo, é um diálogo diferente”, destaca.
Nesta semana, Febraro circulou nos bairros Pioneiros e Universitário. Nessas regiões, o fato dos moradores se conhecerem trouxe uma experiência diferente. “Fazer isso em bairros é mais complicado, porque as pessoas se conhecem, ficam olhando, é um momento mais arriscado. Mas eu quis fazer nesses lugares para descentralizar a narrativa”, pontua.
Desde o começo do projeto, Febraro já ouviu histórias de todos os tipos. Os relatos não são só sobre amor romântico e envolvem também familiares e amigos. Algumas pessoas o abordaram com belas narrativas, enquanto outras revelaram viver relações complicadas.
Embora tenha escutado muitas histórias, o jovem conta que uma em particular o marcou. “Na primeira vez que fiz na Praça Ary Coelho, uma mulher, que era prostituta, contou que estava fugindo do marido com os três filhos. Ela tinha marcas no corpo, o marido a marcava com faca. Essa história é muito forte, no final, ela me deu dois reais, era tudo que ela tinha”, recorda.
Em São Paulo, o poeta também levou a placa até a região da Cracolândia. Por lá, expõe ter escutado narrativas mais sensíveis e profundas. Já na rodoviária, ouviu a desilusão de amor de um rapaz que viajou para conhecer uma garota. “Na rodoviária, tinha muita história de amor, gente indo encontrar o outro pela primeira vez. Teve um cara que foi ver a menina a quilômetros de distância, mas voltou, porque ela não gostou dele. Na Cracolândia, foram histórias mais tensas, um dia muito diferente de dor, de intensidade”, revela.
Sobre a iniciativa em Campo Grande, Febraro reforça que a proposta é ser um local de escuta para aqueles que precisam conversar com alguém. Mesmo que a frase no cavalete seja sobre reclamação, ele garante que as pessoas não precisam se prender a esse detalhe. Tem tantos lugares mais profundos além da reclamação, é um convite para o possível. As pessoas só precisavam de alguém para escutar”, enfatiza.
Para aqueles que querem falar e não sabem como começar, o escritor faz um convite para o procurarem nas ruas. “Nós temos que abraçar aquilo que não conseguimos dizer. O amor é uma relação do impossível, do outro junto a nós. Se a gente abraça a impossibilidade, fica mais fácil de vir a palavra”, finaliza.
Febraro deve continuar transitando pelos bairros de Campo Grande durante todo o mês. Para ouvir as histórias, ele garante que não cobra nada, não julga os relatos e nem oferece resoluções não solicitadas. O propósito é exclusivamente ouvir.
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