No Centro desde o nascer de MS, Valdivino achou que ficaria rico com paçoca
Da época que dinheiro chamava “Barão”, o fervo da Rua Antônio Maria Coelho com Rua 13 de Maio rendia a venda de mil doces por dia
Desde 1977 pelo comércio de Campo Grande, Valdivino Barbosa de Souza, de 75 anos de nascimento e 68 no documento, pensou até que ficaria rico na época do “fervo central” da década de 1980. Figura famosa do Centro, o ambulante viveu o período da segunda aparição do Cruzeiro, com cédulas que estampavam o rosto de José da Silva Paranhos - o Barão do Rio Branco, uma fase de vacas gordas em que se vendia até mil doces por dia.
Valdivino chegou a trabalhar com construção civil, mas garante que a única coisa que sabe fazer até hoje é vender. O “ambulante raiz” garante que dentro de um auge de duas décadas, entre 1977 e inicio dos anos 2000 conseguia dar folgas a si mesmo comercializando doces “O movimento era tão bom que eu conseguia vender o suficiente para sair para gastar e só depois voltar a vender”, lembra.
As paçocas, doces de leite e cocadas não são fabricação própria, mas Valdivino não revela a fonte. Atualmente, os preços são variados e vão de R$ 3 a R$ 12, dependendo do tamanho.
Nesses 42 anos de história, Valdivino é prova de que os tempos mudaram. Em sua sabedoria etária, o ambulante reflete sobre um cotidiano moderno e destaca o quanto as pessoas preferem preço ao valor.
“Hoje em dia a criança até pede um docinho, mas a mãe prefere levar para tomar uma casquinha ou visitar a Americanas que tem muita coisa para ver. Então os R$ 3 aqui, são mais caros que um objeto de R$ 30 em uma loja. Hoje o que importa é o preço e não o valor das coisas. E quando eu digo que a mãe prefere levar para tomar a casquinha, não é a do picolezeiro que passa na rua”, conta.
A paradeira no Centro pode até impedir a venda de 1000 paçocas, mas Valdivino destaca uma estratégia de apresentação “das antigas”, porém infalível.
“Mesmo vendendo mil naquela época, o carrinho não voltava vazio. Se você entra numa loja e vê duas camisas no cabide você não compra. Sai na hora para procurar uma loja cheia de opções. O mesmo acontece com o carrinho. Ele é uma vitrine, nunca pode estar vazio. O estoque tem de estar a vista do comprador. Se ficam duas ou três ninguém quer. Ele não pode achar que o carrinho está às moscas. Então como a gente é pequeno, não tem a grandeza de uma loja, tem de ao menos parecer que é grande”, garante.
Só se vê carro – Nos 20 anos de idas e voltas ao Centro, Valdivino se sustentou vendendo doces. Neste período, até pensou que ficaria rico, mas não foi bem o que aconteceu. A frequência de pessoas caiu e o fluxo de carros aumentou.
“Na década de 80 pensei que eu iria enricar. Eu vendia 1000 paçocas, mas hoje não vende nem 100. Eu sempre pegava a maior nota de “Barão”, chega enrolava no jornal. Hoje só se vê carro nas ruas. Para você ter uma noção, meu ponto nem era aqui (Barão do Rio Branco), era lá na Antônio Maria Coelho com a 13 de Maio. Muita gente passava por lá e às vezes eu até parava na Maracaju. Agora não tem ninguém em lugar nenhum, nem na Dom Aquino. A gente só vê carro, mas fluxo de gente não tem. Os lojista ficam sói roendo unha”, conta.
Nascido e criado em Campo Grande, Valdivino lembra até que o desejo de servir ao Exército Brasileiro fez sua idade ser reduzida em quase sete anos. “Antigamente a maior parte das pessoas era registrada depois dos 15 e 20 anos. Diminuir minha idade não importava queria muito servir. Hoje já tenho 75 anos, mas no registro 68 anos”, conta.
Hoje, Valdivino é aposentado com um salário mínimo e depois de uma pausa de 15 anos das ruas do Centro, voltou com um só desejo: vender 1000 paçocas.