Relação que sobreviver à quarentena sob o mesmo teto enfrenta de tudo
Psicólogo comenta que é natural que aconteça um acirramento nas discussões não resolvidas pela proximidade do casal no isolamento
Não existe um protocolo comportamental sobre a quarentena. No entanto, o isolamento vai fazer com que os casais passem mais tempo juntos e com isso, pode ocorrer um acirramento dos conflitos não resolvidos pela proximidade. “Isso porque o conflito já existe e um vai incomodar o outro”, diz Neido Castilho Júnior.
Ele é psicólogo há cinco anos e atua com terapia de casais em Campo Grande. Neido conversou com o Lado B, assim como a psicóloga Fernanda Bueno, que comentou sobre o cenário do casamento antes do coronavírus e agora com o confinamento.
“Na estrutura de um casamento sem o isolamento social, a quantidade de tempo era pequena e tendo vários pontos de fuga, como futebol com amigos, trabalho fora de casa para ambos ou apenas uma das partes. Todos tinham vida paralela além do casamento”, fala Fernanda, que atua na área 20 anos.
“Com o isolamento, todos os sentimentos são potencializados. Cada um está vivendo dentro da sua ilha. Na teoria pode ser uma linda história de amor, mas na prática, em muitos momentos, revelam as dificuldades de convivência. Os conflitos antigos, já esquecidos ou abandonados por falta de tempo para pensar, tudo fica muito claro ou revelado e potencializado por todas as dificuldades e incertezas que cada casal, ou família vem vivendo, no âmbito familiar e financeiro”, diz a psicóloga.
Já Neido comenta sobre alguns comportamentos que podem acontecer nesse período. “Existem três pilares básicos que estruturam um relacionamento; o desejo de ficar junto; a logística e a compatibilização pessoal”.
Conforme Neido, o desejo de ficar junto nasce quando o casal se conhece e se apaixona. A logística é toda a organização do cotidiano, lado da cama que dorme, contas a pagar, por exemplo. Enquanto a compatibilização pessoal é o esforço que cada um faz para alinhar suas diferenças com o outro.
“Esses pilares estruturarão um pilar principal representado por um ‘pacto de confiança’, que blinda o compartimento familiar, de um saber que pode contar com o outro. As grandes dificuldades estão representadas na administração da logística, que são os enfrentamentos do cotidiano. A logística não resolvida desestrutura os outros pilares, o desejo de ficar junto diminui e a compatibilização pessoal fica mais difícil”, explica.
O isolamento obrigatório aproximou os casais em tempo e espaço. “Essa condição impõe exigências à logística e expõem os conflitos não resolvidos. Não existe mais, aquele espaço de fuga que permite a evitação do conflito e tudo fica mais explícito. O resultado dessa exposição dependerá da sabedoria, maturidade dos casais e abrangência dos conflitos”, afirma o psicólogo.
Neido relata que o resultado pode ser aumento no tamanho, intensidade e frequência dos conflitos, até que se transformem em insolúveis, ou ao contrário, ajustamentos criativos que poderão enriquecer e fortalecer a convivência e o pacto de confiança do casal.
“Tem muitos casais que amadurecem com os conflitos e, ao invés de separar, fortalecem a relação. Não tem como falar que a quarentena vá provocar a separação, de repente, pode provocar separação para alguns, mas aproximação e fortalecimento para outros. Vai depender da grandiosidade do conflito, da maturidade do casal e de uma série de condições. Muitos casais hoje procuram ajuda profissional e isso dá suporte para eles”.
Outra questão que deve ser analisada é a impulsividade e agressividade. “Isso é um agravante. Qualquer atitude impulsiva é problemática porque não existe reflexão nem ponderação. A pessoa ultrapassa todos os limites e tem uma atitude impulsiva. A violência doméstica tem uma sequência, que vai desde violência psicológica, ameaça, moral até chegar em tipos de características mais contundentes. Não creio que a quarentena vá prejudicar mais. A violência é mais complexa, já existe em ambientes domésticos em algumas famílias”.
Por isso, a melhor solução quando nota-se que as discussões estão ultrapassando os limites, é se isolar num canto da casa e esperar a poeira baixar ou até mesmo trocar de assunto. “A evitação de um confronto sempre contribui bastante, pois com o passar do tempo a pessoa pondera e encontra soluções mais funcionais”.
“A ideia na vida de todos não é fazer não existirem problemas, mas sim que ganhar autonomia e sabedoria para lidar com os conflitos de forma que exista custo benefício adequado, como menor estresse e mais funcionalidade”, destaca o psicólogo.
Neido é otimista e crê que, com a aproximação, os casais encontrem soluções. “Vai ser um resultado positivo, não acho que vá causar mais problemas do que os que já existem”.
“O que sempre sugiro para os casais é que procurem aumentar o potencial de comunicação, e provocar com isso melhor entendimento do outro e mais empatia. O grande problema é que vivemos numa época na qual os casais já enfrentam dificuldade de comunicação entre os gêneros, de forma geral. Os homens têm dificuldade de entender e se comunicar com as mulheres que estão muito mais autônomas, e as mulheres apresentam dificuldade de se comunicar com o homem, ocorrendo o confronto e muitas vezes necessitam de orientação profissional, para que aprendam o caminho da prática da empatia da alteridade, tão necessárias para uma convivência estruturada, onde os problemas existem, mas são enfrentados com parceria”, conclui.
Serviços - Para quem está à procura de orientação ou de saber mais sobre os assuntos relacionados a casais, pode seguir Neido no Instagram @neidocastilhojunior. Por lá, ele realiza lives, faz posts e até tira dúvidas. Também tem informações no Instagram da psicóloga, Fernanda no @psiferbueno.
Curta o Lado B no Facebook e no Instagram. Tem uma pauta bacana para sugerir? Mande pelas redes sociais, e-mail: ladob@news.com.br ou no Direto das Ruas através do WhatsApp do Campo Grande News (67) 99669-9563.