ACOMPANHE-NOS     Campo Grande News no Facebook Campo Grande News no Twitter Campo Grande News no Instagram
JULHO, SEGUNDA  22    CAMPO GRANDE 22º

Comportamento

Terreiros saem pelas ruas com oferendas para lembrar Oxum e pedir respeito

Devotos levaram oferendas como flores, comidas ritualísticas e objetos sagrados até o Lago do Amor

Thailla Torres | 20/11/2017 07:45
Ato religioso das comunidades de terreiro acontece como presente ao orixá Oxum que habita as cachoeiras, águas doces e rios. (Foto: Marcos Ermínio)
Ato religioso das comunidades de terreiro acontece como presente ao orixá Oxum que habita as cachoeiras, águas doces e rios. (Foto: Marcos Ermínio)

Com frases sobre os presentes à divindade das águas, a música Karodô é repetida sem cessar durante o trajeto do terreiro até o Lago do Amor, em Campo Grande, neste domingo (19). A homenagem é um ato religioso das comunidades de matrizes africanas para um de seus orixás, Oxum, que na mitologia iorubá, é um orixá feminino, filha de Iemanjá e Oxalá.

O que antes era feito de maneira isolada, tornou-se um evento público, em sua terceira edição, das comunidades de Umbanda e Candomblé, contra todo discurso de ódio, intolerância religiosa e preconceito.

Em um trajeto de 2,5 quilômetros, os devotos de Oxum carregaram oferendas com flores, comidas ritualísticas e objetos sagrados até o lago, mas com a consciência de não depositar nada que afete o meio ambiente. “Porque o objeto da nossa crença é a própria natureza. Então, degradar não é nosso objetivo e não afetamos ela de maneira alguma”, reforça o dirigente da casa Ilê Dará, o balorixá Lucas de Odé.

Todas as casas levam suas oferendas, flores, comidas ritualísticas e objetos sagrados a Oxum. (Foto: Marcos Ermínio)
Todas as casas levam suas oferendas, flores, comidas ritualísticas e objetos sagrados a Oxum. (Foto: Marcos Ermínio)

O ritual começou no terreiro Egbe Omo Oni Ode, conhecido como Axé Pioneiros. No local, mulheres dançavam com roupas brancas e detalhes em amarelo, a cor de Oxum. Nessa parte da cerimônia, é proibido fotografar.

Do lado de fora, quando o trajeto começa, o que não falta é alegria nos batuques, danças e cânticos. O idealizador da manifestação religiosa é o pai de santo Edson Fernandes, que recebeu o apoio do professor Antônio Lino Rodrigues de Sá, da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul). Na instituição, ele ministra uma disciplina sobre Educação e Religião, que tem o foco, principalmente, no Candomblé e na Umbanda.

“Na universidade se abriu espaço, mas na sociedade ainda é uma questão que precisa ser rompida. Não é aceitar e sim respeitar que todo mundo tenha sua forma de manifestação”, explica Antônio.

Durante a caminhada, adultos e crianças se emocionaram. Sob olhares da vizinhança que filmava, aplaudia e sorria para mais um ano de caminhada, que desta vez, foi ignorada pela Polícia Militar e Agetran (Agência Municipal de Transporte e Trânsito) que não compareceram ao local para auxiliar o cortejo mesmo com o pedido formal feito à Prefeitura. Inclusive, 5 empresas que trabalham com equipamentos de som, que seriam utilizados na procissão, se recusaram a fechar contrato, ao saberem que o evento era realizado pela Umbanda e Candomblé.

Romilda, integrante do Movimento Negro em MS.
acompanhou o evento. (Foto: Marcos Ermínio)
Romilda, integrante do Movimento Negro em MS. acompanhou o evento. (Foto: Marcos Ermínio)
Famílias demonstraram a importância do respeito a religiosidade com alegria e amor. (Foto: Marcos Ermínio)
Famílias demonstraram a importância do respeito a religiosidade com alegria e amor. (Foto: Marcos Ermínio)

“Temos em mãos um documento com autorização para utilizar a via pública, mas ninguém nos acompanhou para ajudar na segurança dessas pessoas. Infelizmente é uma falta de apoio enorme”, lamenta o professor.

Integrante do Movimento Negro em Campo Grande, a educadora social Romilda Pizani, de 40 anos, quis acompanhar de perto. Para ela a cerimônia significa união diante de um cenário de retrocesso.

“Se não nos unirmos, esse retrocesso vai nos prejudicar enquanto consciência negra, e cultura de matrizes africanas. E reforçar sobre a religiosidade, principalmente em um estado como Mato Grosso do Sul, é importante”.

Como militante e as vésperas do Dia da Consciência Negra, celebrado hoje, o evento traz uma reflexão sobre as lutas das comunidades negras no País. “Nós somos o segundo país no mundo em número de pessoas negras e os avanços a essa população não acontecem efetivamente. E o mês vem para que a gente possa contribuir com que essa reflexão. E seguir essa manifestação é um extremo avanço, em pleno domingo à tarde, em um dos bairros mais populosos com roupas e adereços religiosos onde não há nenhum tipo de violência”, diz a educadora.

Na porta de casa, Cristina Goulart, de 47 anos, filmava tudo com o celular e se emocionou ao ver a procissão. Todo ano ela vem de longe até a casa do pai só para assistir a esse momento. “Moro lá na Julio de Castilho, mas venho aqui só para filmar. Eu já estava esperando porque é um momento muito bonito. E mesmo não seguindo a religião, acho que eles merecem respeito”.

Não faltaram sorrisos com roupas e adereços religiosos. (Foto: Marcos Ermínio)
Não faltaram sorrisos com roupas e adereços religiosos. (Foto: Marcos Ermínio)
Acompanhado de instrumentos, o cântico Karodo trouxe harmonia ao cortejo. (Foto: Marcos Ermínio)
Acompanhado de instrumentos, o cântico Karodo trouxe harmonia ao cortejo. (Foto: Marcos Ermínio)

O mesmo fez Sintike Queiroz, de 22 anos, que não pertence a nenhuma religião, mas foi em busca de compreensão. “Vejo a seriedade e o respeito deles a todas as pessoas. E acho que só conhecendo de perto, para romper com o preconceito e respeitar as religiões. Venho e conto o que vejo para as pessoas com o propósito de passar a informação correta”.

Depois de 1 hora e meia de caminhada, a passos tranquilos, a entrega nas águas do Lago do Amor, foi o momento mais bonito. O grupo usou um barco para deixar as oferendas, de flores, na água. Com fogos de artificio e batuques que continuaram a ecoar na beira do lago, a cerimônia terminou com alegria e emoção para quem acredita que a partir de momentos como esse é possível acabar, ao menos um pouco, com a intolerância.

Iniciativa – E já tramita na Câmara Municipal de Campo Grande, um projeto de lei do vereador William Maksoud (PMN) que inclui no calendário oficial do município o dia 20 de novembro como data de comemoração ao Presente de Oxum.

Para um evento que acontece há 3 anos, isso representa a resistência e a busca para exaltar o respeito as comunidades de terreiro. “Poucos ainda fazem questão, hoje foi um dia difícil para conseguir apoio. Então é preciso se unir, exercitar a fé e mostrar que nossa religião é aberta, sem distinção de raça, cor ou orientação sexual. Nossa felicidade é saber que a comunidade religiosa vem conseguindo se unir, mas a triste é todo dia saber que tem uma sociedade que ainda nos massacra”, finaliza o pai de santo Edson.

Confira a galeria de fotos da cerimônia.

Cerca de 500 pessoas participaram do Presente de Oxum em um trajeto de 2,5 km. (Foto: Marcos Ermínio)
Cerca de 500 pessoas participaram do Presente de Oxum em um trajeto de 2,5 km. (Foto: Marcos Ermínio)

Confira a galeria de imagens:

  • (Foto: Marcos Ermínio)
  • (Foto: Marcos Ermínio)
  • (Foto: Marcos Ermínio)
  • (Foto: Marcos Ermínio)
  • (Foto: Marcos Ermínio)
  • (Foto: Marcos Ermínio)
  • (Foto: Marcos Ermínio)
  • (Foto: Marcos Ermínio)
  • (Foto: Marcos Ermínio)
  • (Foto: Marcos Ermínio)
  • (Foto: Marcos Ermínio)
  • (Foto: Marcos Ermínio)
  • (Foto: Marcos Ermínio)
  • (Foto: Marcos Ermínio)
  • (Foto: Marcos Ermínio)
  • (Foto: Marcos Ermínio)
Nos siga no Google Notícias