Temporada recorde de chuvas em Campo Grande prejudica hortifrútis
Trabalhadores relatam dificuldades e prejuízos de até R$ 30 mil por mês, por conta dos efeitos climáticos
Com o período recorde de chuvas em Campo Grande, trabalhadores de hortifrútis têm relatado série de dificuldades causadas pelos efeitos climáticos. Em estabelecimentos ouvidos pela reportagem, a dificuldade no processo de plantação já provocou prejuízo financeiro de até R$ 30 mil.
Segundo dados do Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia), analisados pelo Campo Grande News, a parcial de chuvas registradas entre 1º de janeiro e 15 de março, em 2023, é a maior desde 2010, conforme estação meteorológica de Campo Grande.
O acumulado de precipitações neste período é também o sétimo maior desde o início da medição do órgão, em 1961.
No Bairro Tiradentes, Hortifrúti estima prejuízo de R$ 30 mil, em um mês, em decorrência da situação. Um dos funcionários, Liniker Aquino, de 32 anos, observa que há chuvas mais fortes, com ventos e gotas grossas, que acabam impactando diretamente nas plantações. “Essa chuva forte acaba com a horta, não tem como plantar. Há outras leves e contínuas que não atrapalham tanto”.
Segundo ele, neste mês, chegaram a ficar uma semana sem conseguir plantar nada, o que gerou o prejuízo. Antes disso, já tinham ficado um intervalo de 20 dias. Por conta do tempo nublado, verduras como as alfaces se adaptam, criando caules mais longos, e estragam mais facilmente. “O caule cresce para tentar pegar sol e a alface fica pior, perdemos muitas”.
No caso da alface-americana, com essas muitas chuvas, os pés ficam úmidos e quando vem o sol, acaba ‘cozinhando’ as folhas. As alfaces que durariam para uma semana acabaram em dois dias, porque o plantio não rendeu”, explica Liniker Aquino.
A água também se acumula na terra, dificultando o crescimento e impedindo a ação dos adubos. “Quando chove, a terra fica úmida, nós plantamos e o broto não consegue respirar. Então precisamos fazer um trabalho de afofar a terra, com madeiras, para colocar a plantinha e ela absorver o adubo. O problema é que com as fortes chuvas, acaba-se lavando este adubo”.
Ele comenta que um saco de 50 quilos custa em torno de R$ 250 e poderia ser usado por duas semanas. Contudo, com as chuvas, a proporção fica incerta. “Tem que racionar, se você joga bastante, tem o risco de perder todo o saco de adubo. Tem que medir para não ter mais prejuízo”, explica Liniker.
“Na semana passada, olhei a previsão no Google, estava com baixas chances de chuva, e usei quase um saco de adubo. Quando choveu, perdi tudo”.
Expectativa - “Neste ano, o clima está diferente. Geralmente depois de fevereiro, a gente já estaria com mais mercadorias, mas já temos prejuízos de chuvas desde novembro”, relata Liniker. Segundo ele, neste mês, já era esperado o lucro com a horta, o que não veio até agora.
Por se tratar de um local alugado, os funcionários avaliam não compensar realizar a instalação de coberturas, por exemplo. Além disso, comprar verduras do Ceasa (Central de Abastecimento) também está fora de cogitação, já que o lucro é praticamente nulo.
“A alface envelhece com as chuvas e, dependendo, as rúculas também rasgam. A couve dá para plantar, mas leva três meses, então nem plantamos, por medo de perder tudo. Um vizinho parou de plantar folhas e está só plantando berinjela e quiabo, que são mais resistentes”.
No mesmo bairro, na Rua Nicomédes Vieira de Rezende, Sérgio Aparecido de Souza, de 47 anos, trabalha há oito anos no ramo, onde planta alface, rúcula, cheiro-verde, hortelã, agrião e chicória. Ele explica que a Quitanda e Horta do Sérgio vive situação semelhante. “Eu nunca tinha pego um ano assim”, comenta.
“É a primeira vez em que pego uma temporada de chuvas sem parar e sem dar chances da gente ganhar dinheiro”, lamenta o proprietário, que aumentou o preço da alface de R$ 5 para R$ 7 o pé.
Segundo Sérgio, a chuva alaga as plantações e apodrece as raízes, além de “lavar” o adubo. Se continuar a chover desta forma, ele estuda colocar uma cobertura com sombrite em cima da plantação, ou uma lona transparente.
A terra apodrece e a produção de alface fica escassa”, descreve Sérgio Aparecido de Souza.
O proprietário relata que muitas verduras vêm de municípios de São Paulo para Campo Grande, para abastecer os estabelecimentos da Capital, mas que a produção local tem sofrido. “Isso acontece porque o pessoal que lá tem o apoio das prefeituras, aqui não temos. Nem com os prejuízos e nem para implementar outras estruturas”.
“Desde o começo do ano, tive um prejuízo de uns R$ 15 mil. Você vai trabalhar na terra e não tem como, porque ela fica encharcada. O bom é que tenho funcionários que estão tentando me ajudar, batendo a terra, mas ainda assim, ficamos na aflição. Todos os dias, olho a previsão do tempo para ver se melhora", finaliza.