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O momento

Heitor Rodrigues Freire (*) | 01/08/2021 16:00

A vida é feita de momentos. Momentos que vivemos, muitas vezes, no piloto automático, sem perceber e avaliar verdadeiramente o que está acontecendo. A rotina do dia-a-dia, muitas vezes, nos impede de agir conscientemente. E assim, vamos tocando o barco. Querendo que tudo transcorra de maneira que não exija grandes esforços de nossa parte.

Mas, na realidade, tudo está mudando a cada momento. A única coisa imutável em todo o Universo é a mudança, como ensinou Heráclito de Éfeso, há mais de 2.500 anos.

A velocidade com que tudo acontece e é divulgado pela mídia nos mostra que fazemos parte daquilo que já se denominou com muita propriedade de aldeia global. E esse avanço tecnológico contribuiu e muito para a disseminação dos boatos, desmascarando uma faceta da personalidade humana que domina as ações, comandada pelo ego, privilegiando a inveja, o ódio, o preconceito, radicalizando posições, esfacelando em grande parte a unidade familiar e a amizade.

A ausência de uma visão vertical nos impede de ter uma avaliação correta do verdadeiro sentido da vida: a participação consciente, do aprendizado constante, do trabalho profícuo e permanente para nossa evolução mental e espiritual. A horizontalidade em que se encontra a maioria da população não permite a verdadeira percepção, e assim vai-se passando pela vida sem vivê-la, de forma a não se conseguir entender o verdadeiro significado da encarnação.

A disseminação do medo em relação ao vírus da Covid-19 paralisou as ações. Mas o vírus também passará. Pode demorar, mas passará. É bem verdade que vai deixar um rastro de consequências nefastas, dependendo da maneira com que encararmos esta situação, mas passará.

Nada acontece por acaso. Tudo tem seu lado bom e seu lado ruim. Depende de olhar de forma imparcial e serena. E saber tirar proveito de cada situação.

A atual pandemia está a nos proporcionar a possibilidade de nos tornarmos seres imperturbáveis, invulneráveis. Basta que se busque a força interior e trabalhemos pela transformação, para que nossa paz e felicidade não dependam do exterior. É o momento de nos voltarmos para Deus, de seguir os ensinamentos de Jesus: “Pedi e vos será dado, buscai e achareis; batei e vos será aberto”.

Se pararmos de ver problemas e começarmos a ver oportunidades, poderemos aproveitar para realizar o nosso crescimento espiritual. É o momento de dedicar um tempo para a meditação e a oração, voltando-nos para o nosso interior, convivendo de forma verdadeira com nossa consciência, que é a fonte de todo aprendizado e evolução. Tempo de descobrir a beleza da vida e do momento presente.

Como é bom quando começamos a entender o que realmente está acontecendo. De repente um pequeno vírus, invisível aos nossos olhos, transforma tudo. Os poderosos do mundo também estão perplexos, confusos, desorientados, sem saber onde encontrar apoio para dar curso às suas iniquidades. A arrogância cedeu lugar à perplexidade. Tudo mudou.

Acredito que seja tempo de desenvolver a aceitação. "Tudo o que acontece é perfeito, e se existe e acontece é porque tem um propósito". Esta afirmação está muito bem retratada no poema “Instantes”, erroneamente atribuído ao grande poeta argentino Jorge Luís Borges (1899-1986), mas provavelmente foi escrito pela escritora norte-americana Nadine Strain (1892-1988), apesar de não haver evidências concretas sobre isso. A versão mais antiga de que se tem registro foi publicada em 1935 por Don Herald, um cartunista norte-americano, que também poderia ser o autor. Talvez o fato de o poema ter sido publicado com muito sucesso numa revista argentina nos anos 80 e depois ter sido divulgado mundo afora, tenha causada a associação ao nome de Borges.

Reproduzo aqui uma parte dele:

“Eu fui uma dessas pessoas que viveu sensata e

produtivamente cada minuto da vida: claro que tive momentos

de alegria. Mas, se pudesse voltar a viver, trataria de ter

somente bons momentos. Porque, se não sabem, disso é feita

a vida, só de momentos; não perca o agora. Eu era um desses

que nunca ia a parte alguma sem um termômetro, uma bolsa de

água quente, um guarda-chuva e um para-quedas; se voltasse

a viver viajaria mais leve.

Se eu pudesse voltar a viver, começaria a andar descalço no

começo da primavera e continuaria assim até o fim do

outono. Daria mais voltas na minha rua, contemplaria mais

amanheceres e brincaria com mais crianças, se tivesse outra

vida pela frente. Mas, já viram, tenho 85 anos e sei que

estou morrendo”.

Sem dúvida, melhores momentos virão e permanecerão. Depende só de nós mesmos.

Heitor Rodrigues Freire(*) – Corretor de imóveis e advogado.

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