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Meio Ambiente

Desmatamento do Cerrado sul-mato-grossense volta a avançar após anos em queda

Bioma perdeu mais 294 km² de sua vegetação nativa em 2019, quase uma Belo Horizonte (MG)

Jones Mário | 05/06/2020 13:57
Monitoramento por satélite ajuda PMA no combate ao desmatamento no Estado (Foto: Divulgação/PMA)
Monitoramento por satélite ajuda PMA no combate ao desmatamento no Estado (Foto: Divulgação/PMA)

Presente em dois terços do território sul-mato-grossense, o Cerrado perdeu 294,3 km² de sua cobertura vegetal no Estado só em 2019. O número, equivalente a 89% da área de Belo Horizonte (MG), prova que o desmatamento do bioma voltou a avançar após quatro anos consecutivos de quedas. Hoje, 5 de junho, é celebrado o Dia Mundial do Meio Ambiente.

O aumento preocupa pesquisadores do Cerrado, que apontam para afrouxamento na fiscalização, flexibilização da legislação ambiental e legitimação do desmate pela conduta de agentes à frente dos órgãos governamentais de Meio Ambiente no País.

Conforme dados do Prodes, plataforma de monitoramento do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), a derrubada de vegetação nativa de Cerrado cresceu 13,9% no ano passado, se comparado com 2018. Os números seguiam tendência de reduções desde 2016.



Mato Grosso do Sul figurou na oitava colocação do ranking de estados que mais desmataram no exercício anterior. A lista foi encabeçada pelo Tocantins, que, segundo o Inpe, derrubou 1.495 km² de Cerrado em 2019.

“O governo federal tem tirado fiscais, perdoado multas, sinalizado para as pessoas que, hoje, quem quiser aumentar pasto e lavoura, pode fazer”, avalia o doutor em Biologia Vegetal e professor da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), Geraldo Damasceno Júnior.

“São as fronteiras agrícolas que estão sendo ampliadas e os critérios estão muito frouxos. A a coisa está rolando solta”, continua.

Vigente até maio deste ano, quando perdeu a validade por não ter sido votada pelo Congresso, a MP (Medida Provisória) 910/2019 exemplifica o que o Damasceno Júnior chama de afrouxamento. A norma previa que terras da União ocupadas até 2014 poderiam ser regularizadas. Antes, o prazo máximo era 2008.

O impasse no Congresso se deu a partir da avaliação de opositores de que a medida facilitaria a grilagem e anistiaria desmatadores.

Professor da UFMS, Danilo Ribeiro avalia que fiscalização esfriou e presença do Estado é deficiente (Foto: Projeto Noleedi)
Professor da UFMS, Danilo Ribeiro avalia que fiscalização esfriou e presença do Estado é deficiente (Foto: Projeto Noleedi)

O doutor em Ecologia e também professor da UFMS, Danilo Bandini Ribeiro, crê que, embora os efeitos da MP 910 já tenham perdido validade, normas como esta contribuem para legitimar a prática de crimes ambientais.

“Anistiando um crime ambiental, a pessoa se sente no direito, se sente empoderada em desmatar”, analisa Ribeiro, coordenador do projeto Noleedi, que estuda o manejo do fogo no Cerrado e no Pantanal, na Terra Indígena Kadiwéu.

Em reunião ministerial cujo vídeo veio a público após autorização do STF (Supremo Tribunal Federal), o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, prega diante do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) que, com a pandemia de covid-19 no centro da agenda, é hora de “passar a boiada”. O titular da pasta se referia à normativas que flexibilizam a legislação de proteção ambiental.

Fiscalização - Chefe da comunicação da PMA (Polícia Militar Ambiental), o tenente-coronel Ednilson Queiroz detalha que a força de segurança atua na prevenção, com patrulhamento ostensivo no perímetro rural de Mato Grosso do Sul, e também a partir de denúncias.

Ele destaca o uso de imagens de satélite como ferramenta importante para flagrar áreas degradadas. Nestes casos, a PMA consegue identificar degradações cometidas em anos anteriores ao da autuação. Em 2019, a PMA aplicou R$ 5,9 milhões em multas por desmatamento.

Polícia ambiental aplicou R$ 5,9 milhões em multas por desmatamento no ano passado (Foto: Divulgação/PMA)
Polícia ambiental aplicou R$ 5,9 milhões em multas por desmatamento no ano passado (Foto: Divulgação/PMA)

O superintendente do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) no Estado, Luiz Carlos Marchetti, revela que 80% da atuação dos fiscais no Estado é voltada para conservação do Pantanal e da Mata Atlântica.

Segundo Marchetti, a supressão vegetal do Cerrado, autorizada ou não, fica sob o guarda-chuva do Imasul (Instituto do Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul). A reportagem ligou para o diretor-presidente do órgão, André Borges, que não atendeu ou retornou.

Danilo Ribeiro crê que não só a fiscalização esfriou, mas também a presença do Estado nas áreas mais afastadas da zona urbana. “Muitas vezes o fazendeiro quer fazer a coisa certa, mas não tem um suporte do governo, uma orientação”.

Prejuízos - No segmento ambiental, o avanço do desmatamento do Cerrado no Estado dizima “compostos medicinais que, quem sabe, poderiam ser alternativas para cura ou tratamento da própria covid-19”, ressalta Geraldo Damasceno Júnior.

Cerrado se esparrama por dois terços do território sul-mato-grossense (Foto: Reprodução/Google)
Cerrado se esparrama por dois terços do território sul-mato-grossense (Foto: Reprodução/Google)

Já para Ribeiro, além de processos erosivos a longo prazo, que pioram a qualidade da água e provocam assoreamento dos rios, o prejuízo econômico pode chegar mais cedo, na forma de embargos sobre as commodities produzidas à sombra do desmate.

“A curto prazo, estamos vendendo essa imagem de que o Brasil é um país que não se importa com o Meio Ambiente, o que pode fazer com que alguns países parem de comprar daqui. Isso vai diminuir os valores das nossos commodities, diminuir o número de empregos, salários”, projeta.

Nesta semana, o parlamento holandês aprovou moção contra a ratificação do acordo comercial firmado entre o Mercosul e a União Europeia no ano passado, sob o argumento de que desmatamento na Amazônia corre o risco de crescer com a parceria.

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