Em corredor de 6 m², João não quer parar de cortar cabelo a R$ 5,00
Ele atende homens e mulheres pelo mesmo preço, mas há regras quanto ao corte e no salão minúsculo não pode faltar MPB
Arrumando a tesoura e o pente que ficam sob uma bancada estreita, o cabeleireiro João Barros Nascimento Vasconcelos, de 47 anos, cantarolava Beto Guedes, à espera de algum cliente. O que ele não esperava era dar de cara com a reportagem na sua porta, curiosa pelo corte de cabelo a R$ 5,00 e a história de quem sobrevive num corredor tão pequeno, na Avenida Tamandaré.
O preço não é tão incomum, há cortes com o mesmo valor para homens no Centro. Mas o sorriso solto e a cantoria de João despertaram olhares, especialmente, por gostar do seu salão “dos sonhos” em apenas 6 m². “Aqui eu faço cabelo, sobrancelha e a listrinha (desenho na cabeça usando uma máquina) por R$ 5,00. Mas não tenho ganância de ganhar dinheiro não”, explica sobre o preço que ele jura que não mudar até o fim do ano.
Apesar da vantagem de um corte tão barato, ele diz que o preço já criou desconforto na concorrência. “Tem gente que não gosta, acha que é injusto eu cortar tão barato. Mas não quero prejudicar ninguém, esse é o valor que eu consigo sobreviver”.
Ao contrário de outros salões, ali ele também atende as mulheres, mas com regras. “Não faço repicado e nem cortes para deixar o cabelo grande. Faço cortes curtinhos nas meninas. Elas também gostam de listrinhas e o cabelo bem curto, igual aos homens, está na moda”.
O que também chama atenção no salão é o ambiente. O corredor é estreito com apenas espelho, bancada e uma cadeira do lado de dentro. Quem quiser esperar precisa sentar nas cadeiras que ele deixa disponível do lado de fora. Um frigobar pequeno no canto reserva a água gelada e caixinha de som o MPB. “Só escuto música brasileiras, às vezes, rock, mas prefiro a MPB. Meus clientes sempre vão escutar uma música boa”.
João é do tipo sorridente enquanto fala, mas ao falar do passado e do futuro, o sorriso se mistura com a timidez. “É uma longa história”.
Nascido no Pará, João chegou em Mato Grosso do Sul há menos de um ano para viver um grande amor. Com os olhos emocionados, ao mesmo tempo que exibe o alvará expedido pela Prefeitura, ele revela a certidão do casamento realizado nos últimos meses. “Nos casamos e em breve iremos viver juntos”, diz.
E é com R$ 5,00 que ele almeja edificar os próprios sonhos. “Quero fazer um cantinho só meu, ter as minhas coisas, de um jeito simples, mas do jeito que eu gosto”.
Ele não se arrepende de ter deixado tudo para trás e encarado uma vida em Mato Grosso do Sul. “Tem gente que acha isso loucura, mas eu não tive problemas. Há muito tempo queria mudar do Pará, quando conheci a pessoa certa, não tive medo”.
Ele já foi vigilante e há 8 anos se dedica ao corte de cabelo. Logo que chegou na cidade fez outro curso para ter um certificado no Estado. Agora, seu único desejo é garantir o aluguel do corredor pequeno e guardar as economias para ter uma casa. “Gosto daqui e sinto que não preciso ter um lugar maior. No Centro, o aluguel de um espaço como esse é muito caro, por isso, escolhi trabalhar em um bairro. Mas já tenho clientes fiéis”.
Todos os dias ele atende uma média de 20 clientes. Aos sábados, especialmente no início do mês, o número de atendimentos dobra. “Dá para sobreviver e investir as economias. É o suficiente pra mim”.
O salão funciona de segunda a sábado, das 7h30 as 18h, na Avenida Tamandaré, 476, Vila Planalto.