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Perfil de pacientes com história de evasão

Ester de Melo Borba (*) | 31/07/2021 14:30

Pacientes internados em hospitais estão expostos a diversos riscos, que podem provocar danos à sua saúde e à sua integridade física e mental. É responsabilidade dos profissionais de saúde, no que tange à segurança de pacientes, evitar tais desfechos.

A evasão é a saída de pessoas internadas não comunicada e não autorizada pelo médico e/ou profissional de saúde de uma área designada para tratamento. Esse tipo de evento adverso tem sido evidenciado de forma recorrente no ambiente hospitalar, o que demanda a necessidade de se investigar sobre esse tema e buscar alternativas para evitar que os pacientes desistam do tratamento proposto pelos profissionais de saúde.

As consequências de uma evasão hospitalar podem ser graves: automutilação, violência e até mesmo a morte do indivíduo. Além disso, o manejo dos possíveis danos ocasionados pela evasão hospitalar pode gerar custos significativos ao sistema de saúde.

Comportamentos de risco à saúde como as evasões são motivados por diferentes razões ambientais, psicossociais e orgânicas, mas o processo de quantificar os eventos pode ser dificultoso devido à falha de registros. No estudo aqui apresentado, foi estudada uma amostra constituída de pacientes que tiveram evasão notificada pela Seção de Segurança do Hospital de Clínicas de Porto Alegre entre o período de 2015 e 2019. A amostra se constitui de 15 evasões de 14 pacientes oriundos de diferentes unidades de internação.

O tempo médio de internação foi de quatro dias, o que corrobora o descrito pela literatura que aponta que a evasão é mais frequente nos primeiros dias da estada no ambiente hospitalar, sendo as primeiras 24 horas as mais críticas.

O tipo de evasão mais frequente no presente estudo foi a evasão com retorno. Eventualmente, os pacientes voltam espontaneamente para a unidade da qual evadiram, mas, na maioria dos casos, o retorno ocorre por meio de agentes de segurança ou pela ação da família do indivíduo, que se utiliza da persuasão.

Apesar de a maior parte ser do sexo feminino, o resultado diverge dos achados de outras investigações que apontam o sexo masculino como reincidente. É provável que esse achado esteja relacionado ao reduzido número amostral analisado, sendo um achado ocasional. Por sua vez, o percentual de pacientes solteiros foi maior, indo ao encontro de outros estudos. Da mesma forma, os adultos jovens foram a maioria dos pacientes que evadiram, também de maneira semelhante à relatada na literatura.

A maior parte dos pacientes possuía ensino fundamental, enquanto a outra metade ficava dividida entre o ensino médio e o superior. Pesquisadores associam o menor nível escolar a maior chance de evasão, uma vez que esse tipo de indivíduo tende a engajar-se menos no plano de cuidados proposto. Há outros fatores, porém, que podem estar associados, independentemente do grau escolar, como crenças, contextos sociais, econômicos e culturais que influenciam no autocuidado.

Apesar de a maior parte das profissões dos pacientes não estar especificada nos prontuários, há possibilidade de que não estivessem inseridos no mercado de trabalho no momento da internação. Em uma pesquisa de Bowers, no Canadá, os pacientes que mais evadiram foram justamente aqueles que estavam sem vínculo empregatício e viviam em contextos desfavorecidos no momento da internação.

Quanto ao perfil clínico, os dados referentes ao diagnóstico médico na internação demonstraram que o “Episódio depressivo grave sem sintomas psicóticos” e o “Transtorno de humor (afetivo) persistente não especificado” foram os mais frequentes. Do mesmo modo, as comorbidades psiquiátricas e o abuso de substâncias foram frequentemente identificadas, ou seja, apesar de alguns pacientes terem sido internados por outros diagnósticos que não os de origem psiquiátrica, havia algum distúrbio mental agregado. Esse dado demonstra a importância de o enfermeiro e os demais profissionais de saúde estarem atentos à história pregressa do paciente, pois mesmo em internações clínicas ou cirúrgicas em um hospital geral, o contingente de pacientes que carrega consigo uma comorbidade psiquiátrica parece elevado e pode ser fator de risco à evasão.

Salienta-se que, independentemente do motivo da internação, a reação de fuga pode ocorrer quando o indivíduo se sente ameaçado pelo que ocorreu nesse período, seja uma situação real ou não, que gera ansiedade quanto ao seu futuro, o que pode levar à recusa do paciente ao tratamento a ser instituído conforme indicação médica.

Segundo a classificação diagnóstica da NANDA International (NANDA-I), “os fatores de risco são influências que aumentam a vulnerabilidade de indivíduos, famílias, grupos ou comunidades a um evento não saudável”, ou seja, são sinalizadores de possíveis desfechos negativos e que podem ser prevenidos.

Entre os fatores de risco observados nos registros em prontuário estavam as solicitações frequentes de alta e a história de abuso de substâncias, além de agitação, descontentamento com a situação, apoio social insuficiente e o relato de deambulação do paciente próximo às saídas da unidade. Todos esses fatores, quando observados pela equipe de saúde, principalmente pela enfermagem que está próxima ao paciente nas 24 horas, possibilitam a prevenção do evento adverso, a evasão.

Diante desses resultados, entende-se que é necessário instituir estratégias que promovam barreiras de segurança para que os eventos de evasão não se tornem recorrentes, pois ações planejadas evitam danos aos pacientes.

Por fim, sugere-se a criação de um diagnóstico de enfermagem padronizado que explicite de forma mais clara o risco para evasão, visando ao adequado planejamento do cuidado a ser prestado, com ênfase na segurança de pacientes. Além disso, sugere-se a sistematização e a padronização dos registros desse tipo de evento nas instituições hospitalares para promover uma monitorização adequada dos casos, bem como embasar estratégias de prevenção e qualificação da assistência.

(*) Ester de Melo Borba  é graduada em Enfermagem.
(*) Colaboraram no estudo: Amália de Fátima Lucena (professora do PPG em Enfermagem), Deborah Bulegon Mello, Betina Franco, Gláucia dos Santos Policarpo (enfermeiras do Hospital de Clínicas de Porto Alegre) e Raquel Schuttz Carvalho (graduada em Enfermagem).

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