Com troca de tiros de brincadeira, prédio inacabado vira cenário de guerra fake
O aviso na porta de entrada deixa bem claro aos curiosos o risco de acidentes. A área é utilizada para prática esportiva, é proibida a entrada sem autorização e muito menos sem equipamentos de segurança. O prédio inacabado de seis andares, na Vila Planalto, em Campo Grande, é a central de combate do grupo de Air Soft "Skull", mas pode ser invadida por inimigos, ou local de missão, como a captura de um notebook que contém endereços de ações terroristas.
O esporte é encarado por este grupo, formado há um mês, como brincadeira. Empresários, advogados, policiais e outros tantos profissionais se encontram todo domingo, a partir das 2h da tarde, para o que eles chamam de "partida". Dividido em equipes, conforme o número de participantes, o exercício vira válvula de escape e onde a lealdade é quem dita as regras do jogo.
Neste final de semana o Lado B encarou uma pequena participação na partida. De início, ocupando uma área que eles denominam de "safety zone", ou seja, área de segurança, onde ninguém vai entrar atirando. E depois, virou personagem em uma das missões.
O jogo é semelhante ao paint ball, praticado com armas que disparam balas de plástico redondinhas. A diferença está na honestidade. Como não tem tinta na história, quem for atingido deve admitir em alto e bom som "morto" e sair do combate.
Segundo o relações públicas do grupo, o jornalista Rodrigo Maia, o "Air Soft" surgiu como opção pós-guerra para treinamento dos japoneses, mas sem armas de verdade. "Inventaram armas elétricas ou a gás. Na realidade toda arma que existe, tem uma versão air soft", explica Maia.
Na Capital existem em média cinco grupos de Air Soft. Criador do "Skull", o empresário Nelson Lopes Júnior, de 40 anos, explica que o jogo tenta ser próximo, o máximo possível, de um combate militar. Coloquialmente falando, na tarde de domingo é que se consegue por a raiva para a fora e "matar" o estresse da semana.
Devidamente paramentados como militares, de farda, arma em punho e principalmente o equipamento de segurança, começando pelos óculos, colete e luvas, eles dividem as equipes e tornam pública a missão. Como o Lado B estava por lá, o objetivo de um grupo era de "tomar" a repórter e o outro, precisava protegê-la.
Antes que os tiros comecem, todos rezam pedindo bençãos não só ao jogo, como também aos familiares e amigos de todos ali presentes. De fora, para quem nunca viu uma partida da modalidade, é a hora de dizer um "amém" com ênfase, porque é de dar medo.
"Lembrando que quem se machucar de verdade, é para gritar 'alfa' que nós temos um enfermeiro que tem todo conhecimento para amenizar", instrui Nelson. No caso da palavra ser dita, o jogo é interrompido e o socorro necessário é prestado. Por sorte, ninguém gritou "alfa" enquanto estivemos presentes.
Dividida a equipe, subimos até o segundo andar. Estrategicamente posicionados, o silêncio predomina até que movimentos rápidos culminam em tiros. Do lado de lá, alguém grita "morto", mas tudo acontece tão rápido e com precisão de experientes que a gente não consegue saber quem atirou e nem tampouco quem foi atingido.
Na segunda vez, incluída na partida, fui paramentada com óculos, lenço, boné, colete e uma pistola a gás. Anteriormente até tentaram me passar o básico para se acertar o alvo, mas foi quase em vão. Nunca havia manuseado uma arma nem de brinquedo.
O primeiro grupo que me dava a proteção quando a missão era de "tomar" a repórter se saiu bem. Conseguiu eliminar os adversários, mas quando houve a troca de turmas, fui pega. Sem violência e também sem dar nenhum um tiro se quer.
O exercício exige concentração, principalmente observação dos movimentos do "inimigo". A farda é quente, a arma chega a pesar para os inexperientes como eu, mas o jogo prende a atenção. Entre o sobe e desce de escadas, lembrando que o prédio de combate tem seis andares, é uma tremenda de uma ginástica.
Numa sessão "mata-mata", o jogo chega ao fim quando um dos lados já eliminou os adversários. Praticado semanalmente, por no mínimo 2h30, dá para sair de lá bem cansado.
Adepto do Air Soft há pouco mais de um mês, Marcel dos Santos Nobre, de 39 anos, é o enfermeiro-chefe da prefeitura e quem deve prestar os primeiros socorros no caso de alguma situação fugir do controle. "É uma atividade de lazer e se for de ordem regular, consegue controlar o estresse. É preciso saber trabalhar em equipe", explica.
Praticando de Jiu-Jitsu, ele também vê a modalidade como exercício, principalmente para começar a semana mais relaxado. "E não é só o jogo em si, mas o convívio e depois melhora o seu condicionamento físico, a gente acaba cansando menos", aponta.
O grupo aceita novos praticantes, no entanto é preciso investir na compra de equipamentos de segurança, da farda e de armas. De início, eles até emprestam parte do material, como o óculos, essencial na prática. Até durante a entrevista mantive os óculos.
"Para você ter uma ideia os equipamentos utilizados são vinculados à Lei Federal. Precisa ter autorização do Exército para usar", deixa claro Nelson. A regra básica é que o participante tenha acima de 18 anos e para o uso de equipamento de gás, ter registro e autorização. Até para o transporte tem regras: é obrigatório portar a nota fiscal e que a arma esteja dentro da caixa e no porta-malas.
"Somos mais como um grupo de amigos. O intuito da partida é brincar, é diversão, válvula de escape e desestressar", resume Nelson.
Quem quiser participar precisa ter em mente que o investimento, incluindo farda, itens de segurança e armas, é uma média de R$ 1,8 mil. O grupo não cobra mensalidade e o contato para se "alistar" é o 9995-5000 ou 9922-1506.