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Comportamento

Para vítima, folheto de fofoca sobre traição se tornou pior pesadelo

Técnica em secretariado teve sua imagem vinculada a várias acusações em folheto espalhado pela cidade

Aletheya Alves | 21/12/2022 06:04
Folhetos com acusações foram espalhados por três avenidas da cidade. (Foto: Aletheya Alves)
Folhetos com acusações foram espalhados por três avenidas da cidade. (Foto: Aletheya Alves)

“Penso em ficar em casa, trancada”. Três dias depois de ter o rosto estampado em panfletos com uma série de acusações e passar horas tentando recolher a última das violências sofridas nos últimos meses, a técnica em secretariado, de 31 anos, ainda não consegue parar de tremer. No sábado (17), sua imagem e informações pessoais foram espalhadas por ruas e redes sociais e, desde então, ela vem reunindo forças para enfrentar o terror que sua vida se tornou.

Cópias distribuídas na Avenida Senador Filinto Müler, Avenida Eduardo Elias Zahran, Rua Dom Aquino e pontos de ônibus exibem uma foto da mulher, que não será identificada para ser preservada, ao lado do aviso “cuidado!” em caixa alta.

Inicialmente, o bilhete dá informações sobre o nome da mulher, local em que trabalha e igreja que frequenta. Em seguida, as acusações começam: “Cuidado com essa mulher pois ela se envolve com homens casados, pais de família, se você frequenta o hospital ou essa igreja cuidado!!! Se ver essa mulher próxima ao seu marido ou companheiro tire ela de perto deles, pois ela irá se aproximar como uma irmã caridosa que ajuda os necessitados, mais essa ajuda é em outro sentido…” (SIC).

Até o seu perfil do Instagram foi divulgado no panfleto. (Foto: Aletheya Alves)
Até o seu perfil do Instagram foi divulgado no panfleto. (Foto: Aletheya Alves)

Explicando que os panfletos foram o ápice de agressões que vinha sofrendo há cerca de dois meses, a técnica narra que se manteve em silêncio durante todo o tempo. Mas, agora, se sentiu obrigada a falar. De acordo com seu relato, a responsável pelas acusações é a ex-esposa do seu namorado.

“Eu não sei se alguma outra mulher chegaria a esse nível, a gente nem imagina uma coisa dessas. Eu nunca tinha sofrido um ataque assim, dessa maneira, nem por conta da minha cor e nem por outras coisas, porque não tem mesmo o que atacar. E vir tudo junto dessa maneira é realmente bem complicado”, diz a técnica.

Publicação feita em perfil do Instagram com mensagem parecida. (Foto: Reprodução)
Publicação feita em perfil do Instagram com mensagem parecida. (Foto: Reprodução)

De acordo com a vítima, há cerca de dois meses, ela recebeu mensagens da ex-mulher de seu namorado falando sobre como ele “não é essa pessoa boa que está mostrando, que não é um bom pai''. Na época, o casal já havia se separado há cerca de 10 meses, como afirma o homem, de 39 anos.

Desde então, novas mensagens começaram a surgir, assim como publicações no Instagram e Facebook. “Deixe em paz minha família [nome da vítima], irmã da [nome da igreja] pare com esse caso com meu marido [nome]. Meus filhos precisam de pai!”, diz uma das postagens.

Além de fazer as publicações em redes sociais próprias, a ex-mulher teria comentado as acusações até em uma live feita pela igreja em que a vítima participa. “Eu não revidei nenhuma vez, não respondi as mensagens dela e continuei calada até hoje”, explica.

Acreditando que em algum momento as acusações iriam parar, a técnica tentou seguir a vida, mas no fim de semana acordou em meio a um pesadelo ainda maior com os folhetos. “De sexta para sábado, acredito que foi de madrugada, ela soltou esses panfletos com minha imagem, rede social, na frente do lugar em que trabalho. Jogou na Zahran, onde minha irmã trabalha e na Dom Aquino, onde minha mãe trabalha”.

Logo cedo, no sábado, quem deu a notícia sobre os panfletos foi uma de suas irmãs e por alguns minutos a técnica não acreditou. “Eu fiquei ali meio sem saber, sem acreditar”, diz.

“Desde então fiquei ali parada, bem nervosa, mas tentei manter a calma. Levantei, tomei banho e minha outra irmã ligou preocupada. Saímos com minhas irmãs, com ele [namorado] e mais ou menos 11h da manhã terminamos de recolher os panfletos. Para mim, a pior coisa foi isso, ser exposta dessa maneira”, detalha a mulher.

Conforme a família fazia o trajeto, a vítima foi percebendo como a história realmente havia se espalhado. Isso porque além dos folhetos distribuídos pela cidade, uma via foi parar nas redes sociais, e o que pode parecer apenas uma fofoca para alguns tem gerado crises de ansiedade diárias para a mulher.

“Quando durmo acabo sonhando que tô falando com ela, é uma coisa muito esquisita. Minha alimentação mudou totalmente, não tenho apetite e com isso que ela fez, com esses panfletos, eu desabei, realmente não tive forças”, conta.

Mensagens foram enviadas para o ex-marido e chegaram até a igreja. (Foto: Aletheya Alves)
Mensagens foram enviadas para o ex-marido e chegaram até a igreja. (Foto: Aletheya Alves)

Devido ao conjunto de agressões sofridas no decorrer dos últimos meses e vendo seu rosto sendo comentado por inúmeras pessoas, a mulher narra que já não sabe o que fazer. Em novembro, um primeiro boletim de ocorrência havia sido registrado, mas nesta terça-feira outro foi criado para incluir as informações sobre os folhetos.

Mesmo vendo os documentos policiais comunicando os crimes de perseguição, calúnia, difamação/injúria, a dor sentida até agora parece não cessar, como ela diz. “Fui ao médico, me medicaram porque eu estava tendo muita crise de ansiedade. Tô bem abalada, bem abatida porque ter levado a esse nível, ter envolvido minha família, minhas irmãs, minha mãe…”.

“Para eu segurar isso está sendo muito difícil, estamos indo para a lei porque é mesmo muito difícil. Não é fácil receber esses ataques diariamente. Meu celular toca e tenho que olhar na hora porque parece que alguns amigos vão me mandar algo novo e geralmente é isso. Todos os dias eu estava recebendo algo”, explica a técnica.

Sem saber como serão seus próximos dias, a vítima desabafa que especulações sobre sua vida só tem piorado ainda mais a situação. E, reunindo forças para continuar se defendendo, a esperança é que o processo judicial impeça que novas agressões surjam.

“Muita gente que nem conheço me mandou mensagens dando força, dizendo que preciso me defender, que isso não é assim. E eu não vou voltar atrás mesmo”, diz a vítima.

Sobre todas as acusações, o namorado da vítima, um autônomo de 39 anos, diz que nunca imaginou que a ex-esposa faria tantas agressões. "Até eu que fui casado com ela por tanto tempo não acredito, foram quase 13 anos. Não imaginava que ela seria capaz de fazer essas coisas".

Ainda de acordo com ele, o processo de separação está na Justiça e, hoje, seu contato com a ex-mulher só existe para falar sobre os filhos.

A reportagem também entrou em contato com a ex-esposa que nega todas as acusações. De acordo com a mulher, ela não enviou mensagens, não fez nenhuma publicação em redes sociais e também não criou ou distribuiu os panfletos.

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