Quibe cria discórdia e restaurantes brigam por causa de direitos autorais
Algumas camadas de quibe cru, quibe assado, coalhada, uma cebola magnífica e por aí vaí a receita do kibe montado ou Kibe Sainte Marie. A iguaria é tradicional no restaurante Sainte Marie de São Paulo e é reproduzida pelo irmão do “chef criador”, que reside em Campo Grande, Paco Kawijian, do restaurante Yallah.
Tudo continuava em harmonia até que outro restaurante da cidade, o Al-Wadi decidiu incluir o prato no cardápio. Foi então que a guerra se instaurou. Paco se considera um representante e defensor da receita do irmão, Stephan Kawijian, e reclamou nas redes sociais da atitude antiética do Al-Wadi, que não teria pedido autorização para reproduzir o prato.
“Está havendo falta de ética. Isso não nos afeta, mas eu como representante desse prato, de um restaurante conhecido em São Paulo, devo zelar pela imagem”, afirma.
A reportagem do Lado B procurou o restaurante Al Wadi para falar sobre o ocorrido, que se limitou a responder que para eles “o assunto já foi dado por encerrado por nós. Não queremos mais polêmicas”. Em nota na página, o estabelecimento reafirmou a autoria do prato frisando ser de Stephan Kawijian.
“Hoje existem diversos restaurantes e até mesmo sites de culinária que reproduzem este maravilhoso prato. O primeiro restaurante a trazer este kibe para Campo Grande, foi o Yallah. Felizmente devido a excelente aceitação do Kibe montado, outros restaurantes incluíram este prato em seus cardápios, até mesmo nós do Al Wadi. Não existe plágio se tratando de comida, cada um usa o seu tempero, seu toque especial e único. Nunca um prato será igual ao outro”, frisaram em nota publicada no Facebook no dia 5 de fevereiro.
De acordo com Paco, copiar receitas é um problema nacional, com vários exemplos pelo país e principalmente em Campo Grande. O chef frisa que ao menos um pedido deveria ser feito ao criador do prato. “Se queremos ser considerados um estado sólido em termos de gastronomia devemos agir de acordo", acredita.
Com tantos argumentos dos dois lados, a dúvida que paira no ar é se uma receita pode ser protegida e se tornar exclusiva de um chef ou estabelecimento por meio de uma registro.
Em busca de uma luz conversamos com o chef premiado nacionalmente Paulo Machado, que por sinal também é formado em direito, sobre como proceder nesses casos.
“Muitas receitas são de domínio público, como a moqueca capixaba e o arroz carreteiro. São receitas que há muito tempo fazem parte da cultura do país, já algumas são um segredo, como o Pastel de Belém, que o modo de preparo é guardado a sete chaves e até a fórmula da Coca-Cola”, indica o chef.
De acordo com Paulo, o chef pode pedir o registro da receita no INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial), mas mesmo assim provar a autoria é complicado.
“No caso de receitas, no entanto, é difícil provar a autoria porque a receita precisa estar registrada em órgãos e ainda provar judicialmente que foi ele quem criou as receitas. Como advogado posso afirmar que o processo seria longo e teria um custo”, ressalta.
O que vale no meio é a política da boa vizinhança, ou seja, pedir a autorização do chef criador da receita ou mencionar as inspirações para o preparo do prato.
“De qualquer forma, por mais há cópias do Pastel de Belém, que alguns afirmam que são melhores até que o original, as pessoas sempre terão curiosidade de provar o original, o primeiro”, acredita Paulo.