Em Campo Grande, Feliciano é recebido por defensores com “glórias” e “aleluias”
Apesar dos 10 condicionadores de ar ligados, o calor dentro do templo da ADM (Assembleia de Deus Missões) do bairro Amabaí, em Campo Grande, estava insuportável na tarde deste sábado (19). Era entrar, permanecer alguns minutos e sair “lavado”.
Mesmo assim, cerca de 6 mil pessoas, segundo estimativa da assessoria de comunicação, suportaram, em nome da fé, mais de duas horas dentro do “forno” para ouvir a pregação do deputado federal e pastor Marcos Feliciano, que esteve na cidade para 23ª Escola Bíblica, realizada de 17 a 20 de abril.
O evento atraiu gente de várias igrejas da Capital, algumas até de outras denominações. Como o público foi superior à média de 4 mil, os organizadores precisaram disponibilizar um terreno extra, à direita da Assembléia, para que todos pudessem acompanhar a pregação, transmitida ao vivo em telões e televisões.
Quem buscava se sentir mais à vontade tinha à disposição barracas para comprar coxinha, esfiha, bolo, cachorro-quente, entre outros salgadinhos. Foi uma verdadeira preparação para a vinda do “homem de Deus”, como a maioria costuma se referir.
Marcos Feliciano chegou por volta das 15h, enfiado em um terno preto e dentro de um carro de mesmo tom, que entrou pela lateral esquerda. O deputado não falou com a imprensa e, já no altar, foi recebido com “glórias” e “aleluias”.
Respondeu o carinho repetindo outro “aleluia”, cumprimentou os fiéis com “a paz do senhor”, comentou que, quando recebeu o convite para a pregação, pensou se tratar de uma pegadinha e, na sequência, anunciou a leitura do capítulo 10 do livro de Daniel.
Antes disso, no fundo, alguém gritou: “Manda fogo, Jeová!”. À frente, no púlpito, Feliciano respondeu: “Jesus, com esse calor, se cair fogo, a gente está frito”. Alguns riram, enquanto outros continuaram compenetrados.
A “exortação” dos versículos começou de maneira habitual, em voz branda com alterações sonoras perceptíveis ao longo do discurso que, aliás, ficou muito mais impactante com a sonoplastia feita ao vivo por um tecladista.
O instrumental variava de acordo com o tom do orador, ora compassado e melódico, ora frenético e aterrorizante, como em uma trilha sonora de suspense. Marcos Feliciano, que tinha como tema “A sinergia cristã influenciando uma cultura emergente”, pediu, logo no início, que os fiéis que deixassem de ser “membros de banco” e se tornassem mais ativos como ele, que enfrentou os poderosos, mas foi perseguido. Perseguido, explicou, porque defende os valores morais e preserva a família tradicional.
“Eu li a bíblia mais de 30 vezes e prego o evangelho desde os 13 anos. Tenho 40 anos e já ministrei em 73 países. Entendo disso, de fé, e sei do que Deus é capaz”, bradou.
O pastor, que deixou a Comissão de Direitos Humanos em dezembro de 2013, aproveitou o momento para abordar – e esclarecer - algumas polêmicas já conhecidas. Comentou sobre as “descobertas” dos projetos que, nas palavras dele, ferem a igreja, falou do PL122, mencionou a presidente Dilma Rousseff e disse, também, que só assumiu o cargo na Comissão porque foi Deus quem o colocou lá dentro.
“Deixei o Brasil de cabelos arrepiados”, afirmou, logo depois de dizer que “a falta de coragem de algumas parlamentares é de doer os ossos”. No final, cantou e chegou a citar uma frase do pastor protestante e ativista político dos Estados Unidos, Martin Luther King: “O que me preocupa não é o grito dos maus, mas o silêncio dos bons”.
Os fiéis, dentro e fora da igreja, se mostraram, durante todo o momento, completamente envolvidos pelas palavras do pastor. Jovens, idosos, crianças e famílias inteiras não desgrudavam os olhos do altar, das TVs e dos telões.
Batizada desde 2007, a vendedora Aline Mendonça Gonçalves, de 20 anos, disse que foi ao evento porque Feliciano “é assembleiano, tem uma palavra boa e uma pregação excelente”.
Para a jovem, as críticas em cima do pastor, taxado de homofóbico, não tem fundamento. “Se você lê na bíblia, você vê que Deus não tirou a costela do homem para fazer outro homem”, citou, ressaltando que não tem preconceito, mas acredita que o “conceito” da homossexualidade é errado. “Ele fala da verdade”, elogiou.
E é por falar a verdade que o deputado, na visão de Aline, é tão atacado. “Ele é o único que luta pela família que Deus colocou no mundo, a tradicional, homem e mulher”.
Entre os membros da ADM, o discurso se repete porque, na boca da maioria, Feliciano é um “homem de Deus”. Criticar sua conduta, mostrar outro ponto de vista e levantar hipóteses de charlatanismo, por exemplo, é fazer ataques pessoais. Os mais temerosos preferem nem entrar em polêmicas.
Para a cozinheira Elaine Ribeiro, de 31 anos, que estava na igreja desde às 7h, as críticas só partem de “pessoas que não tem Deus, não conhecem a palavra, não tem entendimento e tem a mente fechada”.
Pastor da igreja central, Adriano Monteiro, de 42 anos, pensa de maneira semelhante e, sobre os homossexuais, já tem a resposta na ponta da língua: “Temos vários fieis que eram gays, mas deixaram essa vida de homossexual e hoje são casados, tem filhos...”.